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Impacto económico da Propriedade Horizontal na valorização de imóveis

  • Foto do escritor: Ana Carolina Santos
    Ana Carolina Santos
  • 3 de dez.
  • 5 min de leitura

A propriedade horizontal é um instrumento jurídico que viabiliza a divisão de um edifício em frações autónomas, permitindo que cada proprietário detenha a sua unidade com total independência, partilhando apenas as áreas e despesas comuns. Embora seja uma prática consolidada no mercado imobiliário português, muitas pessoas desconhecem o impacto económico significativo que esta divisão exerce sobre a valorização dos imóveis.


A constituição em propriedade horizontal potencia a valorização pela divisão estratégica e pela flexibilidade de comercialização que proporciona.

Edifício de habitação e comércio no Príncipe Real após passagem de "Propriedade Plena" para "Propriedade Horizontal"
Edifício de habitação e comércio no Príncipe Real após passagem de "Propriedade Plena" para "Propriedade Horizontal"

O que é Propriedade Horizontal?


De acordo com o Código Civil português, a propriedade horizontal autoriza que as frações de um edifício, quando constituem unidades independentes, pertençam a proprietários diversos. Cada fração autónoma possui características particulares: é distinta das demais, isolada e com saída própria para uma área comum do prédio ou para a via pública.​

Esta divisão transforma um edifício único num conjunto de unidades imobiliárias independentes do ponto de vista legal e fiscal. Um prédio que seria comercializado como um todo, sujeito a um único proprietário, passa a permitir múltiplas transações independentes, cada uma com o seu próprio valor de mercado.



Valorização através da divisão


O principal mecanismo de valorização reside precisamente na possibilidade de comercializar frações em separado. Um edifício constituído em propriedade horizontal apresenta um potencial de rendimento significativamente superior ao mesmo imóvel sob propriedade vertical.​

Considere-se um cenário prático: um prédio com quatro apartamentos. Se mantivesse regime de propriedade vertical, permaneceria como um único ativo imobiliário. Sob propriedade horizontal, a mesma construção transforma-se em quatro unidades comercializáveis de forma independente. Esta fragmentação aumenta:

  • O número potencial de transações — cada fração pode ser vendida, arrendada ou alugada individualmente

  • A flexibilidade de gestão — cada proprietário decide sobre a sua unidade sem depender de terceiros

  • A liquidez do ativo — as frações têm maior circulação no mercado imobiliário do que propriedades inteiras



Permilagem e Valorização Relativa


A permilagem de cada fração — expressa em milésimos — representa a proporção de propriedade de cada unidade face ao valor total do edifício. Esta fórmula não é meramente administrativa; é o fundamento de toda a dinâmica económica da propriedade horizontal.​

A permilagem é determinada considerando múltiplos fatores:

  • Área útil da fração

  • Localização dentro do edifício (andares superiores valorizam-se diferentemente)

  • Exposição solar

  • Número de divisões

  • Qualidade dos acabamentos

Dois apartamentos com áreas similares podem ter permilagens distintas por apresentarem características diferenciadoras. Uma fração no terceiro andar com exposição nascente terá permilagem diferente da mesma dimensão no primeiro andar com exposição poente. Este reconhecimento legal de valoração diferenciada permite que o mercado imobiliário funcione com maior eficiência, compensando a qualidade através da sofisticação de valores.



Impacto nas despesas de condomínio


A constituição em propriedade horizontal, porém, introduz uma dimensão económica frequentemente subestimada: as despesas de condomínio. Estas despesas — conservação de estruturas comuns, manutenção de elevadores, limpeza de escadas, seguros — são distribuídas proporcionalmente à permilagem de cada fração.​

Este modelo representa, simultaneamente, um custo permanente e uma garantia de manutenção do valor do imóvel. Um edifício bem conservado mantém e valoriza-se; um edifício negligenciado deprecia-se rapidamente. A estrutura de responsabilização coletiva que a propriedade horizontal estabelece funciona como proteção do investimento de cada proprietário.

