top of page

Acessibilidade em edifícios antigos: Obrigações legais e soluções práticas

  • Foto do escritor: Ana Carolina Santos
    Ana Carolina Santos
  • 1 de set.
  • 5 min de leitura

A adaptação de edifícios antigos para pessoas com mobilidade condicionada é uma questão central no panorama da construção e reabilitação urbana em Portugal. Entre as tradicionais preocupações com a preservação do património construído e as exigências modernas de inclusão, encontra-se um território complexo de normas, tolerâncias e soluções criativas que importa conhecer.


Edifício após obras de reabilitação e remodelação em Lisboa
Edifício após obras de reabilitação e remodelação em Lisboa

O contexto legal da Acessibilidade


Desde 2006, com a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 163/2006, Portugal estabeleceu um regime abrangente de acessibilidade que se aplica tanto a edifícios novos como existentes. Este diploma define as condições de acessibilidade para espaços públicos, equipamentos coletivos e edifícios habitacionais, estabelecendo prazos específicos para a adaptação de construções existentes.



"A promoção da acessibilidade constitui um elemento fundamental na qualidade de vida das pessoas, sendo um meio imprescindível para o exercício dos direitos conferidos a qualquer membro de uma sociedade democrática."


Edifícios Existentes: Prazos e obrigações


O regime legal distingue claramente entre edifícios conforme a sua data de construção:

  • Edifícios anteriores a 22 de agosto de 1997: prazo de 10 anos para adaptação (já expirado)

  • Edifícios posteriores a 22 de agosto de 1997: prazo de 5 anos para adaptação (já expirado)

  • Edifícios em conformidade com o DL 123/97: isentos das novas normas



As condições mínimas de habitabilidade


A Portaria n.º 243/84: Um diploma histórico

A Portaria n.º 243/84 continua a ser fundamental para compreender as tolerâncias aplicáveis a edifícios clandestinos ou com características especiais. Este diploma estabelece condições mínimas que, embora específicas para um contexto particular, oferecem insights valiosos sobre a flexibilidade possível na aplicação de normas.


Dimensões mínimas dos compartimentos

As tolerâncias estabelecidas incluem:

  • Compartimentos habitacionais: área mínima de 8 m²

  • Habitações com menos de 5 compartimentos: pelo menos um compartimento com 10,5 m²

  • Habitações com 5 ou mais compartimentos: pelo menos 2 compartimentos com 10,5 m²

  • Cozinha exclusiva: área mínima de 5 m² (reduzível a 4 m² em casos específicos)


Especificações técnicas relevantes

  • Pé-direito mínimo: 2,35 m (uma redução significativa face ao padrão habitual)

  • Largura de corredores: mínimo de 0,9 m

  • Largura de escadas: mínimo de 1 m (quando não situadas entre paredes)



Normas técnicas de Acessibilidade


Percursos Acessíveis

Um edifício deve dispor de pelo menos um percurso acessível que garanta:

  • Ligação entre a via pública e a entrada principal

  • Acesso a todos os espaços relevantes do edifício

  • Largura mínima de 1,2 m para patamares e corredores

  • Possibilidade de troços com 0,9 m se extensão inferior a 1,5 m



Rampas e Degraus


Especificações para Rampas

  • Inclinação máxima: 6% para vencer 0,6 m de desnível

  • Inclinação alternativa: 8% para vencer 0,4 m de desnível

  • Largura mínima: 1,2 m (reduzível a 0,9 m em casos específicos)

  • Plataformas de descanso: obrigatórias conforme a extensão


Escadas Acessíveis

  • Largura mínima: 1,2 m

  • Altura do espelho: máximo 0,18 m

  • Profundidade do cobertor: mínimo 0,28 m

  • Corrimãos: obrigatórios quando desnível superior a 0,4 m


Ascensores

  • Dimensões da cabina: mínimo 1,1 m × 1,4 m

  • Largura da porta: mínimo 0,8 m

  • Precisão de paragem: ±0,02 m

  • Comandos: entre 0,9 m e 1,3 m de altura



Instalações Sanitárias Acessíveis


Requisitos mínimos

  • Sanitas: altura do assento a 0,45 m

  • Barras de apoio: com especificações rigorosas de localização

  • Espaço de manobra: zona para rotação de 360°

  • Lavatórios: altura de 0,8 m com espaço livre por baixo


Espaços obrigatórios

  • Cabina mínima para uso frequente: 1,6 m × 1,7 m

  • Cabina para uso muito frequente: 2,2 m × 2,2 m

  • Equipamento de alarme: ligado ao exterior



Estratégias de adaptação para edifícios antigos


Análise Prévia

Antes de qualquer intervenção, é essencial:

  • Avaliação técnica completa do edifício existente

  • Identificação dos pontos críticos de acessibilidade

  • Análise de viabilidade económica das adaptações

  • Consulta de regulamentação específica aplicável


Soluções de Mobilidade Vertical

  • Plataformas elevatórias: adequadas para desníveis pequenos

  • Ascensores hidráulicos: solução para espaços reduzidos

  • Rampas interiores: quando o espaço e inclinação o permitam

  • Cadeiras elevatórias: para escadas existentes


Adaptações de Percursos

  • Alargamento pontual de corredores

  • Eliminação de degraus isolados

  • Melhoria de pavimentos (eliminação de ressaltos)

  • Instalação de corrimãos adequados



Exceções e Flexibilidades


Casos de exceção reconhecidos

O regime legal prevê exceções quando as obras necessárias sejam:

  • Desproporcionalmente difíceis

  • Economicamente inviáveis

  • Prejudiciais ao património cultural


Processo de exceção

  • Fundamentação técnica obrigatória

  • Aprovação pela entidade competente

  • Justificação pública nos casos aplicáveis

  • Cumprimento das restantes especificações possíveis



Responsabilidades e Fiscalização


Agentes Responsáveis

  • Câmaras municipais: licenciamento e fiscalização

  • Técnicos qualificados: projeto e execução

  • Proprietários: manutenção e conservação

  • Entidades públicas: quando aplicável


Regime Sancionatório

  • Coimas: entre 250€ e 44.892€ conforme o tipo de infrator

  • Sanções acessórias: incluindo suspensão de atividades

  • Responsabilidade civil: pelos danos causados

  • Direito de ação popular: por organizações representativas


Edifício de habitação convertido em hotel após obras de reabilitação, remodelação e adaptação ao nível das acessibilidades
Edifício de habitação convertido em hotel após obras de reabilitação, remodelação e adaptação ao nível das acessibilidades

Conselhos práticos para Proprietários


Antes de iniciar

  • Consulte técnicos especializados em acessibilidade

  • Obtenha informação prévia junto da Câmara Municipal

  • Analise o enquadramento do seu edifício nas normas

  • Explore possibilidades de financiamento ou incentivos


Durante o Projeto

  • Articule com profissionais qualificados

  • Considere soluções integradas que respeitem o edifício

  • Avalie o impacto global das intervenções

  • Documente adequadamente todas as opções


Após a Execução

  • Mantenha registos atualizados das adaptações

  • Assegure manutenção regular dos equipamentos

  • Monitore a eficácia das soluções implementadas



Exemplos de adaptações bem-sucedidas


Edifícios Residenciais

  • Instalação de plataforma elevatória em escada principal

  • Criação de rampa em acesso secundário

  • Adaptação de instalação sanitária no piso térreo

  • Melhoria da sinalização e iluminação


Edifícios Públicos

  • Ascensor exterior em edifícios históricos

  • Rampas integradas no arranjo paisagístico

  • Balcões ajustáveis em espaços de atendimento

  • Sistemas de orientação táctil


Espaços Comerciais

  • Acesso alternativo quando entrada principal impossível

  • Equipamentos de auto-atendimento adaptados

  • Sanitários acessíveis em pontos estratégicos

  • Sinalização adequada em todo o percurso



Para considerar


A adaptação de edifícios antigos para pessoas com mobilidade condicionada não é apenas uma obrigação legal, mas um investimento na qualidade de vida e na valorização do património construído. O sucesso destas intervenções depende de um equilíbrio cuidadoso entre o respeito pelas características originais dos edifícios e a implementação de soluções inovadoras e inclusivas.

O conhecimento aprofundado da legislação, combinado com a experiência técnica adequada, permite encontrar soluções que não comprometem a integridade arquitectónica dos edifícios antigos, ao mesmo tempo que garantem condições de acessibilidade dignas e funcionais.

A responsabilidade de criar espaços verdadeiramente inclusivos é partilhada entre todos os intervenientes no processo construtivo, desde os decisores políticos aos técnicos, passando pelos proprietários e utilizadores. Só através desta abordagem colaborativa será possível construir um ambiente urbano que responda às necessidades de todos os cidadãos.

bottom of page