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Construir no limite do terreno: Oportunidade ou pesadelo legal?

  • Foto do escritor: Ana Carolina Santos
    Ana Carolina Santos
  • 28 de nov.
  • 3 min de leitura

Uma das questões mais frequentes e conflituosas no urbanismo português é a construção nos limites do lote. O desejo de aproveitar cada metro quadrado de terreno choca muitas vezes com a realidade fria da lei e com os direitos dos vizinhos. Afinal, posso encostar a minha casa ao muro do vizinho? E se já construí, é possível legalizar? A resposta curta é: depende. A resposta completa exige compreender a lógica dos afastamentos e as exceções que a lei permite.


Anexo próximo dos limites do lote após aprovação do processo camarário de Legalização
Anexo próximo dos limites do lote após aprovação do processo camarário de Legalização

A regra de ouro: O afastamento obrigatório


O princípio base do Regulamento Geral das Edificações Urbanas (RGEU) é a garantia de salubridade, iluminação e privacidade. Por isso, a regra geral impõe que as fachadas com vãos (janelas ou portas) devem manter uma distância mínima dos limites do terreno. Geralmente, esta distância é de 3 metros ou metade da altura da fachada. Ou seja, se a sua casa tem 6 metros de altura, deve afastar-se pelo menos 3 metros do muro do vizinho. Se tiver 8 metros de altura, o afastamento sobe para 4 metros. Esta "almofada" de espaço serve para garantir que o seu vizinho não fica na sombra e que você não abre janelas diretamente sobre a propriedade dele.



Quando é possível construir no limite ("encostado")?


Apesar da regra, existem situações onde a construção no limite é permitida e até incentivada:

1. Obras de Escassa Relevância Urbanística - Pequenos anexos, garagens ou arrumos podem ser construídos junto ao limite, desde que cumpram requisitos estritos:

  • Altura reduzida (geralmente até 2,20m ou 3m, dependendo do regulamento municipal).

  • Área limitada (ex: até 10m² ou conforme definido pelo município).

  • Não podem ter janelas ou aberturas para o vizinho.

2. Empenas cegas - É possível construir encostado ao limite se a parede for uma "empena cega" (sem qualquer abertura) e se o Plano Diretor Municipal (PDM) ou o loteamento o permitir. Isto é comum em moradias em banda ou geminadas, onde a construção "fecha" o quarteirão.

3. Acordo entre vizinhos? Cuidado! - Muitos proprietários acham que basta uma declaração escrita do vizinho a autorizar a construção no limite. Erro grave. O licenciamento urbanístico é uma questão de direito público. A Câmara Municipal não licencia uma ilegalidade só porque o vizinho não se importa. O acordo privado não se sobrepõe à lei urbanística.



Tenho uma construção ilegal no limite. É legalizável?


Se já construiu sem licença junto ao muro, a legalização é um processo complexo, mas nem sempre impossível. O caminho para a legalização depende de dois fatores:

A) Conformidade com o PDM: A construção, tal como existe, cumpre os índices de construção e os afastamentos previstos no plano municipal? Se sim, o processo é burocrático (projeto de legalização).

B) A questão dos afastamentos: Se a construção viola os afastamentos legais, a legalização pode exigir:

  • Fechar vãos: Tapar janelas que deitem diretamente sobre o vizinho.

  • Demolição parcial: Reduzir a altura ou a área para enquadrar na categoria de "anexo" ou "obra de escassa relevância".

  • Criação de servidões: Em casos raros e específicos, a constituição de servidões de vistas pode ajudar, mas não resolve a infração urbanística perante a Câmara.



O risco da inércia


Manter uma construção ilegal no limite do lote é um risco financeiro latente.

  • Fiscalização: Uma denúncia do vizinho (hoje amigo, amanhã inimigo) obriga a Câmara a agir, podendo levar a coimas e ordens de demolição.

  • Desvalorização: Uma casa com anexos ilegais não pode ser vendida com recurso a crédito habitação na sua totalidade, pois a avaliação bancária penaliza áreas não registadas.



Para refletir


Construir "à justa" ou encostar ao vizinho parece uma forma inteligente de ganhar espaço, mas frequentemente resulta em anos de litígios e despesas. O metro quadrado mais caro é aquele que tem de ser demolido.

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