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Acessibilidade nos Transportes Públicos: Normas essenciais para Estações e Interfaces

  • Foto do escritor: Ana Carolina Santos
    Ana Carolina Santos
  • 11 de set.
  • 4 min de leitura

A mobilidade urbana deve ser um direito fundamental de todos os cidadãos. No entanto, muitas pessoas com mobilidade condicionada enfrentam diariamente barreiras arquitetónicas que limitam o seu acesso aos transportes públicos. Este post aborda as normas técnicas essenciais para garantir que estações, paragens e terminais sejam verdadeiramente acessíveis.


Estação Ferroviária em Lisboa com boas acessibilidades
Estação Ferroviária em Lisboa com boas acessibilidades


O Decreto-Lei n.º 163/2006 estabelece as bases legais para a acessibilidade em Portugal, definindo condições específicas para espaços de utilização pública. A legislação não é apenas uma obrigação legal - é um instrumento de inclusão social que garante a participação plena de todos os cidadãos na vida urbana.



Quem são as pessoas com mobilidade condicionada?


As normas abrangem um espetro alargado de utilizadores:

  • Pessoas em cadeiras de rodas

  • Indivíduos com dificuldades de locomoção

  • Pessoas com deficiências sensoriais (visuais ou auditivas)

  • Utilizadores temporariamente condicionados (grávidas, pessoas com bengalas, idosos)

  • Famílias com carrinhos de bebé



Normas técnicas para Estações Ferroviárias e de Metropolitano


As estações ferroviárias e de metropolitano estão expressamente incluídas no âmbito de aplicação das normas de acessibilidade, sendo consideradas equipamentos de utilização pública essenciais.


Percursos Acessíveis

Todos os percursos pedonais devem formar uma rede contínua e coerente que conecte:

  • Acessos principais da estação

  • Plataformas de embarque

  • Bilheteiras e equipamentos de auto-atendimento

  • Instalações sanitárias

  • Zonas de espera

  • Ligações ao exterior


Especificações dimensionais fundamentais

Larguras mínimas:

  • Percursos principais: 1,2 metros livres

  • Troços específicos (até 1,5m de extensão): 0,9 metros

  • Junto a obstáculos temporários: adequação conforme o tráfego

Zonas de manobra obrigatórias:

  • Rotação de 360°: espaço circular de 1,5 metros

  • Mudança de direção em T: 0,9m x 0,9m com extensões laterais


Centrais de Camionagem e Terminais Rodoviários

Os terminais de transportes coletivos devem cumprir normas específicas que garantam a acessibilidade desde a chegada até ao embarque.


Paragens na Via Pública

Características essenciais das paragens acessíveis:

  • Piso firme, estável e antiderrapante

  • Largura mínima de 1,5 metros para passagem

  • Altura do lancil não superior a 2 centímetros

  • Sinalização tátil no início e fim das zonas de travessia

  • Proteção contra condições climatéricas adversas


Passagens de Peões e Acessos

As passagens de peões junto às paragens devem respeitar critérios rigorosos:

  • Inclinação máxima de 8% na direção da passagem

  • Pavimento com textura diferenciada nas zonas de transição

  • Semáforos sonoros em vias de grande movimento

  • Tempo de travessia calculado para velocidade de 0,4 m/s


Gares Marítimas e Fluviais

Os terminais aquaviários apresentam desafios específicos devido às variações de marés e à interface com embarcações.


Adaptações necessárias

  • Sistemas de nivelamento entre plataformas e embarcações

  • Rampas com inclinação variável (máximo 8% em condições normais)

  • Corrimãos duplos em rampas com inclinação superior a 6%

  • Sinalização específica para condições de navegação


Aerogares e Infraestruturas Aeroportuárias

Os aeroportos, pela sua complexidade, exigem soluções integradas de acessibilidade.


