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Reabilitar o indesejável: Segurança e salubridade em construções clandestinas

  • Foto do escritor: Ana Carolina Santos
    Ana Carolina Santos
  • há 18 horas
  • 3 min de leitura

A Portaria n.º 243/84 (17 de Abril) veio criar um conjunto de regras excepcionais para a legalização de edifícios clandestinos, definindo um “kit mínimo” de segurança e de salubridade que qualquer construção informal deve cumprir antes de poder ser regularizada. Se herdou, comprou ou vive numa casa erguida fora dos trâmites normais, estas são as obrigações que deve conhecer.


Remodelação e reabilitação de apartamento em Lisboa com cozinha, sala de jantar e sala de estar em open space
Remodelação e reabilitação de apartamento em Lisboa com cozinha, sala de jantar e sala de estar em open space

Porque é que a Portaria existe?


  • O Decreto-Lei n.º 804/76 revogou a legislação anterior e deixou milhares de casas sem enquadramento regulamentar.

  • Demolir em massa seria social e financeiramente insustentável; alterar tudo para o RGEU (Regulamento Geral das Edificações Urbanas) seria utópico.

  • A solução foi fixar tolerâncias estritas — mais brandas do que o RGEU, mas suficientes para tornar as habitações seguras, salubres e minimamente dignas.



O que é obrigatório garantir?


Vistoria técnica prévia

Antes de qualquer licença, a Câmara Municipal ordena uma vistoria que avalia:

  • Segurança estrutural do edifício e das construções contíguas.

  • Condições de habitabilidade segundo os parâmetros da Portaria.


Dimensões mínimas dos compartimentos

Compartimento

Área mínima

Observações

Quartos, salas, etc.

8 m²

excepto tolerâncias abaixo

Cozinha

5 m²

pode descer a 4 m² se a casa tiver < 4 compartimentos

Pelo menos 1 compartimento

10,5 m²

obrigatório em fogos até 4 compartimentos

Pelo menos 2 compartimentos

10,5 m²

obrigatório em fogos ≥ 5 compartimentos

Compartimentos “pequenos” extra

7 m²

1 mini-quarto em fogos > 4 compart., 2 em fogos > 6


Proporções e alturas

  • Forma: nenhum compartimento pode ter comprimento superior ao dobro da largura.

  • Inscrição de círculo: deve caber um círculo de 1,8 m (ou 1,6 m em cozinhas < 5 m²).

  • Pé-direito livre: mínimo de 2,35 m. Em sótãos utilizados como habitação, é aceitável que apenas metade da área cumpra esta altura.


Circulações

  • Corredores: largura ≥ 0,9 m.

  • Escadas coletivas (≥ 2 pisos ou ≥ 4 fogos): lanços de 1 m (desde que não fiquem entre paredes); patins com largura igual à escada; degraus L ≥ 0,22 m e H ≤ 0,193 m.

  • Patins intermédios: não mais estreitos do que os lanços.


Instalações sanitárias

  • Aceita-se apenas uma casa de banho completa em habitações com mais de 4 compartimentos.



Outras exigências incontornáveis


  1. Demolição de paredes interiores– Sempre que seja a única forma de cumprir as áreas mínimas ou melhorar a salubridade.

  2. Acesso independente e redes públicas– A casa só pode ser legalizada se tiver porta de entrada autónoma e possibilidade de ligação directa a água, esgotos e electricidade.

  3. Segurança estrutural– A vistoria pode reprovar o edifício se houver risco de colapso; nestes casos, a legalização é recusada até haver obras de consolidação.

  4. Compatibilidade urbanística– Mesmo com todas as tolerâncias, o edifício não pode ferir gravemente a estética, o ordenamento ou servidões técnicas (zonas de protecção, servidões non aedificandi, etc.).


Remodelação e reabilitação de um apartamento em Lisboa, visto do quarto de casal
Remodelação e reabilitação de um apartamento em Lisboa, visto do quarto de casal

Obrigações práticas do proprietário


  1. Solicitar vistoria junto da Câmara Municipal.

  2. Apresentar projecto de adaptação, se a vistoria o exigir.

  3. Executar obras para cumprir as condições mínimas (áreas, pé-direito, escadas, redes).

  4. Emitir termo de responsabilidade dos técnicos que acompanham a obra.

  5. Pagar taxas de legalização estabelecidas em regulamento municipal.

Falhar qualquer uma destas etapas pode levar a notificações, contra-ordenações e, em última instância, demolição.



Conselhos para quem pretende regularizar


  • Faça levantamentos rigorosos antes de contratar projecto: poupa revisões e atrasos.

  • Negocie tolerâncias apenas nas matérias previstas; fora dessas, aplica-se o RGEU sem descontos.

  • Integre obras de eficiência energética (janelas, isolamento) — não são obrigatórias, mas valorizam o imóvel e simplificam licenciamentos futuros.

  • Documente tudo: fotografias, facturas, relatórios de obra; a transparência evita impugnações.

  • Planeie o orçamento com margem: obras em edifícios antigos revelam sempre surpresas.



Para considerar


A Portaria n.º 243/84 não é um convite à mediocridade, mas sim um plano-ponte entre o clandestino e o legal. Cumprir estas regras significa garantir que o seu imóvel deixa de ser um risco e passa a ser um activo valorizável, seja para habitar, arrendar ou vender. Legalizar hoje é poupar amanhã — em multas, responsabilidade civil e noites mal dormidas.


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