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Portaria 243/84: Regime Especial de Acessibilidade para Edifícios Existentes

  • Foto do escritor: Ana Carolina Santos
    Ana Carolina Santos
  • 22 de ago.
  • 4 min de leitura

A legislação portuguesa sobre acessibilidade é um marco fundamental para garantir que todos os cidadãos tenham acesso digno aos espaços construídos. Entre os vários diplomas que regulam esta matéria, a Portaria n.º 243/84 assume uma posição singular ao estabelecer condições mínimas específicas para edifícios clandestinos e construções existentes que não cumprem os padrões atuais.


Remodelação da área da cozinha, área de estar e área de jantar de um T1 em Lisboa
Remodelação da área da cozinha, área de estar e área de jantar de um T1 em Lisboa

O contexto da Portaria 243/84


Esta portaria surge num momento crucial da história da construção portuguesa, quando era necessário encontrar soluções pragmáticas para regularizar milhares de construções que não cumpriam os requisitos do Regulamento Geral das Edificações Urbanas (RGEU). O diploma reconhece uma realidade incontornável: nem sempre é viável ou economicamente sustentável exigir o cumprimento integral das normas atuais em edifícios já construídos.



Os princípios fundamentais


A portaria baseia-se em três pilares essenciais:

  • Pragmatismo regulamentar - aceita tolerâncias específicas quando tecnicamente justificadas

  • Viabilidade económica - reconhece os custos desproporcionais de algumas intervenções

  • Segurança mínima - mantém padrões essenciais de habitabilidade e segurança



Condições mínimas de habitabilidade


Áreas dos compartimentos

A portaria estabelece tolerâncias específicas para as áreas mínimas dos compartimentos, diferenciando-se claramente das exigências para construções novas:

Habitações com menos de 5 compartimentos:

  • Um compartimento com área mínima de 10,5 m²

  • Restantes compartimentos: mínimo de 8 m²

Habitações com 5 ou mais compartimentos:

  • Pelo menos 2 compartimentos com 10,5 m²

  • Possibilidade de compartimentos reduzidos a 7 m² (com limitações específicas)


Cozinhas: Requisitos específicos

As cozinhas merecem atenção particular no diploma:

  • 5 m² para habitações com 4 ou mais compartimentos

  • 4 m² para habitações mais pequenas

  • Círculo inscritível com diâmetro mínimo de 1,8 m

  • Redução para 1,6 m em cozinhas inferiores a 5 m²


Pé-direito: Adaptação às realidades existentes

Um dos aspetos mais relevantes é a flexibilização do pé-direito:

  • Pé-direito livre mínimo: 2,35 m (comparativamente aos 2,40 m do RGEU)

  • Possibilidade de redução em sótãos e mansardas

  • Tolerâncias específicas para corredores e escadas


Ventilação e Iluminação: Mantendo a qualidade habitacional

Apesar das tolerâncias, a portaria não compromete os requisitos fundamentais de ventilação e iluminação natural. Os compartimentos habitáveis devem continuar a cumprir:

  • Comunicação direta com o exterior

  • Área mínima de vãos conforme estabelecido no RGEU

  • Ventilação transversal sempre que possível


Instalações Sanitárias: Padrões de salubridade

As instalações sanitárias mantêm exigências rigorosas:

  • Ventilação natural obrigatória

  • Área envidraçada mínima: 0,54 m²

  • Área de abertura: mínimo 0,36 m²

  • Exceções apenas para sistemas de ventilação forçada devidamente fundamentados



Implicações práticas para Proprietários


Vantagens da aplicação

A aplicação desta portaria oferece várias vantagens práticas:

  • Regularização simplificada de construções existentes

  • Redução de custos em intervenções de reabilitação

  • Aproveitamento do edificado existente sem demolições desnecessárias

  • Flexibilidade técnica para situações específicas


Limitações e cuidados

No entanto, é fundamental compreender que:

