Requisitos legais para Materiais de Construção: O que todo o Promotor deve saber
- Ana Carolina Santos
- 21 de ago.
- 4 min de leitura
Construir em Portugal implica o cumprimento rigoroso de um quadro normativo extenso e complexo. O conhecimento dos requisitos legais para materiais de construção não é apenas uma questão de conformidade legal – é fundamental para garantir a segurança, durabilidade e qualidade das edificações.

O quadro legal português: Uma visão geral
Em Portugal, a utilização de materiais de construção está regulamentada por diversos diplomas legais que estabelecem exigências claras e rigorosas. O Regulamento Geral das Edificações Urbanas (RGEU) e o Regime Jurídico da Urbanização e Edificação (RJUE) constituem os pilares fundamentais desta regulamentação.
As exigências essenciais segundo o RGEU
O artigo 17.º do RGEU estabelece que todas as edificações devem garantir:
Resistência mecânica e estabilidade
Segurança na utilização e em caso de incêndio
Higiene, saúde e proteção do ambiente
Proteção contra o ruído
Economia de energia e isolamento térmico
Questões de acessibilidade
Ventilação adequada
Estas exigências não são meras sugestões – são obrigações legais que determinam a conformidade de qualquer projeto de construção.
Marcação CE: O passaporte europeu dos materiais
O que é a Marcação CE?
A marcação CE (Conformité Européenne) é um sistema de certificação que atesta que um produto cumpre os requisitos essenciais de segurança estabelecidos pela legislação europeia. Para materiais de construção, esta marcação é frequentemente obrigatória.
Produtos sem Marcação CE: As alternativas
Quando não existe marcação CE, o RGEU prevê alternativas:
Certificação de conformidade com especificações técnicas nacionais
Reconhecimento mútuo de certificados de outros Estados-Membros da UE
Homologação pelo Laboratório Nacional de Engenharia Civil em casos específicos
Homologação Nacional: Quando é necessária?
A homologação pelo Laboratório Nacional de Engenharia Civil torna-se obrigatória quando:
Os produtos não possuem marcação CE nem certificação válida
A utilização possa comportar risco para as exigências essenciais
Existe incerteza sobre a conformidade do material
Processo de Homologação
O processo considera:
Certificados de conformidade internacionais
Ensaios e inspeções realizados em outros países da UE
Cooperação com entidades aprovadas europeias
Análise fundamentada da necessidade de repetir ensaios
Qualidade e aplicação dos materiais
Critérios de seleção
O RGEU estabelece que os materiais devem ser:
De boa qualidade e adequados às condições de utilização
Apropriados à natureza e importância da edificação
Conformes às especificações técnicas do projeto
Capazes de garantir durabilidade e condições de segurança
Responsabilidade na escolha
A responsabilidade pela seleção adequada dos materiais recai sobre:
Autores dos projetos - através dos termos de responsabilidade
Diretores de obra - na fiscalização da aplicação
Donos de obra - na aprovação das soluções propostas
Edifícios Existentes: Proteção do património construído
O princípio da proteção do existente estabelece que:
Edificações construídas ao abrigo de direito anterior não são afetadas por normas supervenientes
Obras de reconstrução ou alteração não podem ser recusadas por desconformidade com normas posteriores
É possível melhorar condições sem cumprir integralmente novas exigências
Condições para obras em Edifícios Existentes
Para beneficiar desta proteção, as obras:
Não podem originar nem agravar desconformidades
Devem resultar em melhoria das condições de segurança e salubridade
Podem requerer adaptações proporcionais e razoáveis
Regulamentação específica por tipologia
Edifícios Habitacionais
Para habitação, existem requisitos específicos sobre:
Área mínima dos compartimentos
Pé-direito livre mínimo (2,40m para habitação)
Condições de iluminação e ventilação natural
Instalações sanitárias obrigatórias
Estabelecimentos Comerciais
Os estabelecimentos comerciais devem cumprir:
Pé-direito livre mínimo de 3 metros
Normas específicas de acessibilidade
Requisitos de segurança contra incêndio mais exigentes
Acessibilidade: Uma prioridade legal
O Decreto-Lei n.º 163/2006 estabelece normas técnicas rigorosas para:
Eliminação de barreiras arquitetónicas
Acesso seguro para pessoas com mobilidade condicionada
Equipamentos e instalações adequados
Consequências do incumprimento
Responsabilidades e Sanções
O incumprimento dos requisitos pode resultar em:
Responsabilidade civil por danos causados
Contra-ordenações com coimas significativas
Embargo de obras ou ordem de demolição
Responsabilidade criminal em casos graves
Medidas de Tutela da Legalidade
As autoridades podem determinar:
Suspensão imediata dos trabalhos
Correção das irregularidades detetadas
Demolição parcial ou total da obra
Execução coerciva à custa do infrator
Papel dos técnicos habilitados
Termos de Responsabilidade
Os técnicos devem subscrever termos de responsabilidade atestando:
Observância das normas legais e regulamentares
Conformidade com instrumentos de gestão territorial
Compatibilidade entre projetos de especialidades
Adequação dos materiais especificados
Qualificação Profissional
Apenas podem subscrever projetos:
Técnicos inscritos em associações públicas profissionais
Profissionais com habilitação adequada ao tipo de projeto
Técnicos com formação específica em áreas especializadas

Evolução normativa e adaptação tecnológica
Construção Modular
A recente legislação reconhece a construção modular, estabelecendo que:
Aplica-se o mesmo regime legal às construções tradicionais
Elementos produzidos em fábrica devem cumprir as mesmas exigências
A ligação entre módulos deve garantir estabilidade estrutural
Eficiência Energética
Crescente atenção ao:
Isolamento térmico adequado
Ventilação natural e sistemas eficientes
Materiais sustentáveis e de baixo impacto ambiental
Procedimentos de Controlo e Fiscalização
Licenciamento vs. Comunicação Prévia
O tipo de procedimento determina o nível de controlo:
Licenciamento: análise prévia mais detalhada
Comunicação prévia: maior responsabilização do requerente
Isenção de controlo: para obras de escassa relevância
Vistorias e Inspeções
As autoridades podem determinar:
Vistorias prévias à utilização
Inspeções durante a execução das obras
Verificação da conformidade com projetos aprovados
Para considerar
A complexidade do quadro normativo português exige conhecimento especializado e acompanhamento técnico qualificado. Os requisitos legais para materiais de construção não são obstáculos burocráticos, mas garantias essenciais de segurança, qualidade e durabilidade das nossas edificações. A correta aplicação destas normas protege não apenas os utilizadores finais, mas também os promotores, projetistas e construtores de responsabilidades futuras. Investir na conformidade legal é investir na qualidade e sustentabilidade do património construído.
O cenário regulamentar continuará a evoluir, especialmente nas áreas da eficiência energética, sustentabilidade e acessibilidade. Manter-se atualizado com estas mudanças é fundamental para o sucesso de qualquer projeto.
