Ocupação de Via Pública: Tudo o que precisa saber antes de avançar com a sua obra
- Ana Carolina Santos

- 21 de out.
- 8 min de leitura
Quando se planeia uma obra em Portugal, seja uma simples reparação de fachada ou uma construção de raiz, surge frequentemente uma questão prática: e se precisar de ocupar o espaço público? Tapumes, andaimes, contentores, gruas – todos estes elementos podem ser essenciais para a execução dos trabalhos, mas exigem autorização específica. Falamos da Ocupação de Via Pública (OVP), um procedimento que, embora técnico, é fundamental para garantir a legalidade e segurança da sua intervenção.

O que é a Ocupação de Via Pública (OVP)?
A Ocupação de Via Pública refere-se ao aproveitamento temporário do espaço público – passeios, faixas de rodagem, estacionamento – para fins relacionados com a realização de obras. Este aproveitamento pode incluir a instalação de equipamentos e estruturas de apoio à execução de trabalhos de construção civil, como:
Tapumes e vedações que delimitam o estaleiro
Andaimes para trabalhos em altura
Gruas, guindastes e plataformas elevatórias
Depósitos de materiais de construção e contentores de resíduos
Amassadouros, betoneiras e outros equipamentos
Estacionamento reservado para viaturas de apoio à obra
A ocupação do espaço público não é um direito automático: é uma concessão temporária que exige licenciamento municipal.
A OVP tem como finalidade principal garantir a segurança de trabalhadores e transeuntes, minimizar inconvenientes para a comunidade e assegurar que as obras decorrem de forma ordenada e controlada.
Quando é obrigatória a licença de OVP?
A necessidade de obter uma licença de ocupação de via pública surge sempre que a execução de uma operação urbanística implique o uso do espaço público. Isto aplica-se tanto a obras sujeitas a controlo prévio (licenciamento ou comunicação prévia) como a obras isentas desse controlo.
Obras Sujeitas a Controlo Prévio
Nestas situações, a OVP está associada ao processo principal de licenciamento ou comunicação prévia da obra. Incluem-se nesta categoria:
Obras de construção, reconstrução, ampliação ou alteração que necessitem de licença ou comunicação prévia
Operações em área abrangida por plano de pormenor ou loteamento
Edificações em zona urbana consolidada que cumpram os planos municipais
Edificação de piscinas associadas a edifício principal
Operações precedidas de informação prévia favorável
Conselho importante: Nas obras sujeitas a licenciamento ou comunicação prévia, o Regime Jurídico da Urbanização e Edificação (RJUE) permite que o requerente englobe o pedido de OVP no pedido principal, sem necessidade de formalidade adicional. A permissão para ocupação fica integrada no título da operação urbanística.
Obras Isentas de Controlo Prévio
Mesmo quando a obra em si não carece de licença ou comunicação prévia municipal, se houver necessidade de ocupar o espaço público, é obrigatório obter autorização específica para essa ocupação. Exemplos:
Obras de conservação (restauro, reparação, limpeza, pintura de fachadas)
Obras de alteração no interior de edifícios que não afetem estrutura ou fachadas
Obras de reconstrução ou ampliação sem aumento de altura de fachada
Substituição de caixilharia, reparação de telhados ou outras intervenções menores
Alerta: Não confundir a isenção de licenciamento da obra com a dispensa de autorização para ocupar a via pública. São procedimentos distintos e cumulativos quando aplicável.
Quem pode solicitar a licença de OVP?
O pedido deve ser apresentado pelo proprietário do imóvel ou por quem detenha legitimidade para o fazer – por exemplo, um mandatário devidamente autorizado através de procuração.
Nas situações de obras promovidas por entidades públicas (Estado, autarquias, institutos públicos), embora estas possam estar isentas de licenciamento da operação urbanística, devem registar a intervenção e declarar o cumprimento das normas aplicáveis, incluindo as relativas à ocupação de espaço público.
O processo de Licenciamento da OVP
Antecedência do pedido
O pedido de licença de ocupação da via pública deve ser apresentado com antecedência suficiente relativamente ao início previsto dos trabalhos. Embora os prazos variem entre municípios, regra geral recomenda-se uma antecedência de 15 a 20 dias úteis.
Submissão online ou presencial
Actualmente, a maioria das Câmaras Municipais disponibiliza plataformas digitais para submissão de pedidos de OVP, facilitando o processo e permitindo o acompanhamento online. Em alternativa, o pedido pode ser apresentado presencialmente nos balcões de atendimento municipal ou espaços do cidadão.
