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Viabilidade Económica vs Técnica: O equilíbrio em Projetos de Arquitetura

  • Foto do escritor: Ana Carolina Santos
    Ana Carolina Santos
  • 2 de out.
  • 5 min de leitura

A harmonização entre viabilidade económica e técnica representa um dos maiores desafios contemporâneos na conceção de projetos arquitetónicos em Portugal. Em tempos de crescente complexidade normativa e pressões orçamentais, encontrar o ponto de equilíbrio entre estas duas dimensões tornou-se essencial para o sucesso de qualquer empreendimento construtivo.


Edifício pombalino na Baixa Chiado após obras de reabilitação e remodelação
Edifício pombalino na Baixa Chiado após obras de reabilitação e remodelação

Compreender a Viabilidade Económica


A viabilidade económica constitui o pilar financeiro de qualquer projeto, determinando se o investimento proposto pode gerar retorno adequado. Esta análise engloba múltiplos fatores que se interligam numa complexa equação de custos e benefícios.



Elementos fundamentais da Análise Económica


  • Custos diretos e indiretos: Os custos diretos incluem materiais, mão-de-obra especializada e equipamentos específicos. Paralelamente, os custos indiretos abrangem despesas administrativas, seguros e margem de lucro, frequentemente calculados através do BDI (Benefícios e Despesas Indiretas).

  • Análise de Mercado: A compreensão do mercado local determina a viabilidade de venda ou arrendamento do empreendimento. Factores como localização, tipologia da habitação e procura específica influenciam diretamente o potencial de retorno do investimento.

  • Instrumentos de Avaliação Financeira: Utilizam-se indicadores como VPL (Valor Presente Líquido), TIR (Taxa Interna de Retorno) e Payback para determinar a atratividade do investimento. Estes instrumentos permitem comparar diferentes cenários e otimizar a rentabilidade do projeto.



Variáveis que impactam a Viabilidade Económica


A flutuação dos custos de materiais representa uma das principais preocupações. A inflação dos preços de construção, que atingiu 3,1% em janeiro de 2024, demonstra a volatilidade do setor. Esta variabilidade exige estratégias de mitigação, como:

  • Contratos com fornecedores que incluam cláusulas de revisão

  • Diversificação de fontes de materiais

  • Planeamento de compras antecipado

  • Reservas financeiras para contingências



Dimensão técnica: Fundamento da exequibilidade


A viabilidade técnica avalia se o projeto pode ser fisicamente construído, respeitando normas e regulamentos vigentes. Esta análise precede frequentemente a económica, uma vez que determina os parâmetros base do empreendimento.



Conformidade regulamentar


O enquadramento legal português, sustentado pelo RJUE, RGEU, Decreto-Lei 163/2006 e Portaria 243/84, estabelece condicionantes técnicas rigorosas que influenciam diretamente os custos do projeto.

Regime Jurídico da Urbanização e Edificação (RJUE): Define procedimentos de licenciamento e parâmetros urbanísticos básicos. O cumprimento destes requisitos pode representar custos significativos, especialmente em terrenos com limitações específicas.

Regulamento Geral das Edificações Urbanas (RGEU): Estabelece normas técnicas de construção, incluindo requisitos de segurança, salubridade e acessibilidade. A conformidade com estas disposições pode exigir soluções técnicas mais onerosas.

Decreto-Lei 163/2006 - Acessibilidades: Impõe requisitos específicos de acessibilidade que podem representar custos adicionais substanciais, especialmente em projetos de reabilitação:

  • Instalação de elevadores ou plataformas elevatórias

  • Adaptação de instalações sanitárias

  • Alargamento de vãos e corredores

  • Implementação de sinalização tátil

Portaria 243/84: Oferece tolerâncias para construções clandestinas, permitindo flexibilização de requisitos em projetos de legalização. Esta disposição pode representar poupanças significativas ao evitar demolições ou alterações estruturais complexas.



Condicionantes Técnicas específicas


  • Características Geotécnicas: O estudo do solo determina soluções de fundação, podendo impactar significativamente o orçamento. Terrenos com baixa capacidade de carga ou presença de água subterrânea exigem soluções técnicas mais dispendiosas.

  • Infraestruturas disponíveis: A existência de redes de água, esgotos, eletricidade e telecomunicações afeta diretamente a viabilidade do projeto. A ausência destas infraestruturas pode representar custos adicionais consideráveis.

  • Condicionantes Ambientais: Restrições ambientais, zonas de proteção e servidões podem limitar a construção, afetando tanto a viabilidade técnica quanto a económica.



Estratégias de harmonização


O sucesso de um projeto arquitetónico resulta da capacidade de harmonizar eficientemente as dimensões económica e técnica. Esta harmonização exige uma abordagem integrada desde as fases iniciais do projeto.


Análise integrada na Fase de Conceção

Estudos de Viabilidade preliminares: A realização de estudos de viabilidade abrangentes permite identificar precocemente potenciais conflitos entre requisitos técnicos e limitações orçamentais. Estes estudos devem incluir:

  • Análise urbanística detalhada

  • Levantamento topográfico rigoroso

  • Estudo geotécnico preliminar

  • Estimativa de custos por fase

  • Projeção de receitas esperadas

Otimização de soluções técnicas: A seleção criteriosa de materiais e sistemas construtivos permite equilibrar qualidade e custo. Considera-se não apenas o preço inicial, mas também:

  • Durabilidade e vida útil dos materiais

  • Custos de manutenção futuros

  • Eficiência energética

  • Facilidade de execução


Estratégias de Mitigação de Riscos

  • Faseamento inteligente: A divisão do projeto em fases permite distribuir investimentos ao longo do tempo, reduzindo riscos financeiros e permitindo ajustes conforme a evolução do mercado.

