Demolição de paredes interiores: Quando a Legalização exige alterações estruturais
- Ana Carolina Santos
- 17 de jun.
- 6 min de leitura
A legalização de habitações clandestinas ou a reabilitação de edifícios antigos envolve frequentemente a necessidade de demolir paredes interiores. Esta exigência, prevista na Portaria n.º 243/84, não é uma capricho burocrático, mas sim uma medida essencial para garantir que as habitações cumpram condições mínimas de segurança, funcionalidade e habitabilidade.
A demolição de paredes interiores é muitas vezes o preço a pagar para transformar uma construção irregular numa habitação legal e segura.
O artigo 3.º da Portaria 243/84 é claro: "Deverá ser garantida a demolição de paredes interiores, quando esta for exigida para a legalização do edifício". Esta disposição reconhece que muitas construções clandestinas foram erguidas sem respeitar os mínimos técnicos de habitabilidade, criando compartimentos demasiado pequenos, mal ventilados ou com configurações inadequadas.

Situações que exigem demolição de paredes
Compartimentos com dimensões insuficientes
A principal razão para demolir paredes interiores prende-se com o cumprimento das áreas mínimas obrigatórias. A Portaria 243/84 estabelece que os compartimentos não podem ter área inferior a 8 m², exceto em casos muito específicos.
Quando uma habitação apresenta:
Quartos com menos de 8 m² - devem ser unidos a compartimentos adjacentes
Salas fragmentadas - divisões artificiais que comprometem a funcionalidade
Corredores excessivamente estreitos - largura inferior a 0,9 m obrigatórios
Compartimentos sem ventilação adequada - criados por subdivisões inadequadas
Problemas de Proporcionalidade
A legislação exige que "o comprimento não exceda o dobro da largura" e que seja possível inscrever um círculo de diâmetro mínimo de 1,8 m em cada compartimento. Paredes que criem espaços excessivamente alongados ou irregulares devem ser removidas.
Violação das Regras de Habitabilidade
Quando as divisões interiores impedem:
Iluminação natural adequada nos compartimentos principais
Ventilação cruzada essencial para a salubridade
Acesso seguro entre compartimentos
Utilização funcional dos espaços
O processo de Avaliação Técnica
Vistoria obrigatória
Antes de qualquer demolição, a Portaria 243/84 exige "vistoria técnica à análise das condições de segurança e de habitabilidade dos edifícios clandestinos de habitação suscetíveis de eventual reabilitação". Esta vistoria determina:
Quais paredes podem ser removidas sem comprometer a estrutura
Que alterações são necessárias para cumprir a lei
Se a reabilitação é tecnicamente viável
Impactos em "edificações que lhes fiquem contíguas"
Critérios de decisão
A necessidade de demolição é avaliada considerando:
Segurança estrutural - identificação de paredes resistentes
Cumprimento dimensional - adequação às áreas mínimas
Funcionalidade - criação de espaços habitáveis
Viabilidade económica - custo-benefício da intervenção
Tipos de paredes que podem ser demolidas
Paredes divisórias não estruturais
As paredes mais facilmente removíveis são:
Tabiques de tijolo sem função estrutural
Divisórias de madeira ou materiais leves
Paredes de gesso cartonado ou similares
Muros de pedra solta sem argamassa
Paredes que requerem cuidados especiais
Algumas situações exigem análise estrutural aprofundada:
Paredes de meação entre frações
Elementos com instalações técnicas embutidas
Paredes com vãos estruturais (portas e janelas de grande dimensão)
Divisórias em edifícios antigos com função de contraventamento
Paredes que nunca devem ser demolidas
São absolutamente interditas demolições de:
Paredes resistentes que suportam a estrutura
Muros de contenção que garantem estabilidade
Paredes de fachada que definem o perímetro
Elementos com função anti-sísmica essencial
Impactos e consequências da demolição
Benefícios imediatos
A remoção de paredes inadequadas proporciona:
Criação de espaços funcionais que cumprem as dimensões legais
Melhoria da ventilação e iluminação natural
Maior flexibilidade na organização dos espaços
Valorização do imóvel através da legalização
Custos associados
As demolições implicam despesas significativas:
Projeto técnico com análise estrutural
Mão de obra especializada para execução segura
Remoção e gestão de entulhos conforme normas ambientais
Reconstrução e acabamentos dos espaços alterados
Riscos a considerar
Demolições mal planeadas podem resultar em:
Danos estruturais irreversíveis
Problemas de estabilidade em edifícios adjacentes
Corte acidental de instalações técnicas
Custos adicionais de reparação
Alternativas à demolição total
Aberturas parciais
Em alguns casos, é possível evitar demolições completas criando:
Vãos de passagem entre compartimentos pequenos
Aberturas altas que mantêm privacidade mas melhoram ventilação
Divisórias móveis que permitem flexibilidade de uso
Mezaninos que aproveitam pé-direito elevado
Reconfigurações inteligentes
Alternativas criativas incluem:
Redefinição de funções dos compartimentos existentes
