Escadas e Corredores: O que tem de mudar e o que pode manter — Esclarecimentos práticos para as suas obras
- Ana Carolina Santos
- há 3 dias
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A questão das escadas e corredores é frequentemente um dos temas centrais em projetos de reabilitação, alteração ou legalização de edifícios em Portugal. Seja para quem está a pensar comprar casa, para quem quer intervir num imóvel antigo ou simplesmente melhorar o seu apartamento, importa saber quando é obrigatório adequar estas áreas às normas atuais e quando é possível manter as características originais, sem surpresas ou exigências inesperadas por parte do município.
Neste post, elaborado com base na legislação em vigor — nomeadamente o Regulamento Geral das Edificações Urbanas (RGEU), Regime Jurídico da Urbanização e Edificação (RJUE), e demais portarias específicas para edifícios existentes ou intervenções de legalização — procura-se clarificar, de forma acessível e pragmática, estas exigências.

1. O que dizem as regras gerais para escadas e corredores
O RGEU e legislação complementar definem as medidas mínimas para segurança e conforto dos utilizadores, devendo observar-se, em regra:
Largura mínima dos corredores: 1,2 metros para circulação principal em edifícios novos, admitindo-se troços reduzidos para situações pontuais (nunca inferiores a 0,9 metros, e apenas se não derem acesso a portas de compartimentos).
Largura mínima das escadas: Entre 1 a 1,2 metros, consoante a tipologia do edifício e número de fogos/pisos, com requisitos adicionais para edifícios coletivos.
Degraus das escadas: Devem ter construção segura, com patins intermédios em lanços longos, corrimãos de ambos os lados e dimensões de degraus dentro dos parâmetros definidos por lei.
Patamares: Devem permitir a manobra e utilização confortável dos utilizadores, especialmente nas entradas principais e nos acessos a fogos em edifícios multifamiliares.
Tolerâncias admitidas em Edifícios Existentes
Quando se trate de edifícios construídos antes da entrada em vigor de normas mais restritivas, admite-se, em certas situações, manutenção das dimensões originais caso não seja tecnicamente ou economicamente viável adaptar às medidas atuais.
O conceito de "edifício existente" é importante: em processos de legalização, mudanças de uso ou obras sem aumento de volume ou área, o município pode admitir soluções de compromisso, desde que asseguradas condições mínimas de segurança, salubridade e acessibilidade.
Exemplo prático:
Um apartamento num edifício dos anos 60 pode manter um corredor com 1 metro de largura se for fisicamente impossível alargar sem implicar demolição estrutural relevante e desde que não prejudique a evacuação de emergência.
2. Quando é obrigatório alterar escadas e corredores
Intervenção de reabilitação profunda: Se as obras alterarem substancialmente a estrutura, especialmente em edifícios abertos ao público ou multifamiliares, é obrigatório cumprir as normas atuais. Exemplos: criação de fogos autónomos; alteração de percursos principais de acesso.
Mudança de uso: Quando um edifício é convertido para nova utilização (por exemplo, comércio convertido em habitação ou vice-versa), passa a aplicar-se a regulamentação em vigor relativa à função atribuída, incluindo corredores e escadas.
Questões de segurança, estabilidade ou acessibilidade: Sempre que comprovadamente não estejam garantidas condições para circulação em segurança ou evacuação, é imperativo corrigir e adaptar às normas técnicas atuais, mesmo em contexto de pequena intervenção.
Exigências em escadas e corredores
Situação | Largura mínima do corredor | Largura mínima da escada | Exceções admissíveis |
Edifício novo (RGEU) | 1,2 m | 1,2 m | Não aplicável |
Edifício existente (legalização ou reabilitação) | 0,9 m (troços curtos) | 1 m (em certos casos) | Se não houver agravamento da situação e for tecnicamente viável |
Remodelação sem aumento de compartimentos | Mantém originais | Mantém originais | Obrigatório justificar tecnicamente a impossibilidade de adequação |
3. Quando se pode manter as dimensões originais
Obras de conservação ou remodelação leve: Se não houver alteração estrutural, nem aumento de número de fogos ou compartimentos, pode ser mantida a configuração existente, desde que os elementos apresentem boa condição e não prejudiquem o uso seguro.
