Alterações de Uso durante a obra: O que é necessário saber
- Ana Carolina Santos

- 30 de ago.
- 4 min de leitura
Gestão inteligente e consciente das alterações de uso nas obras é mais do que uma necessidade prática: representa garantia de legalidade, funcionalidade e valorização do edificado, protegendo direitos e investimentos.
No contexto do setor da construção e reabilitação em Portugal, as alterações de uso durante o decurso de uma obra são mais comuns do que se pensa. Mudanças de planos, novas necessidades dos proprietários ou até oportunidades de negócio levam, muitas vezes, à necessidade de adaptar aquilo que estava inicialmente previsto no projeto. No entanto, estas decisões exigem atenção redobrada e um entendimento claro do enquadramento legal, sob pena de se incorrer em riscos ou comprometer o futuro da construção.
Como arquitecta com experiência significativa em processos camarários, conheço bem o impacto destas decisões e a importância de garantir que cada etapa respeita as normas em vigor – não só por questões legais, mas também para salvaguarda da qualidade e do investimento dos clientes.

O que significa “Alteração de Uso”?
Alteração de uso refere-se à mudança da finalidade para a qual um edifício ou fração foi inicialmente licenciado ou construído. Exemplos comuns incluem:
Conversão de comércio em habitação
Transformação de armazéns em escritórios
Passagem de loteamento industrial para loteamento habitacional
Mesmo aparentando ser uma alteração simples, exige quase sempre tramitações específicas junto da Câmara Municipal e o cumprimento da regulamentação em vigor.
O enquadramento legal atual
Em Portugal, o Regime Jurídico da Urbanização e Edificação (RJUE) rege todo o tipo de operações urbanísticas, incluindo as alterações de uso. A legislação foi reformulada por via do Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de dezembro, com diversas alterações recentes, mantendo-se como um dos pilares normativos para processos de licenciamento e gestão urbanística no nosso país.
Segundo este regime, destacam-se algumas definições cruciais:
Obras de alteração: mudam as características físicas (ex: estrutura, número de fogos, divisões, etc.) sem aumento de área ou fachada;
Alteração de uso: mudança da função do edifício/fracção — mesmo sem intervenção física — está sujeita a regras e, tipicamente, exige comunicação prévia ou licenciamento.
Alterar o uso de um imóvel, durante a obra, só é seguro, eficiente e valorizador se for legalmente enquadrado — qualquer desvio pode resultar em multas, atrasos ou até na impossibilidade de utilizar o espaço conforme pretendido.
Como e quando comunicar a Alteração
Por norma, a alteração de uso durante a execução de uma obra obriga a:
Comunicação prévia com prazo dirigida à Câmara Municipal
Apresentação de termo de responsabilidade por técnico habilitado, que ateste a conformidade do novo uso com a legislação e a idoneidade do edifício
Comprovação de que todas as normas legais e regulamentares (incluindo regras de segurança, salubridade, acessibilidade, etc.) são respeitadas.
Casos mais comuns:
Situação | O que fazer |
Alterar de comércio para habitação | Comunicar à Câmara e aguardar aceitação |
Acrescentar escritórios a um armazém | Apresentar elementos instrutórios atualizados |
Mudar armazém industrial para alojamento | Anexar projeto de alteração e termo técnico |
É fundamental garantir que estas etapas sejam concretizadas antes da mudança de uso se materializar, sob pena de embargo, sanções ou mesmo de nulidade da utilização prevista.
Motivos mais frequentes para Alteração de Uso
Mudança de estratégia imobiliária: surge uma oportunidade de maior valorização se o ativo tiver outro uso.
Necessidade de adaptação às exigências do mercado: por exemplo, arrendar espaço habitacional onde o mercado de escritórios está saturado.
Questões urbanísticas locais: ajustamentos a alterações nos regulamentos municipais ou planos diretores.
Risco de avançar sem cumprir as normas
Ao decidir por uma alteração de uso durante a obra, ignorando os trâmites legais — mesmo que por desconhecimento — pode enfrentar:
Embargo imediato da obra
Coimas elevadas e sanções acessórias (como a impossibilidade de solicitar futuras licenças)
Problemas cadastrais e impossibilidade de transmitir o imóvel
Impossibilidade de comercializar/arrendar para o novo uso pretendido

Exemplo prático
Imagine um investimento inicial para um prédio de serviços num bairro emergente. Durante a obra, surge o interesse em dividir o espaço em apartamentos para arrendamento urbano. A legislação exige:
Comunicação prévia à Câmara, informando o novo uso
Apresentação de projeto atualizado e termo de responsabilidade do técnico
Eventual vistoria municipal para confirmar a conformidade com requisitos de habitabilidade, segurança e acessibilidades
Só após a “luz verde” da autarquia se pode proceder ao novo uso, sem riscos para o proprietário ou futuros utilizadores.
Pontos-chave a confirmar em qualquer Alteração de Uso
O Plano Diretor Municipal e Regulamentos Municipais permitem o novo uso?
O edifício/fração cumpre os requisitos técnicos mínimos para o novo uso (salubridade, segurança, acessibilidade, etc.)?
Foram entregues todos os documentos obrigatórios, nomeadamente o termo de responsabilidade do técnico competente?
Cumpre com as normas do Regulamento Geral das Edificações Urbanas (RGEU), como áreas mínimas, ventilação, iluminação, instalações sanitárias, etc.?
Procedimentos para Alteração de Uso
Etapa | Interveniente | Prazo típico |
Comunicação prévia | Proprietário/Técnico | Imediato |
Anexação de projeto atualizado e termo técnico | Técnico habilitado | 1-2 semanas |
Apreciação pela Câmara Municipal | Câmara Municipal | 20 dias (aprox.) |
Vistoria, se necessária | Comissão municipal | 15 dias após decisão |
Utilização para novo fim | Proprietário | Após aceitação formal |
Conselhos profissionais
Consulte sempre um arquiteto especializado na fase de tomada de decisão — a experiência profissional é vital para antecipar riscos e garantir alinhamento com a legislação atual.
Nunca avance com alterações de uso antes de consultar e comunicar com a Câmara Municipal — cada município pode ter particularidades próprias e exigências específicas.
Solicite esclarecimento detalhado dos efeitos fiscais e urbanos da mudança pretendida.
Mantenha toda a documentação legal devidamente arquivada, para eventual necessidade futura de validação ou fiscalização.
Para considerar
A alteração de uso durante uma obra pode criar valor, gerar novas oportunidades e adaptar edifícios aos desafios atuais do mercado. No entanto, só poderá colher benefícios se cumprir, integralmente, as etapas legais, técnicas e urbanísticas. Escolher o caminho da regularidade, com assessoria técnica e jurídica adequada, é investir no futuro do imóvel e proteger o seu património.
Está a ponderar alterar o uso de um imóvel durante uma obra ou precisa de esclarecer procedimentos legais e técnicos? Entre em contacto com a AC-Arquitetos. Damos-lhe segurança, respostas e acompanhamento desde o planeamento até à utilização do seu espaço.



