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Espaços exteriores inclusivos: Normas e soluções de acessibilidade para jardins, parques e áreas de recreio

  • Foto do escritor: Ana Carolina Santos
    Ana Carolina Santos
  • 5 de set.
  • 5 min de leitura

A criação de espaços exteriores acessíveis a todos representa muito mais do que o simples cumprimento de normas legais — é um investimento na qualidade de vida coletiva e na coesão social das nossas comunidades. Jardins, parques e áreas de recreio constituem espaços fundamentais para o bem-estar físico e mental, devendo estar disponíveis para todos os cidadãos, independentemente das suas capacidades ou limitações de mobilidade.


Área de recreio em bairro habitacional em Loures
Área de recreio em bairro habitacional em Loures


Decreto-Lei n.º 163/2006: O pilar da Acessibilidade

O Decreto-Lei n.º 163/2006, de 8 de agosto, estabelece o regime da acessibilidade aos edifícios e estabelecimentos que recebem público, incluindo especificamente os espaços exteriores. Este diploma legal define normas técnicas obrigatórias que se aplicam a:

  • Espaços de recreio e lazer: parques infantis, parques de diversões, jardins e praias

  • Via pública: passeios e outros percursos pedonais pavimentados

  • Espaços de estacionamento: marginal à via pública ou em parques públicos

  • Equipamentos desportivos ao ar livre: campos de jogos, pistas e instalações conexas


Âmbito de aplicação

As normas técnicas aplicam-se tanto a espaços públicos como privados quando estes:

  • Recebem público em geral

  • São equipamentos de utilização coletiva

  • Integram loteamentos ou operações urbanísticas

  • Fazem parte de estabelecimentos comerciais ou de serviços



Requisitos técnicos fundamentais


Características essenciais dos percursos

  • Largura mínima: 1,2 m em todo o desenvolvimento

  • Inclinação longitudinal: máxima de 5% (caso contrário considera-se rampa)

  • Inclinação transversal: não superior a 2%

  • Altura livre: mínimo de 2,4 m nos espaços não encerrados


Pavimentos e Revestimentos

Os pavimentos devem ser:

  • Estáveis: não se deslocam quando sujeitos a ações mecânicas

  • Duráveis: resistentes à chuva e lavagens frequentes

  • Firmes: não deformáveis sob uso normal

  • Contínuos: juntas não superiores a 0,005 m de profundidade

  • Antiderrapantes: especialmente importante em zonas húmidas



Rampas em espaços exteriores

As rampas constituem elementos fundamentais para vencer desníveis, devendo cumprir:


Especificações técnicas

  • Inclinação máxima: 6% para desníveis até 0,6 m

  • Inclinação alternativa: 8% para desníveis até 0,4 m

  • Largura mínima: 1,2 m

  • Plataformas de descanso: obrigatórias na base, topo e mudanças de direção

  • Corrimãos: duplos (0,85-0,95 m e 0,70-0,75 m) em inclinações superiores a 6%


Proteções laterais obrigatórias

  • Rebordos laterais com altura mínima de 0,05 m

  • Guardas com espaçamento máximo de 0,30 m entre elementos verticais

  • Barreiras com distância ao pavimento não superior a 0,05 m


Escadas e elementos verticais

Quando inevitáveis, as escadas devem apresentar:

  • Largura mínima: 1,2 m nos lanços e patamares

  • Degraus uniformes: cobertor mínimo de 0,28 m, espelho máximo de 0,18 m

  • Corrimãos bilaterais: altura entre 0,85 m e 0,90 m

  • Patamares intermédios: quando o desnível excede 2,4 m

  • Faixas antiderrapantes: junto ao focinho dos degraus



Zonas específicas de lazer


Requisitos fundamentais

  • Piso de segurança: material absorvente de impactos e acessível a cadeiras de rodas

  • Percursos de ligação: conectando todos os equipamentos

  • Equipamentos inclusivos: permitindo uso por crianças com diferentes capacidades

  • Áreas de descanso: bancos e zonas de sombra próximas aos equipamentos


Dimensões e Acessos

  • Zona livre mínima de 0,75 m x 1,20 m para aproximação

  • Transferências laterais facilitadas para equipamentos

  • Alturas variadas de equipamentos para diferentes faixas etárias



Jardins e Parques


Elementos vegetais e Paisagismo

  • Árvores: caldeiras ao nível do piso com grelhas de proteção

  • Canteiros elevados: altura entre 0,75 m e 0,85 m para alcance confortável

  • Plantas: evitar espécies com espinhos ou elementos contundentes junto aos percursos

