Prazos na Fiscalização de Obras: O que precisa de saber
- Ana Carolina Santos

- 14 de out.
- 7 min de leitura
A fiscalização urbanística é uma dimensão essencial de qualquer processo de construção ou intervenção em edifícios em Portugal. Conhecer os prazos associados à fiscalização municipal não é apenas uma questão burocrática — é fundamental para garantir que o seu projeto avança sem surpresas, dentro da legalidade e com total segurança. Neste post, vamos explorar de forma clara e objetiva os prazos de fiscalização estabelecidos pela legislação portuguesa, com destaque para o Regime Jurídico da Urbanização e Edificação (RJUE).

O que é a Fiscalização Urbanística?
A fiscalização de obras é uma competência atribuída às Câmaras Municipais para garantir que todas as operações urbanísticas — sejam elas licenciadas, sujeitas a comunicação prévia ou até isentas de controlo prévio — cumprem as normas legais e regulamentares em vigor.
Importante: Todas as obras estão sujeitas a fiscalização, independentemente de terem ou não licença municipal. A isenção de controlo prévio não afasta a necessidade de cumprir as normas jurídicas aplicáveis.
A fiscalização destina-se a assegurar a conformidade das operações com as disposições legais, prevenindo riscos para a saúde e segurança das pessoas, mas incide exclusivamente sobre o cumprimento de normas jurídicas — não sobre aspetos de oportunidade ou opções técnicas dos projetos.
Competência e responsabilidade pela Fiscalização:
Quem fiscaliza?
De acordo com o RJUE, a fiscalização compete ao Presidente da Câmara Municipal, com possibilidade de delegação em vereadores. No exercício desta atividade, o presidente é auxiliado por:
Fiscais municipais com formação adequada
Empresas privadas habilitadas para fiscalização de obras (mediante contratação pela Câmara)
Autoridades administrativas e policiais (mediante solicitação)
Inspeções e Vistorias
Os fiscais municipais ou trabalhadores de empresas privadas podem realizar inspeções aos locais onde se desenvolvam atividades sujeitas a fiscalização, sem dependência de prévia notificação. Contudo, existem limites importantes:
Para operações em curso: A falta de consentimento ocorre quando é vedado o acesso ao local. Neste caso, é necessária a obtenção de mandado judicial para entrada no domicílio.
Para operações concluídas: A falta de consentimento decorre de o proprietário não facultar o acesso quando regularmente notificado. Também aqui é exigido mandado judicial.
A entrada e permanência no domicílio devem respeitar o princípio da proporcionalidade, ocorrer pelo tempo estritamente necessário à inspeção e incidir apenas sobre o local onde se realizaram as operações.
Prazos fundamentais na Fiscalização
1. Prazo para realização de Vistorias
Quando determinada pelo Presidente da Câmara Municipal, a vistoria realiza-se no prazo de 15 dias a contar da decisão, decorrendo sempre que possível em data a acordar com o requerente.
A vistoria é efetuada por uma comissão composta, no mínimo, por três técnicos designados pela Câmara, dos quais pelo menos dois devem ter habilitação legal para ser autor de projeto correspondente à obra objeto de vistoria.
Importante para obras concluídas: No caso de comunicação prévia para utilização de edifício, o Presidente da Câmara pode determinar a realização de vistoria no prazo de 20 dias após a submissão da comunicação, quando existam indícios sérios de que o edifício não é idóneo para o fim pretendido.
2. Prazo de Fiscalização sucessiva
Uma inovação relevante introduzida pelo regime atual é a limitação temporal do dever de fiscalização. O dever de fiscalização caduca 10 anos após a data de emissão do título da comunicação prévia. Esta disposição traz maior segurança jurídica aos proprietários, evitando a perpetuação indefinida da possibilidade de fiscalização.
3. Prazos para Embargo de Obras
O embargo é uma medida de tutela da legalidade urbana que pode ser aplicada quando as obras estejam a ser executadas:
Sem a necessária licença ou comunicação prévia
Em desconformidade com o projeto ou condições do licenciamento
Em violação das normas legais e regulamentares aplicáveis
O auto de embargo deve ser notificado no prazo de 5 dias úteis às pessoas identificadas e disponibilizado no sistema informático municipal.