  • Flexibilidade projetual: Soluções arquitetónicas que permitam adaptações futuras oferecem maior resiliência a mudanças de mercado ou alterações regulamentares.

  • Reservas de contingência: A constituição de reservas financeiras específicas para imprevistos técnicos protege o projeto de custos inesperados decorrentes de condicionantes não identificadas inicialmente.



Casos práticos: Lições da experiência


Reabilitação Urbana: Desafio técnico-económico

Um projeto de reabilitação de edifício pombalino no centro de Lisboa exemplifica os desafios desta harmonização. As limitações técnicas - pé-direito reduzido, estruturas antigas, ausência de elevador - confrontaram-se com as exigências de acessibilidade do Decreto-Lei 163/2006.

A solução encontrada combinou:

  • Aplicação das tolerâncias da Portaria 243/84

  • Instalação de elevador exterior

  • Otimização de espaços através de soluções inovadoras

O resultado: redução de 30% nos custos inicialmente previstos, mantendo a conformidade legal.


Habitação Social: Equilíbrio necessário

Em projeto de habitação social no Porto, a pressão para reduzir custos confrontou-se com requisitos mínimos de qualidade habitacional. A estratégia adotada incluiu:

  • Tipologias otimizadas que maximizavam áreas úteis

  • Materiais locais com boa relação custo-benefício

  • Sistemas construtivos pré-fabricados

  • Soluções energéticas eficientes


"O equilíbrio entre viabilidade económica e técnica não representa um compromisso entre qualidade e custo, mas sim a otimização inteligente de recursos para maximizar valor."


Ferramentas de apoio à decisão


Tecnologia BIM na Análise de Viabilidade

A implementação de tecnologias BIM (Building Information Modeling) revoluciona a análise de viabilidade ao permitir:

  • Simulação de diferentes cenários construtivos

  • Quantificação automática de materiais

  • Análise de conflitos antes da execução

  • Otimização de soluções técnicas


Indicadores de Performance

O desenvolvimento de indicadores específicos facilita a tomada de decisão:

  • Índice de Eficiência Técnica (IET): Relaciona o cumprimento de requisitos técnicos com o custo necessário para os satisfazer.

  • Rácio Custo-Benefício Ambiental: Avalia o impacto ambiental face aos custos de implementação de soluções sustentáveis.

  • Taxa de Flexibilidade Projetual: Mede a capacidade de adaptação do projeto a mudanças futuras sem comprometer a viabilidade económica.


Vista interior de um dos apartamentos do edifício pombalino na Baixa Chiado após obras de reabilitação e remodelação
Vista interior de um dos apartamentos do edifício pombalino na Baixa Chiado após obras de reabilitação e remodelação

Tendências emergentes


Sustentabilidade como fator de equilíbrio

A crescente valorização da sustentabilidade cria novas oportunidades de harmonização entre viabilidade económica e técnica. Soluções inicialmente mais onerosas demonstram retornos positivos através de:

  • Poupanças energéticas a longo prazo

  • Valorização imobiliária superior

  • Benefícios fiscais e incentivos públicos

  • Redução de custos de manutenção


Digitalização e Automação

A integração de sistemas inteligentes nos edifícios cria valor acrescentado que justifica investimentos técnicos superiores, melhorando simultaneamente a eficiência operacional e a atratividade comercial.



Desafios futuros


Complexidade Regulamentar crescente

A evolução da legislação, particularmente em matérias ambientais e de eficiência energética, exigirá adaptação constante das estratégias de harmonização entre viabilidade económica e técnica.


Escassez de Recursos

A crescente escassez de materiais e mão-de-obra qualificada pressiona tanto a dimensão técnica quanto a económica, exigindo soluções cada vez mais inovadoras.


Alterações Climáticas

Os impactos das alterações climáticas introduzem novos requisitos técnicos que devem ser integrados na análise de viabilidade económica dos projetos.



Em poucas palavras


A harmonização entre viabilidade económica e técnica representa o cerne do sucesso em projetos arquitetónicos contemporâneos. Este equilíbrio não resulta de compromissos que sacrifiquem qualidade por economia, mas da otimização inteligente que maximiza valor através da integração eficiente de conhecimento técnico e gestão financeira.

O domínio da legislação portuguesa - RJUE, RGEU, Decreto-Lei 163/2006 e Portaria 243/84 - constitui ferramenta fundamental para identificar oportunidades de otimização e evitar custos desnecessários. Simultaneamente, a aplicação de metodologias rigorosas de análise económica assegura a sustentabilidade financeira dos projetos.

O futuro da arquitetura em Portugal dependerá da capacidade dos profissionais em navegar esta complexa equação, transformando desafios regulamentares e económicos em oportunidades de criação de valor duradouro.

A excelência profissional manifesta-se precisamente nesta capacidade de harmonização, criando projetos que não apenas cumprem requisitos técnicos e objetivos económicos, mas contribuem positivamente para a qualidade do ambiente construído e para o desenvolvimento sustentável do território.

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