Áreas Urbanas de Génese Ilegal: O desafio da Reconversão Urbanística em Portugal
- Ana Carolina Santos

- 30 de set.
- 3 min de leitura
As Áreas Urbanas de Génese Ilegal (AUGI) representam um dos fenómenos urbanísticos mais complexos e desafiantes da realidade portuguesa. Estas zonas, caracterizadas por construções erguidas sem os necessários licenciamentos municipais, constituem uma herança urbana que exige soluções inovadoras e adaptadas para a sua integração no tecido urbano legal.

O que são as AUGI
As AUGI são definidas pela legislação portuguesa como prédios ou conjuntos de prédios contíguos que foram objeto de operações físicas de parcelamento destinadas à construção sem a competente licença de loteamento. Esta definição abrange especificamente áreas:
Parceladas até 31 de dezembro de 1984 (data da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 400/84)
Classificadas como espaço urbano ou urbanizável nos planos municipais de ordenamento do território
Parceladas antes de 29 de novembro de 1965 quando predominantemente ocupadas por construções não licenciadas
Características distintivas
"As AUGI constituem um reflexo direto do crescimento urbano descontrolado que marcou décadas de desenvolvimento territorial português."
As características fundamentais das AUGI incluem:
Ausência de licenciamento no momento da construção original
Ocupação consolidada através de habitações e infraestruturas
Integração em zonas urbanas ou urbanizáveis segundo os planos territoriais vigentes
Necessidade de regularização através de processos específicos de reconversão
Processo de Reconversão Urbanística
Modalidades de Reconversão
A reconversão das AUGI pode seguir duas modalidades principais:
1. Operação de Loteamento por Iniciativa Privada
Promovida pelos proprietários ou comproprietários
Coordenada através da administração conjunta
Sujeita aos procedimentos normais de licenciamento
2. Plano de Pormenor por Iniciativa Municipal
Desenvolvido pela Câmara Municipal
Aplicável quando não existe apoio da administração conjunta
Permite maior controlo público do processo
Obrigações dos Proprietários
Os proprietários integrados em AUGI assumem responsabilidades específicas:
Dever de reconversão urbanística do solo
Conformação com o alvará de loteamento ou plano de pormenor
Comparticipação nas despesas de reconversão
Legalização das construções após entrada em vigor do instrumento de reconversão
Administração conjunta
Órgãos de Gestão
A administração conjunta das AUGI estrutura-se através de:
Assembleia de Proprietários
Todos os proprietários com direito inscrito no registo predial
Competência deliberativa sobre questões fundamentais
Aprovação de orçamentos e contas
Comissão de Administração
Formada por 3 a 7 membros eleitos pela assembleia
Inclui presidente e tesoureiro obrigatoriamente
Mandato de gestão executiva do processo
Competências da Comissão
A comissão de administração desempenha funções cruciais:
Tramitação do processo de reconversão em representação dos proprietários
Elaboração de projetos e acompanhamento técnico
Cobrança de comparticipações dos proprietários
Celebração de contratos para execução de obras de urbanização
Representação em juízo nas ações emergentes da AUGI
Desafios e soluções
Principais obstáculos
O processo de reconversão enfrenta várias dificuldades:
Técnicas
Adaptação às normas urbanísticas atuais
Integração de infraestruturas básicas
Resolução de questões de propriedade
Financeiras
Elevados custos de urbanização
Dificuldades de comparticipação pelos proprietários
Necessidade de cauções e garantias
Administrativas
Coordenação entre múltiplos proprietários
Articulação com serviços municipais
Cumprimento de prazos legais
Instrumentos de apoio
Para ultrapassar estes desafios, a legislação prevê:
Flexibilização de parâmetros urbanísticos quando necessário
Compensações por áreas cedidas ao município
Possibilidade de execução municipal em caso de incumprimento
Apoio técnico das Câmaras Municipais
Evolução Legislativa
Alterações recentes
A legislação das AUGI tem sofrido várias atualizações:
Lei n.º 70/2015: Permitiu a reconversão por iniciativa municipal sem administração conjunta
Lei n.º 71/2021: Prorrogou prazos para constituição de comissões
Alterações processuais para facilitar a regularização
Perspetivas futuras
O regime das AUGI continua em evolução, procurando:
Simplificar procedimentos administrativos
Reduzir custos de reconversão
Acelerar processos de legalização
Melhorar coordenação institucional

Impacto Territorial
Distribuição geográfica
As AUGI concentram-se principalmente:
Área Metropolitana de Lisboa (maior densidade)
Região Norte (casos significativos)
Zonas periurbanas em crescimento
Benefícios da Reconversão
A regularização das AUGI proporciona:
Segurança jurídica aos proprietários
Melhoria das condições habitacionais
Integração urbana adequada
Valorização imobiliária das propriedades
Conselhos práticos
Para Proprietários em AUGI
Participação ativa
Integrar a assembleia de proprietários
Acompanhar o processo de reconversão
Cumprir as obrigações financeiras
Assessoria técnica
Procurar apoio de profissionais qualificados
Compreender as implicações legais
Avaliar custos e benefícios
Para Técnicos e Autarquias
Planeamento estratégico
Identificar AUGI prioritárias
Desenvolver estratégias de reconversão
Coordenar recursos disponíveis
Apoio aos Proprietários
Fornecer informação clara
Facilitar procedimentos
Promover soluções colaborativas
Para considerar
As AUGI representam simultaneamente um desafio e uma oportunidade para o ordenamento territorial português. O sucesso da sua reconversão depende da articulação eficaz entre a administração pública, os proprietários e os técnicos especializados. Apenas através de um trabalho coordenado será possível transformar estas áreas de génese ilegal em espaços urbanos integrados e funcionais.
A complexidade destes processos exige um acompanhamento técnico especializado e um conhecimento aprofundado da legislação aplicável. Para proprietários que se encontrem nestas situações, é fundamental procurar o apoio de profissionais experientes que possam orientar adequadamente o processo de reconversão.



