Moradias irregulares: Um pesadelo ou uma oportunidade?
- Ana Carolina Santos

- há 4 dias
- 3 min de leitura
O sonho da casa própria em Portugal esbarra frequentemente numa realidade dura: milhares de imóveis têm "esqueletos no armário". Seja uma marquise fechada sem licença, um anexo transformado em T1 ou uma piscina que não consta nas plantas da Câmara, as irregularidades são mais comuns do que se imagina. Com o recente "Simplex Urbanístico", a venda de casas sem licença de utilização tornou-se possível, abrindo a porta a negócios mais rápidos, mas também a riscos muito maiores para quem compra. Será que vale a pena investir numa casa ilegal? E se já tem uma, como resolver o problema antes que a fiscalização bata à porta?

O perigo de comprar "gato por lebre"
Até há pouco tempo, a licença de utilização era o "bilhete de identidade" obrigatório para vender uma casa. Hoje, a lei permite a escritura sem este documento. Parece prático, mas transfere todo o ónus da legalização para o comprador.
Ao adquirir um imóvel irregular, está a comprar também:
O risco de demolição: Se a obra ilegal violar regras fundamentais (como estar em Reserva Ecológica ou invadir o domínio público), a Câmara pode ordenar a demolição, sem direito a indemnização.
Desvalorização imediata: Um imóvel ilegal vale menos. A incerteza jurídica afasta investidores e dificulta a revenda futura.
Pesadelo no Crédito: A maioria dos bancos recusa financiar a compra de imóveis que não estejam totalmente legalizados, pois o bem dado como garantia (a casa) não corresponde à realidade registada.
Tenho uma obra ilegal: E agora?
Se já é proprietário de um imóvel com obras não licenciadas, a estratégia do "deixa andar" é perigosa. As coimas podem chegar a milhares de euros e os processos de embargo são uma dor de cabeça real. A boa notícia é que a maioria das situações tem solução, embora exija rigor técnico. O processo de legalização segue, por norma, estes passos:
Levantamento rigoroso: É preciso desenhar a casa tal como ela existe hoje. Um arquiteto fará o levantamento dimensional e verificará se o que está construído cumpre as regras do PDM (Plano Diretor Municipal).
Instrução do Processo: O projeto de legalização (arquitetura e especialidades, se necessário) é submetido à Câmara Municipal como se fosse uma obra nova, mas com a indicação de que se trata de uma regularização.
Pagamento de Taxas: Uma vez aprovado, terá de pagar as taxas urbanísticas. Note que, em alguns municípios, as taxas para legalizar obras clandestinas podem ser agravadas face a uma obra nova.

Soluções inteligentes para problemas antigos
Nem tudo exige um processo complexo. O novo quadro legal trouxe algumas simplificações importantes:
Isenção de Controlo Prévio: Pequenas obras, como a construção de muros baixos ou telheiros simples, podem estar isentas de licença, bastando por vezes uma comunicação prévia ou nem isso, dependendo do município.
Legalização parcial: Em certos casos, pode ser possível legalizar apenas a parte da casa que cumpre as regras e demolir ou adaptar apenas as infrações (por exemplo, retirar a cobertura de um anexo ilegal mantendo as paredes como muro).
Para refletir
A legalização não é apenas burocracia; é a vacina que protege o valor do seu património. Uma casa legalizada é um ativo líquido, seguro e transacionável. Uma casa ilegal é um problema à espera de acontecer.
Num mercado onde a facilidade de venda sem licença aumentou, a responsabilidade de verificar a legalidade caiu inteiramente sobre os ombros dos proprietários e compradores. A ignorância da lei não serve de desculpa nem evita a demolição.