  • Sombreamento: elementos naturais ou artificiais nos percursos principais


Mobiliário Urbano

  • Bancos: altura do assento entre 0,40-0,45 m, com encosto e apoios de braços

  • Mesas: altura útil de 0,70-0,85 m, espaço livre inferior mínimo de 0,65 m

  • Papeleiras e bebedouros: altura operacional entre 0,80-1,20 m

  • Iluminação: garantir segurança nos percursos noturnos



Estacionamento e Acessos


Número obrigatório de lugares

Lotação total

Lugares reservados

Até 10 lugares

1 lugar

11-25 lugares

2 lugares

26-100 lugares

3 lugares

101-500 lugares

4 lugares

Mais de 500

1 por cada 100


Características dos lugares

  • Dimensões: 2,5 m de largura + 1 m de faixa lateral de acesso

  • Comprimento: mínimo 5 m

  • Localização: próximo do percurso mais curto para o acesso principal

  • Sinalização: símbolo internacional de acessibilidade horizontal e vertical



Planeamento e Conceção


Fase de Projeto

  • Levantamento topográfico rigoroso: identificar desníveis e obstáculos

  • Análise de fluxos: estudar percursos naturais dos utilizadores

  • Integração paisagística: harmonizar soluções acessíveis com o ambiente

  • Manutenção futura: prever facilidade de conservação dos elementos


Materiais recomendados

  • Pavimentos: betão desativado, pedra natural antiderrapante, pavimento drenante

  • Corrimãos: aço inoxidável ou aluminio com tratamento anticorrosivo

  • Sinalização: materiais refletores e resistentes aos UV

  • Vegetação: espécies autóctones de baixa manutenção



Implementação faseada

  1. Acessos principais: garantir pelo menos um percurso acessível

  2. Instalações sanitárias: adaptação prioritária nos espaços existentes

  3. Áreas de estadia: bancos e zonas de descanso acessíveis

  4. Equipamentos: parques infantis e mobiliário urbano

  5. Sinalética: informação clara sobre percursos e serviços acessíveis



Manutenção e Conservação

  • Limpeza regular: remoção de folhas, detritos e elementos escorregadios

  • Verificação periódica: integridade de pavimentos e sinalização

  • Poda adequada: manter alturas livres nos percursos

  • Drenagem: assegurar escoamento eficaz de águas pluviais


Área de recreio em bairro habitacional em Loures, em vista aérea
Área de recreio em bairro habitacional em Loures, em vista aérea

Benefícios da Acessibilidade Universal


Impacto social

A implementação de soluções acessíveis em espaços exteriores produz benefícios que se estendem muito além do cumprimento legal:

  • Inclusão social: promoção do convívio entre pessoas de todas as capacidades

  • Autonomia: independência na fruição dos espaços de lazer

  • Saúde pública: incentivo à atividade física e contacto com a natureza

  • Coesão comunitária: criação de espaços verdadeiramente democráticos


Vantagens económicas

  • Valorização imobiliária: espaços acessíveis valorizam as áreas envolventes

  • Redução de custos futuros: intervenções planeadas evitam adaptações posteriores

  • Ampliação do público-alvo: espaços utilizáveis por mais pessoas

  • Cumprimento legal: evitar sanções e processos por incumprimento



Erros comuns a evitar


Conceção inadequada

  • Percursos com inclinações excessivas não sinalizadas como rampas

  • Pavimentos inadequados que se tornam escorregadios

  • Ausência de zonas de descanso em percursos longos

  • Sinalização insuficiente ou mal posicionada


Execução deficiente

  • Juntas de dilatação excessivamente largas nos pavimentos

  • Corrimãos descontínuos ou com alturas incorretas

  • Elementos vegetais que invadem os percursos acessíveis

  • Mobiliário urbano mal posicionado, criando obstáculos


Manutenção negligente

  • Acumulação de detritos vegetais nos percursos

  • Deterioração de pavimentos não reparada atempadamente

  • Crescimento descontrolado da vegetação sobre os percursos

  • Sinalização danificada ou desatualizada



Para considerar


A criação de espaços exteriores verdadeiramente acessíveis representa um investimento no futuro das nossas comunidades. Mais do que o cumprimento de normas técnicas, trata-se de materializar o princípio de que todos os cidadãos têm direito a desfrutar dos benefícios do contacto com a natureza e das atividades de lazer ao ar livre.

O sucesso destes projetos depende não apenas do conhecimento técnico das normas aplicáveis, mas também de uma abordagem sensível às necessidades reais dos utilizadores. A colaboração com profissionais especializados, desde a fase de conceção até à implementação, é essencial para garantir soluções eficazes, sustentáveis e verdadeiramente inclusivas.

Investir na acessibilidade dos espaços exteriores é criar lugares onde a diversidade humana é celebrada e onde todos podem participar plenamente na vida comunitária. É um passo fundamental na construção de sociedades mais justas e inclusivas.


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