O papel do Requerente nos processos camarários: Responsabilidades e direitos
- Ana Carolina Santos

- 25 de nov.
- 6 min de leitura
Quando alguém pretende realizar uma obra de construção, ampliar uma habitação ou subdivir um terreno, precisa de compreender que não é apenas uma questão de apresentar pedidos à Câmara Municipal. O requerente – seja como proprietário, investidor ou interessado – desempenha um papel central e ativo em todo o procedimento administrativo. Compreender este papel, as suas obrigações e direitos, é essencial para evitar atrasos, custos desnecessários e complicações legais.
Quem é o Requerente nos processos camarários?
No contexto dos processos de urbanização e edificação, o requerente é a pessoa singular ou coletiva que se dirigem à Câmara Municipal para solicitar licença, apresentar comunicação prévia ou pedir informação prévia sobre uma operação urbanística. Esta figura pode ser o proprietário do imóvel, um promotor imobiliário, uma empresa de construção ou qualquer pessoa que detenha direitos legais sobre o terreno ou edifício em questão.
O requerente é muito mais do que quem submete um formulário: é responsável pela qualidade, conformidade e veracidade de tudo o que apresenta.
Obrigações fundamentais do Requerente
1. Identificação correta e completa
O requerente deve fornecer informação clara sobre quem é. Isto inclui:
Nome completo e número de identificação (NIF ou equivalente)
Domicílio ou sede social
Indicação da qualidade de titular de direito que lhe confere a faculdade de realizar a operação urbanstica (proprietário, usufrutuário, superficiário, ou outro direito real)
Esta informação não é meramente burocrática. A Câmara Municipal precisa verificar que o requerente tem legitimidade legal para realizar a obra. Sem isto, todo o processo pode ser invalidado posteriormente.
2. Apresentação de documentação completa e adequada
Um dos maiores obstáculos nos processos camarários é a apresentação incompleta de documentação. O requerente é responsável por:
Fornecer todos os elementos instrutórios exigidos em portaria
Apresentar projetos assinados por técnicos legalmente habilitados
Juntar termos de responsabilidade dos autores dos projetos, que declarem conformidade com normas legais e regulamentares
Indicar claramente o tipo de operação urbanística, a sua localização e o pedido ou objeto pretendido
O não cumprimento destas exigências resulta em notificação para correção ou completação num prazo de 15 dias. Findo este prazo sem resposta adequada, a Câmara pode rejeitar liminarmente o pedido.
3. Responsabilidade pela conformidade com a Lei
Uma obrigação que muitas vezes não é bem compreendida é a responsabilidade do requerente pela observância de todas as normas legais e regulamentares aplicáveis. Isto significa que:
O projeto deve estar conforme com planos municipais ou intermunicipais de ordenamento do território
Deve respeitar servidões administrativas e restrições de utilidade pública
Deve cumprir normas técnicas de construção em vigor
Deve estar em conformidade com a licença de loteamento, se aplicável
Se o projeto vier a revelar-se contrário à lei após aprovação, a responsabilidade não é apenas da Câmara. O requerente, particularmente através dos técnicos autores dos projetos, também responde por esta conformidade.
4. Pagamento de Taxas Urbansticas
O requerente é obrigado a pagar as taxas fixadas pela Câmara Municipal. Isto ocorre de forma específica:
Em caso de deferimento expresso, antes da emissão do alvará
Em caso de deferimento tácito (quando a Câmara não se pronuncia dentro do prazo legal, considera-se aprovado), o pagamento deve ser feito de forma online através de documento eletrónico
As taxas devem ser pagas por autoliquidação antes do início da obra
O não pagamento das taxas pode resultar em consequências graves, incluindo a não utilização do edifício ou fração.
5. Substituição de Intervenientes
Se durante o processo houver alterações na pessoa ou qualidade do requerente, autor de projeto, diretor de obra ou outros responsáveis técnicos, o requerente deve comunicar estas mudanças ao gestor de procedimento no prazo de 15 dias. O incumprimento desta obrigação é uma contra-ordenação.
Direitos do Requerente
Não é tudo obrigações. O requerente também tem direitos importantes que lhe permitem participar ativamente no processo.
1. Direito à Informação Rápida
O requerente tem o direito de receber informação sobre as entidades externas que devem ser consultadas (como autoridades ambientais, patrimoniais, de telecomunicações, etc.). A Câmara Municipal deve fornecer isto num prazo de 15 dias após apresentação do pedido inicial.
2. Direito à Informação Prévia
Antes mesmo de apresentar um pedido de licenciamento, qualquer interessado pode requerer informação prévia à Câmara sobre:
A viabilidade de realizar determinada operação urbanística
Os condicionamentos legais ou regulamentares aplicáveis
Requisitos sobre infraestruturas, servidões, restrições de utilidade pública
Índices urbanísticos, cérceas, afastamentos
Esta informação prévia é vinculante para a Câmara em futuras decisões, desde que os pressupostos se mantenham válidos por dois anos.