Documentos obrigatórios para instruir o pedido
A instrução do pedido de licença de OVP exige a apresentação de um conjunto de documentos que variam ligeiramente conforme o município e a natureza da obra. No entanto, os elementos essenciais são:
Documentação geral
Formulário de requerimento (disponível no site da Câmara Municipal)
Identificação do requerente e, se aplicável, do mandatário (com procuração)
Planta de localização à escala 1/2000, assinalando a área de intervenção
Planta de implantação à escala 1/1000, com indicação detalhada da ocupação
Plano de Ocupação da Via Pública (POVP)
O Plano de Ocupação da Via Pública é o documento central do pedido. Deve incluir peças escritas e desenhadas que esclareçam:
Prazo de ocupação pretendido e calendarização dos trabalhos
Área a ocupar e respetivas dimensões
Tipo de equipamentos a instalar (tapumes, andaimes, contentores, gruas, etc.)
Localização precisa de cada elemento na via pública
Percurso pedonal alternativo a manter desimpedido
Vedação e organização do estaleiro temporário
Entradas e saídas de viaturas
Sinalização rodoviária temporária (quando aplicável)
Documentação técnica e legal
Memória descritiva e justificativa da ocupação pretendida, esclarecendo a natureza dos trabalhos, processos construtivos e medidas de segurança
Termo de responsabilidade assinado por técnico habilitado (necessário para andaimes, tapumes, estaleiros, gruas e plataformas elevatórias)
Certidão da Ordem profissional do técnico responsável
Seguro de responsabilidade civil válido e atualizado, cobrindo eventuais danos a terceiros ou ao município
Alvará de construção ou comprovativo da comunicação prévia (quando a obra esteja sujeita a controlo prévio)
Casos especiais
Projeto de execução de andaimes se a altura exceder 25 metros
Projeto de sinalização temporária conforme Decreto Regulamentar n.º 22-A/98 e n.º 41/2002, quando haja ocupação da faixa de rodagem
Parecer das forças de segurança, em caso de eventos ou situações de maior impacto no trânsito
Nota prática: A documentação exigida pode variar entre municípios. Consulte sempre o regulamento municipal aplicável e o site oficial da Câmara Municipal para confirmar os requisitos específicos da sua localidade.
Aprovação, Emissão e Condições da Licença
Após análise do pedido pelos serviços municipais, e verificada a conformidade com os requisitos legais e regulamentares, é emitida a licença ou alvará de ocupação de via pública. Este documento especifica:
Prazo de validade da ocupação
Área autorizada e localização exacta
Equipamentos permitidos
Condições a observar durante a ocupação
Obrigações do Titular da Licença
O titular da licença é responsável por:
Colocar placa informativa sobre a ocupação, em local visível a 1,5 metros do nível do passeio
Instalar e manter a sinalização temporária em bom estado
Garantir a segurança de trabalhadores e transeuntes
Assegurar percursos pedonais alternativos desimpedidos e acessíveis
Repor imediatamente qualquer sinalização danificada ou desaparecida
Cumprir os limites de ruído estabelecidos pela legislação
Alerta importante: A ocupação indevida da via pública sem licença válida, ou fora das condições autorizadas, constitui infração sujeita a sanções e coimas, podendo resultar na suspensão dos trabalhos.

Alterações e Prorrogações
Alteração da Licença
Se durante a execução da obra surgir necessidade de alterar as condições de ocupação (por exemplo, aumentar a área, instalar equipamento adicional), deve ser solicitado um aditamento ao alvará. O pedido de alteração segue tramitação semelhante ao pedido inicial.
Prorrogação do Prazo
Caso os trabalhos não fiquem concluídos no prazo inicialmente previsto, é possível requerer a prorrogação da licença de OVP. Este pedido deve ser apresentado antes do termo do prazo em vigor.
Conselho: Os pedidos de alteração e prorrogação podem, quando necessário, ser apresentados em simultâneo, agilizando o processo.
Taxas e custos associados
A ocupação de via pública está sujeita ao pagamento de taxas municipais, cujos valores variam conforme:
Tipo de ocupação (tapumes, andaimes, contentores, estacionamento reservado)
Área ocupada (expressa em metros quadrados)
Duração da ocupação (diária, semanal ou mensal)
Localização (zona mais ou menos central)
Exceção: Em alguns municípios, a ocupação da via pública apenas para obras de conservação pode estar isenta de custos.
