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Legalização de edificações em Zonas Habitacionais: Condicionantes e procedimentos técnicos

  • Foto do escritor: Ana Carolina Santos
    Ana Carolina Santos
  • 26 de set.
  • 4 min de leitura

A legalização de construções clandestinas em Portugal representa um dos desafios mais complexos no panorama urbanístico nacional. Através da análise detalhada da Portaria n.º 243/84, é possível compreender o quadro normativo específico que regula este processo delicado, estabelecendo um equilíbrio entre a necessidade de regularizar situações consolidadas e a manutenção de padrões mínimos de habitabilidade.


Moradia clandestina no Seixal após as obras de reabilitação, remodelação e processo de legalização aprovado
Moradia clandestina no Seixal após as obras de reabilitação, remodelação e processo de legalização aprovado

Contexto Normativo da Legalização


Fundamentos Legais

O processo de legalização de construções clandestinas surge da necessidade prática de contemporizar com situações consolidadas, evitando as pesadas implicações económicas e sociais de demolições em larga escala. A Portaria n.º 243/84 estabelece que estas construções, embora não cumpram integralmente o RGEU (Regulamento Geral das Edificações Urbanas), podem ser alvo de regularização mediante o cumprimento de condições mínimas específicas.


Tolerâncias Técnicas admissíveis

O diploma introduz tolerâncias específicas face aos requisitos do RGEU, reconhecendo que a maioria das construções clandestinas dificilmente se enquadra nos padrões técnicos regulares. Estas tolerâncias incluem:

  • Áreas mínimas reduzidas: Os compartimentos podem ter área inferior aos 8m², exceto em casos específicos

  • Pé-direito flexível: Possibilidade de redução até 2,35m em edificações destinadas a habitação

  • Dimensionamento de escadas: Admite-se largura de lanços de escada reduzida a 1m em edifícios coletivos



Condicionantes Técnicas para Legalização


Requisitos mínimos de Habitabilidade

Para proceder à legalização das edificações, devem cumprir-se aspectos fundamentais estabelecidos no Portaria n.º 243/84:

  • Realização de vistoria técnica para análise das condições de segurança e habitabilidade

  • Garantia de acesso independente ao edifício

  • Possibilidade de ligação direta às redes gerais de infraestruturas


Especificações dimensionais

A portaria estabelece critérios dimensionais específicos para diferentes tipologias habitacionais:

Para habitações com menos de 5 compartimentos:

  • Um compartimento, no mínimo, deve ter área ≥ 10,5m²

  • Cozinha com área mínima de 5m² (reduzível a 4m² em casos específicos)

Para habitações com 5 ou mais compartimentos:

  • Pelo menos 2 compartimentos com 10,5m² de área

  • Possibilidade de 1 ou 2 compartimentos com área reduzida a 7m²



A legalização representa uma solução pragmática que concilia a realidade urbana existente com a necessidade de garantir condições mínimas de habitabilidade.


Procedimentos e Responsabilidades


Processo de Avaliação

O procedimento de legalização exige análise técnica rigorosa das condições existentes. Deve proceder-se à avaliação das edificações contíguas, assegurando que a regularização não compromete a segurança do conjunto urbano.


Intervenções necessárias

O processo pode implicar obras de adaptação, nomeadamente:

  • Demolição de paredes interiores quando exigida para a legalização

  • Adequação de sistemas de ventilação e iluminação

  • Melhoramento das condições de acessibilidade


Limitações de Aplicação

As disposições da portaria aplicam-se exclusivamente a edifícios com:

  • Acesso independente garantido

  • Possibilidade real de ligação às redes de infraestruturas

  • Condições técnicas que permitam a reconversão viável



Articulação com outras normativas


Conformidade com o RGEU

A legalização deve respeitar os princípios fundamentais do RGEU, particularmente no que se refere a:

  • Condições de salubridade das edificações

  • Requisitos de segurança estrutural

  • Disposições sobre iluminação e ventilação natural


Acessibilidade e Inclusão

A integração com normas de acessibilidade assume crescente importância, especialmente em intervenções de reabilitação urbana. O Decreto-Lei n.º 163/2006 estabelece condições específicas para garantir a mobilidade condicionada em edificações existentes.


Moradia clandestina no Seixal antes das obras de reabilitação, remodelação e processo de legalização aprovado
Moradia clandestina no Seixal antes das obras de reabilitação, remodelação e processo de legalização aprovado

Desafios e Considerações Práticas


Viabilidade Económica

A análise da viabilidade económica constitui fator determinante no processo de legalização. Devem considerar-se:

  • Custos das obras de adequação necessárias

  • Benefícios da regularização face aos riscos de demolição

  • Impacto na valorização do património edificado


Sustentabilidade urbana

A legalização deve contribuir para a coerência urbana, evitando a perpetuação de soluções que comprometam o desenvolvimento territorial equilibrado. É essencial considerar:

  • Capacidade das infraestruturas existentes

  • Impacto no sistema de mobilidade local

  • Integração paisagística e arquitetónica


Exemplos práticos de aplicação

Caso 1: Moradia unifamiliar: Uma moradia com compartimentos de 7,5m² pode ser legalizada desde que:

  • Mantenha pelo menos um compartimento com 10,5m²

  • Garanta pé-direito mínimo de 2,35m

  • Assegure ligação às redes de infraestruturas

Caso 2: Edifício coletivo: Um prédio com 4 habitações servidas pela mesma escada pode manter:

  • Lanços de escada com 1m de largura (desde que não situados entre paredes)

  • Patins com largura não inferior aos lanços

  • Uma única casa de banho completa por habitação com mais de 4 compartimentos



Para refletir


A legalização de edificações em zonas habitacionais representa um equilíbrio delicado entre a necessidade de regularizar o território construído e a manutenção de padrões de qualidade urbana. Este processo exige análise técnica especializada e visão integrada do desenvolvimento urbano, considerando não apenas as condicionantes imediatas, mas também os impactos a longo prazo na sustentabilidade das comunidades.

A intervenção em construções existentes deve sempre privilegiar soluções que melhorem as condições de habitabilidade sem comprometer a segurança ou a funcionalidade urbana. É fundamental que os proprietários compreendam que a legalização não é apenas um processo administrativo, mas uma oportunidade de valorizar o seu património e contribuir para a qualidade do ambiente construído.


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