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O terreno perfeito com um senão invisível: Servidões e Restrições que bloqueiam projetos

  • Foto do escritor: Ana Carolina Santos
    Ana Carolina Santos
  • 1 de dez.
  • 3 min de leitura

Já aconteceu a muitos investidores: encontram o terreno ideal, com boa localização, área generosa e preço competitivo. Avançam para a escritura e, meses depois, ao submeterem o projeto de arquitetura à Câmara Municipal, recebem um indeferimento seco. A razão? O terreno está onerado com uma servidão ou restrição de utilidade pública que impede a construção. O sonho transformou-se num pesadelo jurídico. As servidões e restrições são as "cláusulas em letra pequena" dos terrenos. Não se veem no chão, mas existem no papel e têm força de lei. Desconhecê-las é um erro que pode custar caro.


Exemplo de Servidão de Passagem
Exemplo de Servidão de Passagem

O que são Servidões e Restrições?


Embora os termos sejam frequentemente usados de forma indistinta, têm significados jurídicos diferentes.

  • Servidões Administrativas: Encargos impostos sobre um imóvel em benefício de uma utilidade pública. Exemplos: faixas de servidão de linhas de alta tensão, gasodutos, aquedutos ou zonas de proteção de aeródromos. O Estado (ou entidade concessionária) tem o direito de usar ou limitar o uso dessa faixa de terreno, mesmo que o proprietário seja privado.

  • Restrições de Utilidade Pública: Limitações gerais ao uso do solo. Exemplos: Reserva Ecológica Nacional (REN), Reserva Agrícola Nacional (RAN), zonas de proteção de património classificado, margens de rios e albufeiras. Não beneficiam um prédio específico, mas protegem um interesse coletivo (ambiente, segurança, cultura).

  • Servidões Prediais (Privadas): São acordos entre particulares. Um prédio (serviente) fica onerado em benefício de outro (dominante). Exemplo clássico: servidão de passagem quando um terreno não tem acesso direto à via pública.



As Servidões mais comuns (e traiçoeiras)


Nem todas as servidões inviabilizam totalmente a construção, mas muitas condicionam severamente o projeto.

1. Domínio Público Hídrico: A legislação portuguesa (Lei da Água) proíbe construir em margens de rios, ribeiras e linhas de água. A faixa non aedificandi pode atingir 50 metros ou mais, conforme a dimensão do curso de água. Ignorar isto pode resultar em demolição coerciva da obra.

2. Redes de Energia e Gás: As linhas de alta e média tensão impõem faixas de servidão (entre 10 a 45 metros de largura, consoante a potência) onde é proibido construir edifícios. O mesmo se aplica a gasodutos de alta pressão.

3. Infraestruturas Rodoviárias e Ferroviárias: Construir perto de autoestradas, estradas nacionais ou linhas férreas exige recuos mínimos obrigatórios e pareceres das entidades gestoras (Infraestruturas de Portugal, por exemplo).

4. Património Cultural: Imóveis em zonas de proteção de monumentos classificados estão sujeitos a parecer vinculativo da Direção-Geral do Património Cultural (DGPC). A restrição pode impedir aumentos de cércea ou exigir materiais e tipologias específicas.



Como detetar Servidões antes de comprar?


A identificação destas limitações não é automática. Exige investigação.

1. Certidão Permanente do Registo Predial: Pode indicar algumas servidões (como as prediais privadas registadas), mas não é exaustiva. Muitas servidões administrativas não constam do registo.

2. Planta de Condicionantes do PDM: Todos os Planos Diretores Municipais têm uma planta específica de "Condicionantes" onde estão mapeadas as servidões e restrições conhecidas. Consultar esta planta na Câmara Municipal é obrigatório.

3. Portal SRUP (Servidões e Restrições de Utilidade Pública): A Direção-Geral do Território disponibiliza online informação georreferenciada sobre servidões em vigor. Permite cruzar a localização do terreno com camadas de informação sobre REN, RAN, redes elétricas, etc.

4. Pedido de Informação Prévia (PIP): É a ferramenta mais segura. Ao submeter um PIP na Câmara, as entidades externas (APA, EDP Distribuição, etc.) são consultadas e pronunciam-se sobre a viabilidade. Só assim se obtém certeza jurídica.



Para considerar


Comprar um terreno sem avaliar as suas servidões é como comprar um carro sem ver o motor. A viabilidade construtiva não depende apenas da área e do PDM; depende das camadas invisíveis de restrições legais que podem anular o valor do ativo. Um terreno barato onerado com servidões pesadas pode ser mais caro do que um terreno "limpo" ao dobro do preço.

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