Aproveitamento de espaços técnicos como arrumos
Integração de instalações sanitárias em áreas subutilizadas
Optimização de circulações através de pequenos ajustes

Procedimentos legais e administrativos
Documentação necessária
Para proceder a demolições no âmbito da legalização:
Projeto de alterações assinado por técnico qualificado
Termo de responsabilidade sobre a segurança estrutural
Memória descritiva justificando as intervenções
Plantas comparativas antes e depois das alterações
Aprovação Municipal
As Câmaras Municipais devem aprovar:
Viabilidade técnica das demolições propostas
Conformidade com a Portaria 243/84
Impacto em edifícios contíguos
Adequação às condições mínimas de habitabilidade
Fiscalização e controlo
Durante a execução:
Acompanhamento técnico obrigatório
Vistoria intermédia em casos complexos
Documentação fotográfica do processo
Relatório final de conformidade
Casos práticos comuns
Habitação T2 com quartos pequenos
Situação: Dois quartos com 6 m² cada, separados por tabique
Solução: Demolição da parede divisória criando um quarto de 12 m²
Resultado: Conformidade com área mínima de 8 m² e criação de compartimento principal
Apartamento com cozinha diminuta
Situação: Cozinha de 3 m² sem ventilação adequada
Solução: Demolição parcial integrando com sala adjacente
Resultado: Criação de sala/cozinha funcional com área conforme
Moradia com corredores excessivos
Situação: Corredor de 0,7 m de largura ao longo de toda a habitação
Solução: Demolição seletiva de paredes laterais
Resultado: Alargamento para 0,9 m e integração de espaços
Conselhos práticos para Proprietários
Antes de decidir
Solicite vistoria técnica para avaliar viabilidade e segurança
Obtenha orçamentos detalhados incluindo todas as fases do trabalho
Verifique seguros de responsabilidade civil da equipa técnica
Confirme licenciamento necessário junto da Câmara Municipal
Durante o planeamento
Envolva técnicos qualificados desde o início do processo
Considere instalações existentes antes de planear demolições
Avalie impactos em vizinhos e tome medidas preventivas
Prepare espaços alternativos se a habitação estiver ocupada
Na execução
Acompanhe tecnicamente todas as fases da demolição
Documente alterações face ao projeto original
Mantenha comunicação com vizinhos sobre o processo
Preserve elementos que possam ser reutilizados
Custos e prazos estimados
Investimento típico
Os custos de demolições variam significativamente:
Demolições simples: 15-30 €/m² de parede
Demolições estruturais: 50-100 €/m² incluindo reforços
Gestão de entulhos: 20-40 €/m³ de material removido
Acabamentos: 100-300 €/m² conforme qualidade
Prazos de Execução
Projeto e licenciamento: 6-12 meses
Execução das demolições: 1-3 semanas
Acabamentos: 2-6 semanas
Vistoria final: 2-4 semanas
Para considerar
A demolição de paredes interiores no contexto da legalização de habitações representa um investimento fundamental na valorização e segurança do património imobiliário. A Portaria 243/84 não exige estas intervenções por mero formalismo legal, mas sim porque reconhece que muitas construções clandestinas criaram condições de habitabilidade inadequadas.
O processo de demolição deve ser sempre encarado de forma técnica e responsável, envolvendo profissionais qualificados desde a fase de planeamento até à execução. As poupanças a curto prazo que possam resultar de abordagens amadoras são rapidamente ultrapassadas pelos custos de correção de problemas estruturais ou de segurança.
A vistoria técnica obrigatória é um mecanismo de proteção tanto para o proprietário como para a comunidade, garantindo que as intervenções não comprometem a estabilidade do edifício ou de construções adjacentes. A avaliação cuidadosa das paredes a demolir evita surpresas desagradáveis e custos adicionais durante a execução.
Para proprietários que enfrentam esta necessidade, é essencial compreender que a demolição de paredes interiores pode ser a chave para transformar uma propriedade de valor limitado numa habitação legal, funcional e valorizada no mercado. O investimento inicial é compensado pela segurança jurídica, pela melhoria das condições de habitabilidade e pela valorização patrimonial a longo prazo.
A evolução do quadro legal português demonstra sensibilidade às especificidades do parque habitacional existente, oferecendo soluções práticas para a sua recuperação sem comprometer padrões mínimos de qualidade e segurança.
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Na AC-Arquitetos, possuímos experiência na aplicação da Portaria 243/84 e na gestão de processos de legalização que envolvem demolições interiores. A nossa equipa pode orientá-lo em todas as fases do processo, desde a vistoria técnica inicial até à obtenção da autorização de utilização final.
Asseguramos que todas as intervenções são tecnicamente fundamentadas, legalmente conformes e executadas com segurança. Transformamos desafios regulamentares em oportunidades de valorização do seu património. Contacte-nos para uma avaliação técnica.