Contudo, é essencial que os potenciais adquirentes de frações autónomas compreendam estas obrigações. Desde 2022, a legislação portuguesa obriga à emissão de uma declaração de encargos do condomínio em caso de transmissão da propriedade, especificando natureza, montantes e prazos das despesas. Esta transparência reduz significativamente os riscos de surpresas financeiras pós-aquisição.​



O Mercado de Frações: Dinâmicas de negócio


A fragmentação do imóvel em frações autónomas cria oportunidades de rentabilização versáteis. Um proprietário pode:

  • Vender a fração e obter liquidez total

  • Arrendá-la para habitação

  • Convertê-la em alojamento local (cumprindo requisitos legais específicos)

  • Utilizá-la como residência permanente

  • Deixá-la como investimento para valorização futura

Esta multiplicidade de usos, associada à capacidade de múltiplos atores transacionarem simultaneamente o mesmo edifício, torna a propriedade horizontal um instrumento de otimização económica. Permite que capital se dirija para as frações mais valorizadas, incentivando melhorias de manutenção e acabamentos.


Riscos e considerações críticas

Apesar das vantagens, a propriedade horizontal apresenta complexidades que não devem ser ignoradas. A responsabilidade compartilhada pelas partes comuns pode gerar conflitos, especialmente quando proprietários têm diferentes perspetivas sobre investimento em manutenção. Um proprietário que rentabiliza a fração através de alojamento local pode não estar interessado em investimentos de melhoria do edifício que não tragam retorno direto.

Existe também o risco de desvalorização quando o edifício não é bem administrado ou quando há acumulação significativa de dívidas de condomínio. Frações em edifícios com gestão deficiente depreciam-se mais rapidamente, independentemente das suas características individuais.


Impacto Fiscal e Registal

A constituição em propriedade horizontal tem reflexos fiscais relevantes. Cada fração é registada separadamente no registo predial, permitindo tributação independente do Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI). Para o investidor, isto significa maior transparência fiscal, mas também maior complexidade administrativa.​

A transmissão de frações sujeita-se a Imposto sobre a Transmissão Onerosa de Imóveis (IMT) e Imposto do Selo, cujos montantes são calculados sobre o valor individual de cada fração. A fragmentação pode, em certos contextos, ter implicações fiscal-positivas, particularmente quando as frações apresentam valores inferiores aos limiares de isenção aplicáveis.


Estudo de Valoração prático

Considere um edifício hipotético com quatro frações equivalentes. Se constituído em propriedade horizontal, o mercado tenderá a precificar cada unidade considerando não apenas as características físicas, mas também factores de localização comparativa (andar, orientação) e potencial de rentabilização. Estudos de mercado demonstram que a mesma construção, sob propriedade horizontal, pode gerar valores agregados 15 a 25% superiores aos que obteria sob regime vertical, devido à maior liquidez e segmentação de mercado.​

Este acréscimo de valor não surge do nada: representa a sofisticação que o mercado atribui à flexibilidade de gestão, à liquidez e à possibilidade de múltiplas estratégias de investimento.


Edifício de habitação e comércio no Cacém após passagem de "Propriedade Plena" para "Propriedade Horizontal"
Edifício de habitação e comércio no Cacém após passagem de "Propriedade Plena" para "Propriedade Horizontal"

Em poucas palavras


A propriedade horizontal não é apenas um mecanismo administrativo-legal; é um instrumento de engenharia económica que fundamentalmente altera o valor potencial de um imóvel. Através da divisão estratégica em frações autónomas, pela atribuição diferenciada de permilagens segundo características qualitativas, e pela facilitação de múltiplas modalidades de exploração, a propriedade horizontal amplia significativamente as possibilidades de valorização. Contudo, esta oportunidade vem acompanhada de responsabilidades: cada proprietário beneficia da liquidez e flexibilidade, mas participa também dos custos de manutenção de estruturas comuns e está sujeito a constrangimentos estabelecidos coletivamente. O investidor que compreende esta dinâmica — a dualidade de direitos e responsabilidades — está melhor posicionado para tomar decisões de investimento fundamentadas.

A valorização através de propriedade horizontal é real, mas depende de gestão prudente, infraestruturas bem mantidas e marcos legais claros. Recomenda-se que qualquer interessado em adquirir, dividir ou constituir um imóvel em propriedade horizontal consulte profissionais especializados — arquitetos, advogados e gestores imobiliários — para assegurar que a estratégia de divisão e valorização se alinha com os objetivos específicos do investimento.

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