Instalações Sanitárias em projetos de Reabilitação: Requisitos essenciais e soluções práticas para espaços limitados
- Ana Carolina Santos

- 4 de set.
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Atualizado: 4 de set.
A reabilitação de edifícios antigos em Portugal apresenta desafios únicos, especialmente quando se trata das instalações sanitárias. Entre a preservação do carácter original das construções e o cumprimento das normas atuais de habitabilidade, encontrar o equilíbrio certo exige conhecimento técnico especializado e criatividade arquitetónica.
Com a entrada em vigor de novos diplomas como a Portaria n.º 304/2019 e o Decreto-Lei n.º 95/2019, que estabelecem o regime aplicável à reabilitação de edifícios, abriu-se caminho para uma maior flexibilidade na intervenção em construções existentes, mantendo os padrões essenciais de conforto e salubridade.

O enquadramento legal da Reabilitação
RGEU vs. Portaria 304/2019: As principais diferenças
O Regulamento Geral das Edificações Urbanas (RGEU), aprovado em 1951, continua a ser a referência base para construções novas. No entanto, para projetos de reabilitação, a Portaria n.º 304/2019 introduz requisitos mais flexíveis que reconhecem as limitações físicas dos edifícios existentes.
No RGEU, as áreas mínimas para instalações sanitárias são:
T0, T1, T2: 3,5 m² (equipamento completo)
T3, T4: 4,5 m² (dois espaços independentes)
T5 ou superior: 6 m² (dois espaços independentes)
Na reabilitação, sob a Portaria 304/2019:
Maior flexibilidade dimensional
Possibilidade de uma única instalação sanitária completa para tipologias menores
Tolerâncias específicas para edifícios antigos
A Portaria 243/84: Tolerâncias para edifícios clandestinos
Para edifícios de construção clandestina que se pretendam legalizar, a Portaria n.º 243/84 estabelece condições mínimas de habitabilidade com tolerâncias específicas:
Pé-direito: redução até 2,35 m (em vez dos 2,40 m standard)
Corredores: largura mínima de 0,9 m
Instalações sanitárias: admite-se uma única casa de banho completa em habitações com mais de 4 compartimentos.
Requisitos técnicos fundamentais
Equipamentos obrigatórios
Instalação sanitária completa deve incluir:
Banheira ou base de duche
Sanita com autoclismo
Lavatório
Em cozinhas:
Lava-louça obrigatório
Ramal de esgoto com 50 mm de diâmetro
Resistência a temperaturas até 70°C
Ventilação e Iluminação Natural
Um dos aspetos mais desafiantes na reabilitação é garantir ventilação e iluminação adequadas:
Contacto direto com o exterior sempre que possível
Área envidraçada mínima: 0,54 m² (com 0,36 m² de área de abertura)
Sistemas alternativos apenas em casos excecionais devidamente justificados
Revestimentos e Impermeabilização
Revestimentos impermeáveis até 1,5 m de altura nas paredes
Materiais de fácil limpeza e resistentes à humidade
Pavimentos adequados com sistemas de drenagem eficazes
Na reabilitação, cada metro quadrado conta – a inteligência está em maximizar a funcionalidade sem comprometer a salubridade.
Soluções criativas para espaços reduzidos
Otimização do Layout
Disposições inteligentes:
Instalações sanitárias integradas em nichos ou aproveitamento de vãos existentes
Soluções compactas com equipamentos suspensos
Aproveitamento de espaços sob escadas ou em águas-furtadas
Equipamentos adequados:
Sanitas suspensas para facilitar limpeza e ganhar espaço visual
Lavatórios de canto ou semi-encastrados
Duches em vez de banheiras quando o espaço é limitado
Comunicações excepcionais
Em obras de pequena reorganização espacial, a Portaria 304/2019 admite:
Comunicação direta entre instalações sanitárias e compartimentos de habitação (exceto cozinhas)
Soluções preexistentes podem ser mantidas se garantirem salubridade
Medidas específicas para evitar difusão de odores
Aspetos práticos da implementação
Infraestruturas e Redes
Considerações essenciais:
Verificação da capacidade das redes existentes
Adaptação às cotas de esgoto disponíveis
Soluções de bombagem quando necessário
Ventilação das canalizações
Processo de Licenciamento
Documentação necessária:
Projeto de especialidades (águas e esgotos)
Justificação técnica para eventuais exceções
Termos de responsabilidade dos técnicos
Memória descritiva detalhada das soluções adotadas
Coordenação com outras Especialidades
Estruturas: verificação da capacidade de carga para equipamentos suspensos
Instalações elétricas: pontos de luz adequados e proteção em zonas húmidas
AVAC: coordenação com sistemas de ventilação mecânica quando aplicável

Conselhos para Proprietários e Promotores
Planeamento antecipado
Levantamento rigoroso das instalações existentes
Análise das limitações estruturais e de infraestruturas
Estudo de viabilidade económica das diferentes soluções
Seleção de materiais
Durabilidade adequada ao ambiente húmido
Facilidade de manutenção e substituição
Compatibilidade com sistemas existentes
Eficiência hídrica para redução de consumos
Acompanhamento técnico especializado
A complexidade da reabilitação exige acompanhamento por técnicos experientes que conheçam:
As especificidades da legislação aplicável
As melhores práticas construtivas para edifícios antigos
As soluções inovadoras disponíveis no mercado
Os procedimentos de licenciamento municipal
Casos especiais e exceções
Edifícios Classificados
Condicionantes adicionais:
Aprovação prévia de entidades patrimoniais
Preservação de elementos originais
Soluções discretas e reversíveis
Materiais compatíveis com a construção histórica
Construções em Zona de Proteção
Análise caso a caso pela Câmara Municipal
Pareceres vinculativos quando aplicável
Soluções que não comprometam a integridade visual do conjunto
Edifícios com mais de 30 anos
Para edifícios com mais de 30 anos, o RAREFA (Regime Aplicável à Reabilitação de Edifícios ou Frações Autónomas) permite:
Flexibilização de alguns requisitos técnicos
Adaptação às características preexistentes
Foco na melhoria das condições de habitabilidade
Para considerar
A reabilitação de instalações sanitárias em edifícios antigos representa muito mais do que uma simples atualização técnica. É um exercício de equilíbrio entre preservação patrimonial, viabilidade económica e qualidade de vida dos utilizadores.
O sucesso destes projetos passa por compreender que cada edifício é único, com as suas limitações e potencialidades específicas. A legislação atual oferece ferramentas flexíveis, mas a sua aplicação exige conhecimento especializado e criatividade técnica.
As tolerâncias previstas na lei não devem ser vistas como facilitismos, mas como reconhecimento das particularidades do edificado existente. O objetivo mantém-se inalterado: garantir condições dignas de habitabilidade, respeitando a memória construtiva e promovendo a sustentabilidade urbana.
A chave está em transformar constrangimentos em oportunidades, criando espaços funcionais, confortáveis e tecnicamente adequados, mesmo quando as dimensões são reduzidas ou as condicionantes são significativas.