Legalizações de imóveis antigos: É habitual a Câmara aceitar as medidas pré-existentes, especialmente em edifícios anteriores ao atual quadro legal, sobretudo se não houver agravamento das condições ou risco acrescido.
Pequenas alterações em fracções autónomas: Substituição de revestimentos, portas ou pequenas ampliações (sem impacto estrutural ou de circulação) não obriga normalmente à alteração de corredores ou escadas já existentes.

4. Acessibilidade e adaptações especiais
A legislação mais recente (Dec-Lei 163/2006) introduz critérios exigentes em matéria de acessibilidade para pessoas com mobilidade reduzida. Nos edifícios habitacionais com mais de quatro pisos, e sempre que se trate de construções novas, é obrigatório prever:
Larguras superiores nas circulações
Plataformas elevatórias ou ascensores
Corrimãos acessíveis
Compensações para edifícios existentes: Em muitos casos a adaptação é gradual ou pode ser justificada tecnicamente a sua impossibilidade, ficando registado no processo camarário. A decisão cabe ao município, que pode pedir parecer técnico ou justificar exceções por preservação do património e proteção do valor arquitetónico.
Exemplos práticos
Reabilitação de um prédio do século XIX sem espaço estrutural para instalar uma escada com 1,2 metros: pode ser autorizada a manutenção da largura pré-existente, desde que garantidas condições mínimas de circulação e evacuabilidade.
Alteração de moradia térrea: corredor com 0,93 m pode ser mantido se não houver aumento do número de quartos ou necessidade de acesso especial.
5. Pontos críticos a ter em atenção
A responsabilidade técnica do projeto e da obra é sempre dos profissionais habilitados, pelo que deve ser explicitamente fundamentada qualquer exceção às medidas regulamentares.
A decisão final é das Câmaras Municipais, que podem exigir pareceres adicionais ou a realização de vistoria técnica para comprovar a segurança e funcionalidade das soluções propostas.
A legislação municipal pode ser mais exigente do que o quadro legal nacional. Consulte sempre os regulamentos do seu concelho.
Assegure a documentação técnica adequada e memórias descritivas claras para evitar atrasos nos processos de licenciamento ou legalização.
Conselhos práticos
Certifique-se de que, no seu projeto de alteração ou reabilitação, todas as medidas de corredores e escadas estão explicitamente justificadas e desenhadas.
Em edifícios existentes, privilegie a preservação das características originais sempre que seja tecnicamente justificável, salvaguardando a segurança dos utilizadores.
Recorra a um/a arquiteto/a especializado/a em reabilitação e processos urbanos para lidar com requisitos legais, justificar exceções e negociar soluções com o município.
Guarde todos os pareceres, documentos de vistoria e comunicações oficiais — são essenciais, em caso de fiscalização posterior.
Para considerar
A questão das escadas e corredores é, muitas vezes, o que separa uma reabilitação bem-sucedida de um processo complicado e demorado. Saber exatamente quando é obrigatório adaptar e quando é possível manter as dimensões existentes permite valorizar o património edificado e otimizar recursos, sem sacrificar o conforto ou a segurança dos utilizadores.
Cada caso é um caso e, em Portugal, a aplicação das normas pode variar consoante o contexto, a data da construção e as orientações do município. Manter-se informado e fundamentar tecnicamente qualquer exceção é a chave para garantir o sucesso do seu projeto.
Na dúvida? Fale connosco!
Acompanhar estas matérias não é simples, mas é fundamental para a valorização do seu imóvel e para evitar custos e complicações inesperadas. O escritório AC-Arquitetos tem experiência em legalização de imóveis, legislação e acompanhamento de processos municipais. Agende uma reunião, exponha o seu caso ou envie-nos as suas dúvidas — ajudamos a tornar o seu projeto uma realidade clara e segura.
Nota: Sempre que necessitar de um parecer específico, consulte um/a arquiteto/a qualificado/a. Cada situação urbana é diferente e só um profissional poderá analisar tecnicamente o seu caso, equilibrando as exigências legais com as necessidades do seu imóvel.