3. Direito de Audiência Prévia
Se a Câmara Municipal for proferir uma decisão de indeferimento, o requerente tem direito a ser ouvido previamente. Nesta audiência, pode alegar factos, argumentar e até se comprometer a realizar obras corretivas que permitam contornar os obstáculos inicialmente identificados.
4. Direito de Consulta Prévia
O requerente pode, por iniciativa própria, solicitar e obter pareceres de entidades externas antes de submeter o pedido à Câmara. Se estes pareceres tiverem menos de dois anos e não houver alterações aos pressupostos de facto ou de direito, a Câmara não pode exigir novas consultas. Isto acelera significativamente o processo.
5. Direito de execução por fases
Para operações mais complexas ou de grande dimensão, o requerente pode solicitar a realização faseada das obras. Cada fase deve ter coerência interna e corresponder a uma zona que possa funcionar autonomamente. O licenciamento abrange a primeira fase, sendo as subsequentes objeto de aditamento.
6. Proteção contra pedidos de documentação excessivos
A lei estabelece expressamente o que a Câmara não pode solicitar como elementos instrutórios:
Cópias de documentos na posse da Câmara (como Certidões Permanentes ou títulos)
Declarações de capacidade profissional dos técnicos responsáveis
Cópias de documentos pessoais (cartão do cidadão, bilhete de identidade)
Reenvio de documentos que tenham expirado na validade após apresentação do pedido
Esta proteção visa evitar exigências burocráticas desnecessárias e acelerar o processo.
Prazos e Deferimento Tácito
Um conceito essencial que beneficia o requerente é o deferimento tácito. Isto significa:
Para obras com até 300 m² de área bruta: a Câmara tem 120 dias para decidir
Para obras entre 300 e 2200 m²: 150 dias
Para obras superiores a 2200 m² ou operações de loteamento: 200 dias
Se a Câmara não se pronunciar dentro deste prazo, considera-se que o pedido foi automaticamente deferido. O requerente fica autorizado a prosseguir com a obra. Esta regra é uma proteção importante contra a inércia administrativa. Mas exige que o requerente confirme a data de apresentação do pedido e acompanhe os prazos rigorosamente.
Responsabilidades durante a execução da obra
O papel do requerente não termina com a aprovação do projeto. Durante a execução da obra, o requerente (agora na qualidade de titular da licença) tem responsabilidades específicas:
Garantir que o diretor de obra está identificado e presente
Manter o livro de obra no local da obra, com registos regulares do estado de execução
Afixar de forma visível o aviso que publicita o alvará
Cumprir as condições fixadas na licença ou comunicação prévia
Remover entulhos e detritos decorrentes da obra
Comunicar alterações ao projeto de forma atempada
O não cumprimento de qualquer destas responsabilidades configura uma contra-ordenação, suscetível de coima.
Conselhos práticos para o Requerente
A experiência demonstra que certos comportamentos facilitam muito o processo:
Antecipação: Solicite informação prévia antes de elaborar projetos. Isto evita surpresas posteriormente.
Completude: Certifique-se de que toda a documentação está completa desde a primeira apresentação. Requerimentos com falhas geram demoras significativas.
Técnicos qualificados: Trabalhe com arquitetos, engenheiros e projetistas legalmente habilitados e inscritos nas associações profissionais competentes. Os termos de responsabilidade destes técnicos têm enorme peso processual.
Comunicação: Mantenha contato regular com o gestor de procedimento designado. Este é seu interlocutor direto na Câmara.
Documentação original: Guarde toda a correspondência, comprovantes de pagamento e notificações. Estes documentos são fundamentais em caso de recurso ou impugnação.
Conformidade legal: Não tente contornar a lei. Operações realizadas sem os devidos licenciamentos ou comunicações podem resultar em embargos, demolições, coimas elevadas e até responsabilidade criminal.
Em poucas palavras
O requerente é um agente ativo e responsável no processo camarário. Não se trata apenas de preencher formulários e esperar decisões. Exige-se contribuição ativa, documentação completa, respeito por prazos e obediência a normas. Mas também existem proteções e direitos, como o deferimento tácito, que favorecem quem cumpre as regras. Compreender este equilíbrio entre direitos e obrigações é fundamental para evitar obstáculos desnecessários. Um requerente bem informado consegue navegar os processos camarários com maior eficácia, reduzindo custos, atrasos e frustrações.
Se tem dúvidas sobre qual é o seu papel específico num processo camarário, se necessita orientação sobre documentação a apresentar ou se enfrenta bloqueios numa tramitação em curso, a AC-Arquitetos dispõe de experiência na gestão de processos camarários. Contacte-nos para explorar como podemos auxiliar no cumprimento das exigências legais e procedimentais, para que o seu projeto progrida com segurança e eficiência.



