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Direitos de quem vive em casas anteriores a 1951

  • Foto do escritor: Ana Carolina Santos
    Ana Carolina Santos
  • há 5 dias
  • 4 min de leitura

A data de 7 de agosto de 1951 representa um marco fundamental na história da construção em Portugal. Foi neste dia que entrou em vigor o Regulamento Geral das Edificações Urbanas (RGEU), através do Decreto-Lei n.º 38.382, estabelecendo pela primeira vez um quadro legal abrangente para o licenciamento de obras. Antes desta data, as construções eram realizadas ao abrigo do "direito anterior", sem necessidade de licenças municipais ou autorizações de utilização.

Esta distinção temporal criou duas categorias distintas de imóveis em Portugal: os construídos antes de 1951, que beneficiam de proteções legais especiais, e os posteriores, sujeitos às exigências completas do RGEU.

O princípio fundamental é simples: quem vive numa casa construída antes de 1951 possui direitos adquiridos que a legislação moderna não pode retroativamente eliminar.


Interior de uma casa construída antes de 1951
Interior de uma casa construída antes de 1951

Que proteções oferece a lei


1. Dispensa de licenciamento original

As habitações construídas antes de 7 de agosto de 1951 não necessitaram de alvará de construção nem de autorização de utilização na altura da sua edificação. Esta dispensa mantém-se válida, sendo reconhecida oficialmente através de certidões emitidas pelas Câmaras Municipais.


2. Aplicação do artigo 60.º do RJUE

O atual Regime Jurídico da Urbanização e Edificação consagra o "princípio da proteção do existente" no seu artigo 60.º. Este diploma estabelece que:

  • As edificações construídas ao abrigo do direito anterior não são afetadas por normas legais supervenientes

  • As utilizações existentes mantêm-se protegidas, mesmo que não cumpram regulamentos atuais

  • Obras de conservação e reparação podem ser realizadas sem alteração do estatuto legal do imóvel


3. Tolerâncias na legalização

Quando necessário proceder à legalização de construções anteriores a 1951, a Portaria n.º 243/84 estabelece condições mínimas de habitabilidade mais flexíveis que o RGEU. Estas tolerâncias incluem:

  • Compartimentos com área mínima de 8 m² (em vez dos padrões atuais mais exigentes)

  • Pé-direito reduzido até 2,35 m

  • Cozinhas com apenas 4 m² em habitações pequenas

  • Corredores com largura mínima de 0,9 m



Vantagens práticas para os Proprietários


Facilidade nas transações imobiliárias

Proprietários de imóveis anteriores a 1951 beneficiam de procedimentos simplificados na compra e venda. A certidão de construção anterior a 1951 substitui muitas vezes a necessidade de licença de habitação, agilizando as escrituras.


Redução de custos de legalização

Quando necessário regularizar aspetos construtivos, as tolerâncias da Portaria 243/84 evitam investimentos avultados que seriam necessários para cumprir integralmente o RGEU atual. Isto traduz-se em:

  • Menor necessidade de alterações estruturais

  • Dispensa de alguns requisitos técnicos modernos

  • Possibilidade de manter características arquitetónicas originais


Proteção contra demolições

O estatuto de "direito anterior" oferece proteção contra ordens de demolição baseadas em incumprimento de normas posteriores a 1951. Apenas questões graves de segurança estrutural ou salubridade podem justificar intervenções coercivas.



Como comprovar e exercer estes direitos


Obtenção da Certidão de Construção anterior a 1951

Para formalizar os direitos de proteção legal, é essencial obter uma certidão oficial junto da Câmara Municipal. O processo requer:

  • Certidão Predial atualizada

  • Registo matricial do imóvel

  • Fotografias da propriedade

  • Planta de localização à escala adequada

  • Documentos comprovativos da propriedade


Documentação complementar

Além da certidão principal, recomenda-se manter:

  • Registos fotográficos que comprovem a antiguidade da construção

  • Testemunhos ou documentos históricos sobre a edificação

  • Plantas ou desenhos antigos, quando disponíveis


Cuidados a ter com alterações

Embora protegidas pelo direito anterior, estas habitações perdem as proteções especiais se forem objeto de:

  • Reconstrução total

  • Ampliações significativas

  • Alterações que modifiquem substancialmente a estrutura original

  • Mudanças de uso incompatíveis com a tipologia original


Exterior de uma casa construída antes de 1951
Exterior de uma casa construída antes de 1951

Situações especiais e limitações


Intervenções permitidas sem perda de direitos

As seguintes obras mantêm o estatuto de proteção legal:

  • Reparações de conservação

  • Substituição de materiais de revestimento

  • Melhoramentos nas instalações (canalização, eletricidade)

  • Pequenas alterações interiores que não afetem a estrutura


Quando a proteção não se aplica

Existem circunstâncias em que o direito anterior não oferece proteção:

  • Imóveis em zonas de proteção de monumentos nacionais

  • Construções que apresentem riscos graves de segurança

  • Situações de ruína comprovada por vistoria técnica

  • Edificações que violem servidões ou restrições de utilidade pública


Responsabilidades dos Proprietários

Mesmo beneficiando de proteções especiais, os proprietários devem:

  • Manter as habitações em condições mínimas de salubridade

  • Assegurar que não constituem perigo para terceiros

  • Cumprir obrigações fiscais e administrativas correntes

  • Respeitar regulamentos de segurança contra incêndios quando aplicável



Conselhos práticos para Proprietários


Antes de comprar

  • Solicite sempre a certidão de construção anterior a 1951

  • Verifique se existem processos de legalização pendentes

  • Confirme que não foram realizadas alterações posteriores sem licenciamento

  • Analise o estado de conservação e necessidades de intervenção


Para obras de melhoria

  • Mantenha sempre a estrutura e volumetria originais

  • Privilegie materiais e técnicas tradicionais compatíveis

  • Documente fotograficamente o estado anterior às intervenções

  • Consulte técnicos especializados em património construído


Em situações de litígio

  • Preserve toda a documentação histórica disponível

  • Obtenha pareceres técnicos sobre a antiguidade da construção

  • Recorra ao apoio de advogados especializados em direito urbanístico

  • Mantenha registos das comunicações com entidades oficiais



Para considerar


A legislação portuguesa reconhece e protege de forma sólida os direitos de quem vive em habitações construídas antes de 1951. Esta proteção não é apenas um reconhecimento histórico, mas uma garantia prática que facilita a manutenção, transação e usufruto destes imóveis.

O "direito anterior" representa um equilíbrio inteligente entre a preservação do património edificado e as exigências modernas de habitabilidade. Permite que milhares de habitações continuem a cumprir a sua função social sem os custos proibitivos de uma atualização integral às normas contemporâneas.

Para os proprietários, conhecer e exercer adequadamente estes direitos pode significar a diferença entre um investimento viável e um encargo insustentável. A chave está em compreender os limites da proteção legal e atuar sempre dentro dos parâmetros que a mantêm válida.

Num contexto de crescente valorização do património histórico e de pressão sobre o mercado habitacional, estas proteções ganham relevância acrescida. Representam não apenas direitos individuais, mas também uma ferramenta coletiva de preservação da identidade arquitetónica portuguesa.


Tem dúvidas sobre os direitos da sua propriedade histórica?


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