O embargo tem natureza provisória e destina-se a acautelar a utilidade das medidas definitivas de reintegração da legalidade, incluindo a possibilidade de licenciamento da obra.
4. Prazos para comunicação de infrações
As entidades fiscalizadoras têm o dever de participar infrações às entidades competentes. A legitimidade para denúncia está aberta a qualquer pessoa, mas não são admitidas denúncias anónimas.
Os funcionários e agentes da Administração Pública que deixem de participar infrações ou prestem informações falsas incorrem em responsabilidade disciplinar.
5. Prazos para medidas de tutela da Legalidade
Quando sejam detetadas situações de ilegalidade, a Câmara Municipal deve adotar medidas adequadas de tutela da legalidade urbana, que podem incluir:
Embargo de obras
Determinação de trabalhos de correção ou alteração
Legalização das operações
Demolição total ou parcial
Para legalização voluntária: Quando se verifique a realização de operações ilegais, a Câmara notifica os interessados para legalização, fixando um prazo para o efeito.
Para obras de correção determinadas: Caso o proprietário não inicie, não apresente elementos ou não conclua as obras determinadas nos prazos fixados, a Câmara pode tomar posse administrativa do imóvel para execução imediata.
Particularidades dos Prazos de execução de obras
Embora não sejam estritamente prazos de fiscalização, os prazos de execução têm impacto direto na atividade fiscalizadora:
Início das Obras
Até 5 dias antes do início dos trabalhos, o promotor deve informar a Câmara Municipal dessa intenção, comunicando também a identidade da pessoa encarregada da execução.
Prazos de Conclusão
As obras devem ser concluídas no prazo fixado na licença ou comunicação prévia, contado a partir da data de emissão da licença ou do pagamento das taxas.
A caducidade da licença ou comunicação prévia pode ocorrer se:
As obras não forem iniciadas no prazo de 12 meses
As obras estiverem suspensas por período superior a 6 meses
As obras estiverem abandonadas por período superior a 6 meses
As obras não forem concluídas no prazo fixado
A prorrogação do prazo de execução deixou de estar limitada, devendo o pedido ser fundamentado pelo requerente.
Conservação de Edifícios e Prazos de Beneficiação
Um aspeto frequentemente esquecido mas relevante para a fiscalização municipal prende-se com a obrigação de conservação dos edifícios.
As edificações devem ser reparadas e beneficiadas pelo menos uma vez em cada período de 8 anos, com o fim de remediar as deficiências provenientes do seu uso normal. Independentemente destas obras periódicas, as Câmaras podem, a qualquer momento, determinar a execução de obras necessárias para corrigir más condições de salubridade, solidez ou segurança, precedendo vistoria.
Quando seja determinada a execução de obras de conservação ou demolição, a deliberação deve ser notificada ao proprietário no prazo de 3 dias a contar da aprovação da respetiva ata.
Fiscalização e comunicação entre Entidades
A Câmara Municipal tem a obrigação de comunicar às entidades administrativas competentes para licenciamento de estabelecimentos (comerciais, escolares, de saúde, turismo) as situações de incumprimento das normas técnicas de acessibilidade.
Esta comunicação obrigatória garante uma fiscalização integrada e evita que estabelecimentos não conformes obtenham licenças de funcionamento.