  • As tolerâncias aplicam-se apenas a edifícios clandestinos específicos

  • Não dispensam o cumprimento de normas de segurança

  • Requerem sempre parecer técnico especializado

  • Devem garantir condições mínimas de habitabilidade



Casos especiais: Caves e Sótãos


Caves habitáveis

A portaria permite a habitabilidade de caves em condições excecionais:

  • Uma parede completamente desafogada a partir de 0,15 m abaixo do pavimento

  • Compartimentos habitáveis contíguos à fachada desafogada

  • Proteção rigorosa contra humidade

  • Escoamento de esgotos por gravidade


Sótãos e Mansardas

Para aproveitamento inteligente destes espaços:

  • Pé-direito regulamentar em pelo menos metade da área

  • Mínimo de 2 metros em qualquer ponto a mais de 30 cm do perímetro

  • Isolamento térmico adequado

  • Cumprimento das normas de ventilação e iluminação



Integração com a Legislação atual


Articulação com o RGEU

A Portaria 243/84 funciona como um diploma complementar ao RGEU, oferecendo:

  • Alternativas viáveis para situações específicas

  • Critérios adaptativos para construções existentes

  • Metodologia clara para avaliação técnica

  • Base legal sólida para decisões municipais


Relação com Normas de Acessibilidade

Embora anterior ao Decreto-Lei n.º 163/2006 sobre acessibilidades, esta portaria estabelece princípios que se mantêm relevantes:

  • Adaptação gradual do edificado existente

  • Soluções proporcionais aos recursos disponíveis

  • Manutenção de padrões mínimos de qualidade

  • Flexibilidade na implementação de melhorias


Projeto de remodelação da área da cozinha, área de estar e área de jantar de um apartamento em Alfama
Projeto de remodelação da área da cozinha, área de estar e área de jantar de um apartamento em Alfama

Desafios contemporâneos


Reabilitação Urbana

No contexto atual da reabilitação urbana, a portaria oferece instrumentos valiosos:

  • Aproveitamento do edificado histórico e tradicional

  • Soluções economicamente viáveis para proprietários

  • Compatibilização entre preservação e modernização

  • Redução de demolições desnecessárias


Sustentabilidade e Economia Circular

A aplicação criteriosa desta portaria contribui para:

  • Redução do desperdício na construção

  • Aproveitamento de recursos existentes

  • Minimização do impacto ambiental

  • Promoção da sustentabilidade urbana



Procedimentos e aplicação prática


Avaliação Técnica

A aplicação da portaria requer sempre:

  • Vistoria técnica especializada

  • Análise das condições de segurança e habitabilidade

  • Avaliação da viabilidade de intervenções

  • Fundamentação técnica das soluções propostas


Documentação necessária

Os processos devem incluir:

  • Levantamento detalhado do estado existente

  • Proposta de intervenção fundamentada

  • Justificação técnica das tolerâncias aplicadas

  • Garantias de segurança e salubridade



Para considerar


A Portaria n.º 243/84 representa um exemplo notável de pragmatismo legislativo, oferecendo soluções equilibradas entre as exigências técnicas e a realidade económica e social. Este diploma demonstra que é possível manter padrões de qualidade habitacional enquanto se reconhece as limitações práticas de intervenção em edifícios existentes.

Para proprietários e técnicos, esta portaria constitui uma ferramenta valiosa na reabilitação e regularização do edificado, permitindo soluções criativas e economicamente sustentáveis sem comprometer a segurança e o conforto dos utilizadores.

A sua aplicação criteriosa contribui para um urbanismo mais inclusivo e sustentável, valorizando o património construído enquanto garante condições dignas de habitabilidade para todos.


Tem questões sobre a aplicação da Portaria 243/84 no seu projeto de reabilitação?

Na AC-Arquitetos, contamos com uma equipa especializada em regulamentação urbanística e reabilitação de edifícios existentes. Contacte-nos para uma consulta personalizada e descubra as melhores soluções para o seu projeto, garantindo o cumprimento legal com eficiência técnica e económica.

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