Além das taxas municipais, quando a ocupação incide sobre lugares de estacionamento tarifado gerido por entidade externa (como a EMEL em Lisboa), pode ser devida uma compensação adicional pela indisponibilização desses lugares.
Importante: Consulte o Regulamento de Taxas do município onde se localiza a obra para conhecer os valores exactos aplicáveis.
Coordenação com Outras Entidades
A ocupação da via pública pode exigir articulação com outras entidades para além da Câmara Municipal:
Polícia Municipal ou PSP
É necessário solicitar presença policial nos seguintes casos:
Ocupação que implique interrupção ou desvio de trânsito
Trabalhos que afetem significativamente a circulação rodoviária
Eventos ou situações de maior impacto no espaço público
A coordenação de prazos entre a Câmara Municipal e as forças policiais deve ser feita com antecedência.
Entidades Gestoras de Infraestruturas
Se os trabalhos envolverem intervenção em redes de água, saneamento, electricidade, gás ou telecomunicações, pode ser necessário obter pareceres ou autorizações das respetivas entidades concessionárias.
Fiscalização e Responsabilidade
A fiscalização do cumprimento das condições estabelecidas na licença de OVP compete aos serviços municipais e às autoridades policiais.
Infrações e Sanções
A violação das normas aplicáveis à ocupação de via pública constitui contra-ordenação, punível com:
Coimas entre €500 e €50.000 para pessoas singulares, e entre €500 e €44.891,81 para pessoas coletivas
Suspensão ou embargo dos trabalhos
Obrigação de reposição das condições legais
Nota: A responsabilidade recai sobre o dono da obra, o técnico responsável e demais intervenientes que tenham contribuído para a infração.
Casos práticos e exemplos
Exemplo 1: Pintura de fachada
Uma moradia unifamiliar necessita de pintura exterior e reparação de fissuras. Embora a obra em si seja de conservação (isenta de licenciamento), será necessário instalar andaimes que ocupam o passeio.
Solução: Apresentar pedido de licença de OVP específico, acompanhado de termo de responsabilidade de técnico habilitado, seguro de responsabilidade civil, planta de localização e plano de ocupação detalhando a instalação dos andaimes e o percurso pedonal alternativo.
Exemplo 2: Construção de edifício multifamiliar
Um prédio de habitação coletiva em zona urbana, com 5 pisos, está em fase de construção. A obra exige a instalação de grua, tapumes, contentor de resíduos e reserva de estacionamento na via pública.
Solução: Integrar o pedido de OVP no processo de licenciamento da operação urbanística. O plano de ocupação deve prever todas as fases da obra, incluindo fundações, estrutura e acabamentos. A licença de OVP será emitida em simultâneo com o alvará de construção, podendo contemplar faseamento da ocupação.
Exemplo 3: Substituição de caixilharia
Um apartamento num edifício em propriedade horizontal pretende substituir as janelas. Será necessário um andaime ligeiro apoiado no passeio durante 2 dias.
Solução: Embora a obra seja isenta de controlo prévio, é obrigatório solicitar licença de OVP para instalação do andaime, ainda que por período curto. O processo é simplificado mas não dispensável.
Para considerar
A Ocupação de Via Pública é mais do que uma formalidade burocrática: é um instrumento essencial para garantir a segurança, organizar o espaço urbano e salvaguardar direitos de terceiros durante a execução de obras. Embora o processo possa parecer complexo à primeira vista, compreender os seus fundamentos e requisitos permite abordá-lo com confiança e eficiência.
Planear a obra com antecedência, reunir toda a documentação necessária e cumprir as condições estabelecidas na licença são os pilares para uma ocupação legal e sem sobressaltos. Tenha sempre presente que a responsabilidade pela correta ocupação da via pública é partilhada entre o proprietário, o técnico responsável e a empresa executante. Não negligencie este aspeto do seu projeto. Consultar profissionais qualificados – arquitetos, engenheiros, gestores de obra – pode poupar-lhe tempo, dinheiro e dissabores futuros. Uma obra bem planeada é uma obra que respeita não só a legislação, mas também a comunidade que a rodeia.
Se tem dúvidas sobre a aplicabilidade da OVP ao seu caso concreto ou necessita de apoio na instrução do processo, não hesite em contactar a Câmara Municipal da sua área ou procurar aconselhamento técnico especializado.