Prazos de Licenciamento e Comunicação Prévia: Contexto relevante
Para compreender melhor os prazos de fiscalização, é útil conhecer os prazos aplicáveis aos procedimentos de controlo prévio:
Licenciamento:
120 dias úteis: obras em imóveis com área bruta ≤ 300 m²
150 dias úteis: obras em imóveis entre 300 m² e 2.200 m² ou imóveis classificados
200 dias úteis: obras em imóveis > 2.200 m², obras de urbanização ou operações de loteamento
Comunicação Prévia:
Verificação da instrução: 15 dias (saneamento liminar)
Rejeição da comunicação: 20 dias (ou 60 dias quando haja necessidade de consulta a entidades externas)
Início das obras: imediatamente após pagamento das taxas, desde que corretamente instruída

Regime transitório e situações especiais
Edifícios Clandestinos
Para edifícios clandestinos suscetíveis de reabilitação, a Portaria n.º 243/84 estabelece condições mínimas de habitabilidade com tolerâncias face ao RGEU, permitindo:
Compartimentos com área mínima de 8 m² (em vez de valores superiores do RGEU)
Pé-direito livre mínimo de 2,35 m (em vez de 2,40 m ou superiores)
Largura de corredores não inferior a 0,9 m
Largura de lances de escada reduzida a 1 m em edifícios coletivos
Estas tolerâncias aplicam-se apenas a edifícios com acesso independente e possibilidade de ligação direta às redes gerais de infraestruturas.
Obras em Edifícios Existentes
A realização de obras de alteração ou reconstrução em edificações existentes pode beneficiar do princípio da proteção do existente, não se aplicando disposições legais supervenientes, desde que não se trate de obras de ampliação e não agravem a desconformidade com as normas em vigor.
Consequências do incumprimento dos Prazos
Responsabilidade Contraordenacional
A violação das normas do RJUE constitui contraordenação, sujeita a coimas entre €250 e €3.740,98 para pessoas singulares, e entre €500 e €44.891,81 para pessoas coletivas.
Em caso de negligência, os montantes máximos são reduzidos a metade.
Sancões Acessórias
Para além das coimas, podem ser aplicadas sanções acessórias:
Privação do direito a subsídios públicos
Interdição de exercício de atividade (até 4 anos)
Encerramento de estabelecimento
Suspenção de autorizações, licenças e alvarás
Responsabilidade Criminal
O desrespeito dos atos administrativos que determinem medidas de tutela da legalidade (como embargo ou demolição) constitui crime de desobediência.
As falsas declarações prestadas em termos de responsabilidade ou no livro de obra integram o crime de falsificação de documentos.
Conselhos práticos
Para garantir que o seu projeto decorre sem percalços no que toca à fiscalização municipal, tenha em atenção:
1. Comunique o início das obras: Cumpra o prazo de comunicação até 5 dias antes do início dos trabalhos.
2. Mantenha a documentação em obra: Devem estar disponíveis no local os projetos, termos de responsabilidade, licença/comunicação prévia e livro de obra.
3. Respeite os prazos de execução: Evite suspensões ou abandonos prolongados que possam levar à caducidade.
4. Solicite prorrogações atempadamente: Se prevê que não conseguirá concluir a obra no prazo, requeira prorrogação fundamentada.
5. Colabore com as inspeções: Facilite o acesso dos fiscais municipais ao local da obra, dentro dos limites legais.
6. Consulte técnicos especializados: Arquitetos e engenheiros conhecem bem os procedimentos e prazos, orientando-o adequadamente ao longo de todo o processo.
Para considerar
Os prazos de fiscalização não são meros números numa lei — são mecanismos que estruturam a relação entre o proprietário, o construtor e a administração pública. O seu cumprimento garante não apenas a legalidade do processo construtivo, mas também a segurança, salubridade e qualidade do ambiente urbano que partilhamos.
Num contexto em que a legislação urbanística tem vindo a evoluir no sentido da simplificação e da celeridade — como demonstram as recentes alterações ao RJUE —, é fundamental que todos os intervenientes no processo construtivo conheçam os seus direitos e deveres, em particular os prazos aplicáveis em cada fase.
Lembre-se: a fiscalização não é um obstáculo ao seu projeto, mas antes uma salvaguarda do interesse coletivo e da qualidade urbana. Conhecer os prazos e procedimentos é dar um passo importante para um projeto bem-sucedido, legal e sem sobressaltos.
Se está a planear uma obra ou intervenção num edifício, não hesite em procurar aconselhamento profissional. Uma consulta atempada pode poupar-lhe tempo, custos e dissabores.
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