Requisitos de proteção e habitabilidade na Reabilitação de edifícios
- Ana Carolina Santos
- 22 de jun.
- 5 min de leitura
A reabilitação de edifícios em Portugal tem-se tornado uma prática cada vez mais comum, especialmente em centros urbanos onde a pressão habitacional exige soluções criativas e sustentáveis. No entanto, muitos proprietários e promotores desconhecem as obrigações específicas de segurança e salubridade que se aplicam a estes projetos, particularmente quando se trata de edifícios com origem clandestina ou que não cumprem integralmente as normas atuais. A reabilitação não é apenas uma questão de estética - é fundamentalmente uma questão de segurança e qualidade de vida.

O enquadramento legal da Reabilitação
A Portaria n.º 243/84
A Portaria n.º 243/84, de 17 de abril, surgiu como resposta a um problema prático que afetava milhares de habitações em Portugal. Esta legislação estabelece condições mínimas de habitabilidade para edifícios clandestinos suscetíveis de reabilitação, criando um enquadramento legal que permite a sua legalização sem exigir o cumprimento integral do Regulamento Geral das Edificações Urbanas (RGEU).
Quando se aplica esta legislação
A portaria aplica-se exclusivamente a edifícios que cumpram dois requisitos essenciais:
Acesso independente - o edifício deve ter entrada própria, não partilhada
Possibilidade de ligação às infraestruturas - deve ser viável conectar o edifício às redes gerais de água, eletricidade e saneamento
Obrigações de segurança em Projetos de Reabilitação
Vistoria técnica obrigatória
Antes de qualquer intervenção, é obrigatória a realização de uma vistoria técnica que analise:
Condições de segurança estrutural - avaliação da estabilidade do edifício
Condições de habitabilidade - verificação se o espaço pode ser usado para habitação
Edifícios contíguos - análise do impacto em construções vizinhas
Esta vistoria deve ser conduzida por técnicos qualificados que avaliem se a reabilitação é tecnicamente viável e economicamente sustentável.
Requisitos estruturais e de estabilidade
Todo o projeto de reabilitação deve garantir que:
A resistência mecânica da estrutura é adequada
A estabilidade do edifício não é comprometida
Os sistemas de segurança contra incêndio estão funcionais
As condições de evacuação são adequadas
Obrigações de salubridade e habitabilidade
Condições mínimas de habitabilidade
A legislação estabelece tolerâncias específicas em relação ao RGEU, permitindo condições mínimas que, embora reduzidas, garantem a habitabilidade:
Áreas dos compartimentos
Sala principal: mínimo de 10,5 m² (em habitações com menos de 5 divisões)
Quartos: mínimo de 8 m² (tolerância para 7 m² em casos específicos)
Cozinha: mínimo de 5 m² (reduzível para 4 m² em habitações pequenas)
Pé-direito mínimo
Altura livre: mínimo de 2,35 m (redução face aos 2,40 m do RGEU)
Sótãos habitáveis: o pé-direito pode ser inferior em metade da área
Proporções dos compartimentos
O comprimento não pode exceder o dobro da largura
Deve ser possível inscrever um círculo de 1,8 m de diâmetro entre paredes (1,6 m para cozinhas pequenas)
Instalações sanitárias e infraestruturas
A legislação permite flexibilidade nas instalações sanitárias:
Uma casa de banho completa é suficiente para habitações com mais de 4 compartimentos
Deve garantir-se acesso a água potável e saneamento adequado
As instalações elétricas devem cumprir as normas de segurança
Aspectos práticos da implementação
Demolições necessárias
Em muitos casos, a legalização exige a demolição de paredes interiores para:
Adequar as dimensões dos compartimentos
Melhorar a circulação interna
Garantir a conformidade com os requisitos mínimos
Ligação às infraestruturas
É fundamental garantir que o edifício pode ser conectado às redes públicas:
Rede de abastecimento de água
Sistema de saneamento
Rede elétrica
Gás natural (quando aplicável)
Documentação técnica necessária
Todo o processo requer documentação específica:
Projeto de Çegalização elaborado por técnico qualificado
Relatório de vistoria técnica
Plantas e alçados atualizados
Termo de responsabilidade do técnico responsável
Desafios comuns na Reabilitação
Constrangimentos económicos
A reabilitação de edifícios clandestinos pode implicar investimentos significativos:
Custos de adequação estrutural
Taxas de legalização municipais
Eventuais multas por construção irregular
Obras de infraestruturas
Questões técnicas complexas
Muitos edifícios apresentam desafios técnicos específicos:
Materiais desatualizados ou inadequados
Estruturas com deficiências de conceção
Incompatibilidade com normas atuais
Problemas de humidade e infiltrações
Evolução Regulamentar recente
Novo Regime de Reabilitação
O Decreto-Lei n.º 95/2019 introduziu um novo enquadramento para a reabilitação, estabelecendo:
Requisitos funcionais adaptados à reabilitação
Tolerâncias específicas para edifícios antigos
Procedimentos simplificados de Licenciamento
Maior flexibilidade regulamentar
Esta portaria define requisitos funcionais específicos para a reabilitação de edifícios com licença anterior a 1977:
Áreas mínimas diferenciadas
Critérios de acessibilidade adaptados
Requisitos acústicos flexibilizados
Normas de segurança ajustadas

Recomendações práticas
Antes de iniciar o projeto
Consultar um arquiteto qualificado para avaliar a viabilidade
Realizar vistoria técnica preliminar com engenheiro estrutural
Verificar as condições de Licenciamento junto da Câmara Municipal
Avaliar os custos totais do projeto
Durante o processo
Manter comunicação regular com a Câmara Municipal
Documentar todas as alterações realizadas
Garantir a qualidade dos materiais utilizados
Respeitar os prazos estabelecidos no alvará
Após a conclusão
Solicitar a vistoria final municipal
Obter o certificado de habitabilidade
Atualizar a documentação no registo predial
Manter a documentação técnica organizada
Conselhos profissionais
Escolha da equipa técnica
A seleção de profissionais qualificados é crucial para o sucesso do projeto:
Arquiteto com experiência em reabilitação
Engenheiro civil especializado em estruturas antigas
Empreiteiro com conhecimento regulamentar
Consultor legal para questões complexas
Gestão de expectativas
É importante ter expectativas realistas sobre:
Prazos de aprovação (podem ser longos)
Custos finais (frequentemente superiores ao previsto)
Alterações necessárias (podem ser significativas)
Conformidade final (pode não ser 100% com normas atuais)
Para refletir
A reabilitação de edifícios em Portugal representa uma oportunidade única de valorizar o património construído, contribuindo simultaneamente para a resolução da crise habitacional e para a sustentabilidade urbana. No entanto, este processo exige conhecimento técnico especializado e cumprimento rigoroso das obrigações legais de segurança e salubridade.
A Portaria n.º 243/84 continua a ser um instrumento fundamental para a legalização de edifícios clandestinos, oferecendo um equilíbrio pragmático entre as exigências regulamentares e a realidade do parque edificado português. A evolução regulamentar recente, com o novo regime de reabilitação, demonstra o compromisso das autoridades em facilitar estes processos, mantendo sempre como prioridade a segurança e o bem-estar dos utilizadores.
Investir na reabilitação adequada não é apenas uma obrigação legal - é um investimento na qualidade de vida, na valorização patrimonial e no futuro sustentável das nossas cidades. A complexidade destes projetos exige sempre o acompanhamento de profissionais qualificados, capazes de caminhar pelos desafios técnicos e regulamentares com competência e segurança.
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