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Demolição estratégica de paredes interiores: para legalizar um imóvel clandestino

  • Foto do escritor: Ana Carolina Santos
    Ana Carolina Santos
  • 7 de jul.
  • 3 min de leitura

Desde 1984, a Portaria n.º 243/84 simplificou o processo de reconversão de edifícios clandestinos, estabelecendo tolerâncias técnicas mais flexíveis do que o RGEU. Contudo, trouxe igualmente uma regra clara: sempre que a legalização dependa de cumprir essas tolerâncias, pode ser obrigatório demolir paredes interiores.


Remoção de uma parede divisória entre a cozinha e a sala de estar de um apartamento em Almada
Remoção de uma parede divisória entre a cozinha e a sala de estar de um apartamento em Almada

Porque se exige, afinal, deitar paredes abaixo?


  1. Garantir áreas mínimas de compartimentos

    • 8 m² em regra; 10,5 m² num ou dois compartimentos-chave, conforme a tipologia.

  2. Corrigir proporções excessivas

    • Comprimento jamais > 2 × largura; círculo inscrito de Ø 1,8 m em cada divisão habitável.

  3. Aumentar largura de corredores e escadas

    • Corredores ≥ 0,9 m; lanços de escada de uso comum ≥ 1 m.

  4. Manter o pé-direito livre mínimo

    • 2,35 m em habitações clandestinas; 2,40 m nas restantes.

  5. Criar ventilação e iluminação adequadas

    • Demolições pontuais permitem abrir novos vãos ou integrar asfixiantes marquises antigas.



Quando a demolição é inevitável

Problema detectado na vistoria

Exigência legal

Solução típica

Divisão < 8 m² ou < 7 m² fora das excepções

Unir dois espaços demolindo parede intermédia

Proporção ≥ 2:1 ou não cabe círculo Ø 1,8 m

Idem

Reconfigurar compartimento removendo parede parcial

Corredor < 0,9 m

Avançar parede não estrutural

Pé-direito afectado por tecto falso

Demolir forro e elevar estrutura

Falta de zona de circulação de 1,8 m

Criar sala em “open-space”


Quando o município exige mesmo a remoção


A fiscalização camarária obriga à demolição sempre que:

  • O parecer técnico conclua que não é possível alcançar as áreas mínimas com meras alterações de mobiliário;

  • A parede comprometa a estrutura de circulação ou evacuação de fumo;

  • A obra esteja fora de comunicação prévia e exija licenciamento por mexer em elementos estruturais – Art.º 4.º-2-c RJUE;

  • Seja necessária para anular compartimentos “esconsos” (vãos sem janela directa) que impedem o cumprimento da Portaria.



Planear uma demolição interior legal

Fase

Ação

Responsável

Duração típica

Diagnóstico

Levantamento métrico, fotografias, identificação de paredes não estruturais

Arquiteto

1 semana

Verificação estrutural

Confirma se a parede é de suporte ou simples vedação

Eng. civil + Arquiteto

3-5 dias

Enquadramento legal

Definir se basta comunicação prévia ou requer licença (RJUE Art.º 6.º-1-b)

Arquiteto

2 dias

Desenhos & memória

Projeto simplificado com novas áreas e circulações

Equipa de projeto

1-2 semanas

Submissão

Carregamento na Plataforma dos Procedimentos Urbanísticos

Arquiteto

1 dia

Execução

Demolição controlada, gestão de resíduos, verificação de pé-direito

Empreiteiro

2-4 dias

Vistoria final

Câmara confirma tolerâncias e emite licença de utilização

Município

1 visita


Conselhos técnicos essenciais


  • Priorizar paredes de alvenaria leve – gesso cartonado ou tijoleira fina são mais baratas de remover.

  • Confirmar infra-estruturas – electricidade e águas passam muitas vezes em paredes não estruturais.

  • Controlar resíduos – pedra e tijolo devem seguir para operador licenciado, evitando coimas do RJUE.

  • Planeamento em fases – executar primeiro a demolição, depois nova compartimentação em drywall para manter prazos.


Remoção de uma parede divisória entre a cozinha e a sala de estar de um apartamento em Sintra
Remoção de uma parede divisória entre a cozinha e a sala de estar de um apartamento em Sintra

Exemplo prático


Apartamento T3 clandestino em Almada, sala subdividida em dois cubículos de 7 m².

  1. Vistoria detecta área insuficiente e círculo Ø 1,8 m impossível.

  2. Demolição da parede divisória cria sala única de 14 m².

  3. Corredor ampliado para 0,95 m; pé-direito recupera 2,40 m após remoção de tecto falso.

  4. Parecer favorável; licença de utilização emitida em 30 dias. Valor de mercado sobe +12%.



Para refletir


Demolir não é desperdiçar: é investir em espaço, segurança e valor patrimonial. Quando a legalização depende de cumprir áreas ou melhorar a circulação, abdicar de paredes interiores é muitas vezes o passo decisivo para transformar um imóvel clandestino num lar plenamente reconhecido – seguro, salubre e valorizado.

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