Solos contaminados: Um ativo tóxico ou uma oportunidade escondida?
- Ana Carolina Santos
- 1 de dez.
- 3 min de leitura
À primeira vista, um terreno industrial desativado numa zona urbana em expansão parece o negócio do século. O preço é atrativo, a localização é central e o potencial de construção é enorme. Mas, por baixo da vegetação que cresceu entretanto, pode esconder-se um passivo ambiental capaz de transformar o lucro em prejuÃzo: a contaminação do solo.
Em Portugal, com a pressão para reabilitar antigas zonas industriais (os chamados brownfields), a questão da qualidade do solo deixou de ser um nicho ambiental para se tornar uma variável central na viabilidade financeira de qualquer promoção imobiliária.

O custo invisÃvel da contaminação
Ao contrário de uma fachada em ruÃnas, a contaminação não se vê a olho nu. Pode ser um legado de décadas de atividade industrial — hidrocarbonetos de uma antiga bomba de gasolina, metais pesados de uma fundição ou solventes de uma lavandaria. Ignorar este risco é financeiramente perigoso. Se comprar um terreno contaminado, a lei é clara: a responsabilidade pela remediação pode recair sobre o atual proprietário, independentemente de quem poluiu.
Fatores que disparam os custos:
Remediação obrigatória: Se a avaliação de risco provar perigo para a saúde pública (futuros moradores) ou ambiente, terá de descontaminar.
Taxas de deposição: Enviar solos contaminados para aterro é uma operação carÃssima, sujeita à Taxa de Gestão de ResÃduos (TGR), que tem vindo a aumentar.
Atrasos no Licenciamento: Um processo de descontaminação exige aprovação da APA (Agência Portuguesa do Ambiente) e das CCDR, o que pode congelar o inÃcio da obra por meses ou anos.
Viabilidade vs. Remediação: A equação do investidor
Antes de assinar a escritura, a pergunta não deve ser "quanto custa o terreno?", mas sim "quanto custa o terreno limpo?". A análise de viabilidade tem de integrar o Custo Ambiental Estimado.
1. Due Diligence Ambiental (Fase 1 e 2): É o seguro de vida do investidor. A Fase 1 investiga o histórico do local; a Fase 2 recolhe amostras reais. Sem isto, está a comprar às cegas.
2. Avaliação de risco: Nem toda a contaminação exige remoção total. A legislação permite, em certos casos, soluções de confinamento ou técnicas in-situ (tratar o solo no local), que são drasticamente mais baratas do que a escavação e transporte para aterro.
3. Valorização pós-remediação: Um terreno descontaminado numa zona prime valoriza exponencialmente. O "desconto" obtido na compra devido à contaminação deve cobrir os custos de limpeza e ainda oferecer uma margem de risco (premium) superior.
Oportunidade: Transformar o "castanho" em "verde"
O estigma dos solos contaminados está a mudar. Com a escassez de terrenos em Lisboa e Porto, os promotores mais sofisticados olham para estes passivos como oportunidades de reabilitação urbana.
Incentivos: Existem quadros de apoio e fundos europeus focados na reabilitação de passivos ambientais que podem co-financiar a operação.
Sustentabilidade: Recuperar um solo degradado é uma das ações mais nobres de sustentabilidade urbana, permitindo obter certificações ambientais (como BREEAM ou LEED) que valorizam o produto final.
Para considerar
Um solo contaminado não é um "não" definitivo ao investimento; é um "sim, mas...". Exige uma equipa que saiba ler para além da topografia e entender a quÃmica do negócio. A diferença entre um desastre financeiro e um projeto de sucesso está na quantificação rigorosa do risco ambiental antes da aquisição.
