top of page

Proteção contra Incêndios em Edifícios Reabilitados: Caminhos alternativos e Análise de Risco

  • Foto do escritor: Ana Carolina Santos
    Ana Carolina Santos
  • 17 de set.
  • 7 min de leitura

A reabilitação urbana tem assumido um papel cada vez mais relevante no panorama da construção em Portugal, trazendo consigo desafios únicos em matéria de segurança contra incêndios. Quando se trata de edifícios históricos ou de construção antiga, nem sempre é possível ou economicamente viável aplicar todas as medidas convencionais de segurança prescritas na regulamentação vigente. É aqui que entram as soluções alternativas e a análise de risco como ferramentas fundamentais para equilibrar a preservação do património construído com a garantia de segurança adequada.


A análise de risco permite encontrar soluções específicas e adequadas para cada edifício, respeitando as suas características únicas e garantindo simultaneamente níveis de segurança apropriados.

Coworking em edifício no Centro Histórico do Porto após obras de reabilitação, remodelação e implementação de técnicas de segurança contra incêndios
Coworking em edifício no Centro Histórico do Porto após obras de reabilitação, remodelação e implementação de técnicas de segurança contra incêndios

O enquadramento regulamentar da Segurança Contra Incêndios


Legislação aplicável

A segurança contra incêndios em edifícios é regulamentada por um conjunto de normas específicas que estabelecem os requisitos mínimos a cumprir. No entanto, quando se trata de edifícios existentes em processo de reabilitação, a aplicação direta destas normas pode revelar-se problemática devido às características construtivas e arquitetónicas específicas do edificado.

O enquadramento legal atual reconhece estas limitações e prevê mecanismos que permitem soluções alternativas, desde que devidamente fundamentadas através de análise de risco. Esta abordagem é particularmente relevante no contexto da reabilitação urbana, onde a preservação das características arquitetónicas e construtivas originais pode entrar em conflito com a aplicação literal dos regulamentos.



Princípios da Segurança Contra Incêndios

A segurança contra incêndios assenta em três pilares fundamentais:

  • Prevenção: Evitar o início do incêndio através da eliminação ou controlo das causas de ignição

  • Limitação: Controlar o desenvolvimento e propagação do incêndio

  • Evacuação: Garantir condições seguras para a saída das pessoas do edifício

Em edifícios reabilitados, estes objetivos podem ser alcançados através de abordagens diferentes das convencionais, recorrendo a combinações específicas de medidas ativas e passivas de proteção.



Soluções Alternativas: Uma abordagem flexível e fundamentada


As soluções alternativas constituem um conjunto de medidas de segurança contra incêndios que, não seguindo exatamente as prescrições regulamentares standard, garantem um nível de segurança equivalente ou superior. Esta abordagem é particularmente valiosa em edifícios de valor patrimonial ou com características construtivas específicas que dificultam a aplicação das soluções convencionais.

A implementação de soluções alternativas exige:

  • Fundamentação técnica rigorosa através de análise de risco

  • Demonstração de equivalência de segurança relativamente às soluções regulamentares

  • Aprovação pelas autoridades competentes com base na documentação técnica apresentada



Tipos de Soluções Alternativas


Medidas Passivas adaptadas

Em edifícios reabilitados, as medidas passivas podem ser adaptadas às características específicas do imóvel:

  • Compartimentação corta-fogo: Adaptação das soluções de compartimentação às características estruturais existentes, utilizando materiais e técnicas compatíveis com a construção original

  • Isolamento e proteção de estruturas: Aplicação de revestimentos corta-fogo que respeitem as características arquitetónicas do edifício

  • Vias de evacuação alternativas: Concepção de percursos de evacuação que aproveitem as características espaciais existentes


Sistemas Ativos Compensatórios

Quando as medidas passivas são limitadas pelas características do edifício, os sistemas ativos assumem particular importância:

  • Deteção precoce: Sistemas de deteção automática de incêndios adaptados às características específicas do edifício

  • Supressão automática: Sistemas de extinção por sprinklers ou outros agentes extintores

  • Controlo de fumos: Sistemas de desenfumagem adequados às características arquitetónicas do imóvel


Vantagens das Soluções Alternativas

As soluções alternativas oferecem múltiplas vantagens no contexto da reabilitação:

  • Preservação patrimonial: Mantém as características arquitetónicas e construtivas originais

  • Viabilidade económica: Pode reduzir significativamente os custos de intervenção

  • Flexibilidade de conceção: Permite soluções adaptadas às especificidades de cada caso

  • Otimização de recursos: Concentra os investimentos nas medidas mais eficazes para cada situação específica



Metodologia da Análise de Risco


A análise de risco é um processo estruturado que permite avaliar os perigos associados ao incêndio e determinar as medidas mais adequadas para os controlar. Esta metodologia é essencial para fundamentar soluções alternativas, fornecendo a base técnica necessária para demonstrar a adequação das medidas propostas.


