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Os alicerces da Regulamentação Urbanística Portuguesa: Uma evolução centenária

  • Foto do escritor: Ana Carolina Santos
    Ana Carolina Santos
  • 14 de set.
  • 3 min de leitura

A legislação urbanística portuguesa revela uma evolução notável ao longo das décadas, consolidando princípios fundamentais que ainda hoje orientam o desenvolvimento territorial. Desde a Lei nº 2110/61 até aos instrumentos mais recentes, observamos uma progressiva sofisticação na abordagem à gestão do território.


Edifício de habitação após obras de reabilitação e remodelação
Edifício de habitação após obras de reabilitação e remodelação

A Lei das Estradas de 1961: O primeiro grande marco


A Lei nº 2110/61, que aprovou o Regulamento Geral das Estradas e Caminhos Municipais, estabeleceu princípios pioneiros de ordenamento territorial. Este diploma não se limitou a regular a infraestrutura rodoviária, criando um sistema integrado de:

  • Organização territorial estruturada através da divisão em cantões e esquadras

  • Responsabilização técnica com quadros especializados permanentes

  • Controlo urbanístico preventivo através de alinhamentos e recuos obrigatórios

  • Proteção do espaço público mediante servidões non aedificandi


"A moderna conceção de gestão territorial nasceu quando Portugal compreendeu que as infraestruturas não são apenas elementos funcionais, mas estruturadores do desenvolvimento urbano."

O RGEU: Consolidação dos padrões de qualidade


O Regulamento Geral das Edificações Urbanas (RGEU) de 1951 permanece como referência fundamental, estabelecendo:

Condições mínimas de habitabilidade:

  • Pé-direito mínimo de 2,40m em habitações

  • Áreas mínimas por tipologia habitacional

  • Requisitos de ventilação e iluminação natural

Princípios de salubridade urbana:

  • Distância mínima de 10 metros entre fachadas com vãos de habitação

  • Obrigatoriedade de logradouros com área mínima de 40m²

  • Proteção contra humidade e condições insalubres



A evolução para a modernidade: RJUE e Acessibilidades


O Regime Jurídico da Urbanização e Edificação (RJUE) introduziu uma abordagem procedimental inovadora, distinguindo entre:

  • Licenciamento para operações de maior complexidade

  • Comunicação prévia para intervenções em áreas consolidadas

  • Isenção de controlo para obras de escassa relevância

Paralelamente, o Decreto-Lei nº 163/2006 revolucionou a perspetiva de acessibilidade, estabelecendo normas técnicas obrigatórias para garantir a mobilidade universal nos edifícios e espaços públicos.



A sistematização conceptual contemporânea


O Decreto Regulamentar nº 5/2019 representa o culminar desta evolução, sistematizando 73 conceitos técnicos fundamentais que harmonizam a aplicação dos instrumentos de gestão territorial.

Principais inovações conceptuais:

  • Definição rigorosa de indicadores urbanísticos (índices de ocupação e utilização)

  • Clarificação de parâmetros de edificabilidade

  • Normalização da simbologia gráfica dos planos



Evolução dos padrões mínimos

Parâmetro

Lei 2110/61

RGEU 1951

RJUE 1999

Atualidade

Recuo mínimo

5m/4m (estradas/caminhos)

Variável

Definido em plano

Flexível

Pé-direito habitação

-

2,40m

2,40m

2,40m

Logradouros

-

40m² mínimos

Mantido

Integrado na EEM

Acessibilidades

-

-

Genérico

Normas técnicas específicas


Desafios atuais e perspetivas


A Portaria nº 243/84 demonstrou a necessidade de flexibilização em contextos especiais, estabelecendo condições mínimas para legalização de construções clandestinas. Este precedente influenciou a atual abordagem da reabilitação urbana.


Edifício de habitação após obras de reabilitação e remodelação, visto do interior
Edifício de habitação após obras de reabilitação e remodelação, visto do interior

Tendências emergentes


  • Sustentabilidade ambiental como critério transversal

  • Densificação controlada em áreas urbanas consolidadas

  • Flexibilidade procedimental adaptada à complexidade das intervenções

  • Digitalização dos processos urbanísticos



Para refletir


A análise desta evolução legislativa revela que os princípios urbanísticos não são construções abstratas, mas instrumentos vivos que se adaptam às necessidades sociais. A atual tendência de simplificação procedimental não representa abandono do controlo público, mas sim uma reconfiguração mais eficiente da intervenção administrativa.


A questão central permanece: como conciliar a necessária agilidade dos processos com a garantia de qualidade urbana? A resposta parece residir na consolidação de padrões técnicos claros, na responsabilização profissional e na eficiente fiscalização posterior.



Para uma análise detalhada da aplicação destes princípios ao seu projeto específico, recomendamos a consulta de arquitecto. A complexidade atual da legislação exige conhecimento técnico aprofundado para otimizar as soluções projectuais.

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