Regras Técnicas para Habitação de Custos Controlados
- Ana Carolina Santos
- 14 de set.
- 4 min de leitura
Portugal dispõe de um extenso quadro normativo que regula a construção habitacional, estabelecendo regras precisas para garantir qualidade, segurança e funcionalidade das habitações. Este conjunto de normas visa assegurar condições dignas de habitabilidade para todos os cidadãos, especialmente quando se trata de habitação destinada a classes sociais com menor poder económico.

O panorama legislativo atual
O sistema normativo português para a construção habitacional assenta em diversos diplomas fundamentais:
Regime Jurídico da Urbanização e Edificação (RJUE) - estabelece os procedimentos de licenciamento
Regulamento Geral das Edificações Urbanas (RGEU) - define as condições técnicas das edificações
Decreto Regulamentar n.º 5/2019 - fixa conceitos técnicos do ordenamento do território
Lei n.º 2110/1961 - regulamenta estradas e caminhos municipais
Portaria n.º 243/84 - estabelece condições mínimas para habitação clandestina
As Regras Técnicas para Habitação de Custos Controlados
As Regras Técnicas para Habitação de Custos Controlados (RTHCC) representam uma abordagem pragmática às necessidades habitacionais portuguesas. Estas normas procuram equilibrar:
Qualidade habitacional mínima aceitável
Condições de salubridade adequadas
Segurança estrutural garantida
Funcionalidade dos espaços habitacionais
Controlo de custos de construção
Racionalização de materiais e processos construtivos
Optimização de áreas e volumes
Simplificação de procedimentos técnicos
Dimensões mínimas dos compartimentos
As RTHCC estabelecem parâmetros específicos para as dimensões dos compartimentos habitacionais:
Compartimentos principais
Área mínima: 8 m² (exceto casos específicos)
Dimensão mínima: 2,10 m em qualquer direção
Pé-direito mínimo: 2,35 m (redução face aos 2,70 m do RGEU)
Compartimentos especiais
Habitações com menos de 5 compartimentos: pelo menos um com 10,5 m²
Habitações com 5 ou mais compartimentos: mínimo de 2 compartimentos com 10,5 m²
Cozinhas: área mínima de 5 m² (reduzível a 4 m² em habitações pequenas)
Configuração espacial
Forma dos compartimentos: comprimento não superior ao dobro da largura
Círculo inscritível: diâmetro mínimo de 1,8 m (reduzível a 1,6 m em cozinhas pequenas)
Corredores: largura mínima de 0,9 m
Elementos de Circulação Vertical
Escadas
Largura dos lanços: reduzível a 1 m (em edifícios coletivos até 2 pisos ou 4 habitações)
Dimensões dos degraus: largura mínima 0,22 m, altura máxima 0,193 m
Patins: largura não inferior à dos lanços
Considerações de Segurança
Obrigatoriedade de corrimãos em escadas com desnível superior a 0,4 m
Materiais antiderrapantes nos degraus
Iluminação adequada das zonas de circulação
Infraestruturas e Instalações
Abastecimento de Água e Saneamento
Ligação obrigatória às redes públicas quando disponíveis
Instalações sanitárias: pelo menos uma casa de banho completa
Ventilação: natural ou forçada adequada
Sistemas Elétricos e de Gás
Conformidade com normas de segurança em vigor
Localização adequada de contadores e quadros elétricos
Ventilação específica para aparelhos a gás
Definições essenciais do Decreto Regulamentar n.º 5/2019
O ordenamento jurídico português atual estabelece conceitos técnicos precisos que devem ser aplicados consistentemente:
Parâmetros de Edificação
Área de Construção (Ac): somatório das áreas de todos os pisos
Área de Implantação (Ai): área ocupada pelo edifício no solo
Altura da Edificação (H): dimensão vertical desde a cota de soleira
Cércea: altura máxima da fachada
Indicadores Urbanísticos
Índice de Ocupação do Solo (Io): percentagem de solo ocupado
Índice de Utilização do Solo (Iu): intensidade de edificação
Densidade Habitacional: número de fogos por hectare
Aplicação prática
Licenciamento e Procedimentos
As RTHCC integram-se no sistema geral de licenciamento, mas com algumas especificidades:
Comunicação prévia para operações em áreas consolidadas
Redução de prazos administrativos
Menor complexidade procedimental
Responsabilização acrescida dos técnicos
Licenciamento para operações em áreas não planeadas
Análise técnica completa
Consulta pública quando necessária
Verificação de conformidade normativa
Responsabilidades Técnicas
Projetista: responsável pela conformidade do projeto
Diretor de obra: supervisão da execução
Fiscal de obra: verificação da qualidade construtiva
Benefícios e Limitações
Vantagens das RTHCC
Acessibilidade económica
Redução significativa dos custos de construção
Manutenção de padrões mínimos de qualidade
Facilidade de acesso à habitação própria
Simplificação procedimental
Procedimentos administrativos mais ágeis
Menor complexidade técnica
Redução de prazos de aprovação
Flexibilidade adaptativa
Adequação a diferentes contextos urbanos
Possibilidade de soluções inovadoras
Resposta a necessidades específicas locais
Limitações e Precauções
Riscos de qualidade
Necessária vigilância na aplicação das normas mínimas
Importância da fiscalização durante a construção
Verificação de conformidade com outras normas aplicáveis
Contexto urbano
Necessidade de integração harmoniosa no tecido urbano
Atenção aos impactos na qualidade arquitetónica geral
Consideração de infraestruturas urbanas existentes
Modernização do quadro legal
O sistema normativo português tem vindo a evoluir no sentido da:
Digitalização de procedimentos
Plataforma eletrónica de procedimentos urbanísticos
Desmaterialização de processos
Interoperabilidade entre sistemas
Sustentabilidade ambiental
Integração de critérios energéticos
Promoção de materiais sustentáveis
Consideração de impactos ambientais
Acessibilidade universal
Cumprimento de normas de acessibilidade
Desenho universal na habitação
Inclusão de pessoas com mobilidade reduzida
Desafios futuros
Adaptação Climática
Resistência a fenómenos meteorológicos extremos
Eficiência energética e conforto térmico
Gestão sustentável de recursos hídricos
Inovação Tecnológica
Integração de novas tecnologias construtivas
Sistemas domóticos e inteligentes
Materiais de construção inovadores
Para refletir
As Regras Técnicas para Habitação de Custos Controlados representam um equilíbrio necessário entre a garantia de condições dignas de habitabilidade e a realidade económica portuguesa. A sua aplicação requer conhecimento técnico especializado e uma abordagem cuidadosa que não comprometa a qualidade urbanística e arquitetónica dos nossos centros urbanos.
A evolução constante do quadro normativo português demonstra o compromisso com a melhoria contínua das condições habitacionais, mas também a necessidade de adaptação às novas realidades sociais, económicas e ambientais. É fundamental que proprietários, promotores e técnicos mantenham-se atualizados relativamente a estas normas e às suas implicações práticas.
A aplicação adequada destas regras não deve ser vista como uma limitação, mas sim como uma oportunidade para desenvolver soluções habitacionais criativas, funcionais e acessíveis, contribuindo para a construção de cidades mais inclusivas e sustentáveis.