Fases da Análise de Risco


1. Identificação de Perigos

  • Análise das características construtivas do edifício

  • Identificação das utilizações e ocupações previstas

  • Avaliação das cargas térmicas existentes

  • Levantamento das condições de acesso e evacuação

2. Avaliação da Probabilidade

  • Análise estatística de ocorrências similares

  • Avaliação das condições específicas do edifício

  • Consideração dos sistemas de prevenção existentes

3. Avaliação das Consequências

  • Análise dos cenários de incêndio possíveis

  • Avaliação do potencial de propagação

  • Estimativa dos tempos de evacuação necessários

  • Análise do impacto em pessoas e bens

4. Determinação do Risco

  • Quantificação do risco através de metodologias reconhecidas

  • Comparação com níveis de risco aceitáveis

  • Identificação das medidas de mitigação necessárias



Ferramentas de Análise


Métodos Qualitativos

Os métodos qualitativos são úteis para uma primeira abordagem à análise de risco:

  • Listas de verificação: Identificação sistemática de perigos

  • Análise de árvores de falhas: Identificação de causas de falha

  • Análise de cenários: Desenvolvimento de cenários de incêndio possíveis


Métodos Quantitativos

Para análises mais rigorosas, recorre-se a métodos quantitativos:

  • Modelação computacional: Simulação do comportamento do fogo e dos fumos

  • Análise probabilística: Quantificação da probabilidade de ocorrência

  • Análise de consequências: Quantificação dos danos potenciais


Critérios de Aceitação

A análise de risco deve estabelecer critérios claros de aceitação do risco:

  • Risco individual: Probabilidade de morte ou ferimento para um indivíduo

  • Risco coletivo: Risco para grupos de pessoas

  • Risco patrimonial: Probabilidade de danos materiais significativos



Edifícios Históricos e de Valor Patrimonial


Desafios específicos

Os edifícios históricos apresentam desafios únicos em matéria de segurança contra incêndios:

  • Materiais tradicionais: Utilização de materiais combustíveis como madeira e outros elementos orgânicos

  • Compartimentação limitada: Espaços amplos com poucas barreiras à propagação do fogo

  • Acessibilidade restrita: Escadas estreitas e corredores que dificultam a evacuação

  • Sistemas integrados: Necessidade de integrar sistemas modernos em estruturas antigas


Soluções recomendadas

  • Deteção precoce ultra-sensível: Sistemas capazes de detetar incêndios nos primeiros estágios

  • Supressão por névoa de água: Sistemas que minimizam os danos causados pela água

  • Barreiras móveis: Elementos que podem criar compartimentação sem alterar permanentemente o espaço

  • Iluminação de emergência avançada: Sistemas que orientam de forma clara as vias de evacuação



Edifícios Residenciais Multifamiliares


Características e Desafios

Os edifícios residenciais multifamiliares de construção antiga apresentam características específicas:

  • Caixas de escadas comuns: Frequentemente constituem o único meio de evacuação

  • Compartimentação horizontal limitada: Apartamentos com comunicação entre si

  • Ocupação permanente: Presença de pessoas durante 24 horas por dia

  • Conhecimento limitado: Os ocupantes podem não estar familiarizados com os procedimentos de emergência


Medidas Prioritárias

  • Proteção das vias de evacuação: Garantir que as escadas permanecem livres de fumo

  • Sistemas de alerta: Deteção e alarme que alertem todos os ocupantes

  • Compartimentação entre fogos: Evitar a propagação horizontal do incêndio

  • Planos de evacuação: Procedimentos claros e treino regular dos ocupantes



Implementação prática das soluções


Documentação necessária

A aprovação de soluções alternativas exige documentação técnica rigorosa:

  • Projeto de segurança contra incêndios: Detalhando todas as medidas propostas

  • Relatório de análise de risco: Fundamentando tecnicamente as soluções

  • Especificações técnicas: Dos equipamentos e materiais a utilizar

  • Planos de manutenção: Garantindo a operacionalidade dos sistemas


Processo de Submissão

O processo de aprovação segue etapas definidas:

  1. Submissão inicial: Apresentação da documentação técnica

  2. Análise técnica: Avaliação pelas autoridades competentes

  3. Eventuais correções: Ajustes solicitados durante a análise

  4. Aprovação final: Emissão de parecer favorável

  5. Implementação: Execução das medidas aprovadas

  6. Verificação: Confirmação da correta implementação


Espaço cultural em edifício no Centro Histórico do Porto após obras de reabilitação, remodelação e implementação de técnicas de segurança contra incêndios
Espaço cultural em edifício no Centro Histórico do Porto após obras de reabilitação, remodelação e implementação de técnicas de segurança contra incêndios

Coordenação com outras Especialidades


Integração Arquitetónica

A implementação de medidas de segurança contra incêndios deve ser cuidadosamente coordenada com:

  • Arquitetura: Preservação das características estéticas e funcionais

  • Estruturas: Compatibilização com elementos estruturais existentes

  • Instalações técnicas: Integração com sistemas elétricos, mecânicos e de comunicações

  • Gestão de obra: Planeamento adequado das fases de execução


Aspetos Económicos

A análise económica das soluções deve considerar:

  • Custos de implementação: Investimento inicial necessário

  • Custos de manutenção: Despesas operacionais ao longo da vida útil

  • Benefícios patrimoniais: Valorização do imóvel resultante da segurança adequada

  • Custos de oportunidade: Comparação com soluções alternativas



Sistemas de Gestão de Segurança


Manutenção Preventiva

A eficácia das medidas de segurança depende da adequada manutenção:

  • Inspeções regulares: Verificações periódicas do estado dos sistemas

  • Testes funcionais: Verificação do correto funcionamento dos equipamentos

  • Calibrações: Ajustes necessários para manter a operacionalidade

  • Substituições programadas: Renovação de componentes com vida útil limitada


Formação e Treino

As pessoas constituem um elemento fundamental na segurança:

  • Treino de ocupantes: Procedimentos de evacuação e utilização de equipamentos

  • Formação de equipas de segurança: Preparação de pessoas responsáveis pela gestão de emergências

  • Exercícios de evacuação: Simulacros regulares para testar procedimentos

  • Atualização de conhecimentos: Formação contínua sobre novas técnicas e equipamentos



Revisão das Análises de Risco


As condições dos edifícios evoluem ao longo do tempo, exigindo:

  • Reavaliações periódicas: Atualização das análises de risco

  • Adaptação a mudanças: Ajustes resultantes de alterações de uso ou ocupação

  • Incorporação de nova tecnologia: Aproveitamento de desenvolvimentos técnicos

  • Lições aprendidas: Integração de conhecimento resultante de incidentes ou exercícios



Para considerar


A segurança contra incêndios em edifícios reabilitados representa um desafio complexo que exige abordagens inovadoras e fundamentadas tecnicamente. As soluções alternativas, quando adequadamente desenvolvidas através de análise de risco rigorosa, oferecem caminhos viáveis para conciliar a preservação do património construído com a garantia de níveis adequados de segurança.

A análise de risco emerge como uma ferramenta indispensável, permitindo compreender os perigos específicos de cada situação e desenvolver medidas de mitigação eficazes e proporcionais. Esta abordagem científica e metodológica constitui a base para a tomada de decisões informadas e para a aprovação de soluções que, não seguindo exatamente as prescrições regulamentares standard, garantem níveis de segurança equivalentes ou superiores.

O sucesso da implementação destas soluções depende não apenas da qualidade técnica do projeto, mas também da adequada coordenação entre especialidades, da qualidade da execução e da manutenção adequada ao longo da vida útil do edifício. A formação e o treino das pessoas que ocupam ou gerem estes espaços constituem elementos complementares essenciais para a eficácia global do sistema de segurança.

Num contexto em que a reabilitação urbana assume crescente importância como estratégia de desenvolvimento sustentável, a capacidade de desenvolver soluções de segurança contra incêndios adequadas às especificidades do edificado existente torna-se fundamental. As metodologias aqui apresentadas contribuem para que esta tarefa seja realizada com o rigor técnico necessário, garantindo simultaneamente a preservação do património e a segurança das pessoas.

Para quem enfrenta estes desafios, seja como proprietário ou gestor de edifícios, recomenda-se o envolvimento de profissionais especializados desde as fases iniciais do processo. A complexidade técnica e regulamentar da matéria exige conhecimentos específicos que só podem ser adequadamente mobilizados através do recurso a competências técnicas qualificadas.

bottom of page