Elementos críticos

Sistemas de circulação vertical:

  • Elevadores com dimensões mínimas de 1,1m x 1,4m

  • Plataformas elevatórias como alternativa em desnível

  • Escadas rolantes com início e fim sinalizados tactilmente

Equipamentos de auto-atendimento:

  • Comandos entre 0,8m e 1,2m de altura

  • Aproximação frontal com espaço livre sob equipamentos

  • Teclado numérico padronizado (tecla 1 no canto superior esquerdo)


Estacionamento e Interfaces Modais

A integração entre diferentes modos de transporte requer atenção especial ao estacionamento acessível.


Estação Rodoviária em Lisboa com boas acessibilidades
Estação Rodoviária em Lisboa com boas acessibilidades

Lugares reservados

Dimensionamento obrigatório:

  • Largura útil: 2,5 metros

  • Faixa de acesso lateral: 1 metro

  • Comprimento: 5 metros

  • Localização: percurso mais curto até à entrada

Sinalização:

  • Símbolo internacional pintado no piso (mínimo 1m de lado)

  • Sinal vertical visível mesmo com veículo estacionado

  • Demarcação com cor contrastante


Instalações Sanitárias Acessíveis

Todas as interfaces de transporte devem dispor de instalações sanitárias acessíveis.


Especificações Técnicas

Cabinas acessíveis:

  • Dimensões mínimas: 1,6m x 1,7m

  • Zona de manobra para rotação de 180°

  • Barras de apoio rebatíveis quando adjacentes à zona livre

  • Altura do assento: 45 centímetros (±1cm)

Equipamentos complementares:

  • Lavatórios a 80 centímetros de altura

  • Espaço livre sob lavatório: 70cm largura x 65cm altura

  • Sistema de alarme ligado ao exterior

  • Espelhos com base inferior a 90 centímetros


Sinalização e Orientação

A sinalização é fundamental para a autonomia dos utilizadores com mobilidade condicionada.


Princípios de Design Universal

  • Contraste visual entre texto e fundo

  • Caracteres em relevo para identificação tátil

  • Pictogramas universais complementando texto

  • Múltiplos canais sensoriais (visual, tátil, sonoro)


Símbolo Internacional de Acessibilidade

O símbolo deve ser afixado em local visível em todas as infraestruturas que cumpram as normas técnicas, funcionando como certificação de acessibilidade.


Implementação e Fiscalização

A aplicação destas normas é obrigatória e sujeita a fiscalização pelas autoridades competentes.


Prazos de adaptação

  • Edifícios anteriores a 1997: 10 anos para adaptação

  • Edifícios posteriores a 1997: 5 anos para conformidade

  • Novas construções: cumprimento integral obrigatório


Consequências do incumprimento

  • Coimas entre 250€ e 3.740€ para pessoas singulares

  • Coimas entre 500€ e 44.891€ para pessoas coletivas

  • Possibilidade de sanções acessórias (suspensão de licenças)



Conselhos práticos para Projetistas


Como arquitetos e urbanistas, devemos ir além do cumprimento mínimo da legislação:

  • Consultar utilizadores finais durante o processo de projeto

  • Testar percursos com simulações de mobilidade reduzida

  • Integrar soluções universais desde a fase conceptual

  • Prever manutenção dos elementos de acessibilidade

  • Formar equipas sobre design inclusivo

A verdadeira acessibilidade nasce quando deixamos de pensar em "soluções especiais" e passamos a projetar espaços naturalmente inclusivos.



Para considerar


A acessibilidade nos transportes públicos não é apenas uma questão técnica ou legal - é um reflexo da nossa visão de sociedade. Cada rampa bem projetada, cada elevador funcional, cada sinalização clara representa um passo em direção a cidades mais justas e inclusivas.

As normas técnicas fornecem o quadro mínimo, mas a excelência surge quando compreendemos que projetar para a diversidade humana enriquece o espaço urbano para todos. Uma estação verdadeiramente acessível beneficia não apenas pessoas com mobilidade condicionada, mas famílias, turistas, trabalhadores e toda a comunidade.

O futuro das nossas cidades constrói-se hoje, nas decisões de projeto que tomamos. Fazer da acessibilidade uma prioridade é investir numa sociedade onde a mobilidade urbana é verdadeiramente um direito de todos.

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