Principais erros nos processos de Licenciamento (e como evitá-los)
- Ana Carolina Santos

- há 5 dias
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Quem já iniciou o sonho de construir ou reabilitar uma casa sabe que a etapa burocrática é, muitas vezes, a mais temida. O licenciamento de obras em Portugal é um processo exigente, regulado por legislação densa (como o RJUE) e sujeito a regulamentos municipais específicos. Não é de estranhar que atrasos, indeferimentos e custos inesperados surjam frequentemente.
A boa notícia é que a maioria destes problemas é previsível e evitável. A diferença entre um processo fluido e um pesadelo administrativo reside, quase sempre, na preparação inicial. Identificámos os erros mais comuns que levam ao "chumbo" ou atraso dos projetos, para que os possa evitar desde o primeiro dia.

1. Subestimar a fase de pré-análise
Muitos proprietários e investidores avançam para a compra de terrenos ou contratação de projetos sem verificar o que é legalmente possível construir. Assumir que se pode "construir o que se quiser" ou confiar apenas na palavra do vendedor é um erro clássico.
Como evitar:
Solicite sempre um Pedido de Informação Prévia (PIP) à Câmara Municipal antes de avançar. Este instrumento garante-lhe, de forma vinculativa, o que pode efetivamente construir.
Consulte o Plano Diretor Municipal (PDM) atualizado. As regras de construção mudam, e o que era permitido há 10 anos pode não ser hoje.
2. Documentação incompleta ou desatualizada
Pode parecer básico, mas a falta de documentos é uma das principais causas de rejeição liminar de processos. Entregar um projeto sem a certidão do registo predial atualizada, sem os termos de responsabilidade corretos ou com peças desenhadas em falta bloqueia imediatamente a análise técnica.
Como evitar:
Crie uma checklist rigorosa baseada na portaria mais recente (atualmente a Portaria n.º 71-A/2024) e nos regulamentos do município específico.
Confirme a validade de todos os documentos (certidões, cadernetas prediais, cartões de cidadão) antes da submissão.
3. Discrepâncias entre projeto e realidade
Acontece frequentemente: o projeto de arquitetura é desenhado com base numa planta topográfica antiga ou incorreta. Quando a obra arranca ou a fiscalização vai ao local, descobre-se que a casa "não cabe" no terreno, que as árvores a manter já não existem, ou que as cotas de nível estão erradas.
Como evitar:
Invista num levantamento topográfico rigoroso e atualizado antes de qualquer traço de arquitetura. É a base de tudo.
Faça uma visita técnica detalhada ao local com o arquiteto para confrontar os limites do terreno e identificar condicionantes físicas invisíveis no papel.
4. Ignorar projetos de especialidades e pormenores
Focar todas as energias na arquitetura e deixar para segundo plano a engenharia (especialidades) é um risco. Incompatibilidades entre a estrutura de betão e a arquitetura, ou tubagens de esgoto que atravessam vigas, são erros detetados tardiamente que obrigam a alterações de projeto em obra – e a novos licenciamentos (aditamentos).
Como evitar:
Exija a coordenação de projetos. O arquiteto e os engenheiros devem trabalhar em equipa, sobrepondo as suas plantas para detetar conflitos antes da obra começar.
Não avance para obra sem um projeto de execução detalhado, onde estas questões já foram resolvidas.
5. Deixar "caducar" os prazos
As licenças de construção têm validade. Se não iniciar a obra no prazo estipulado após a emissão do alvará, ou se não a concluir dentro do tempo previsto, a licença caduca. Reativar um processo caducado é complexo, moroso e pode implicar novas taxas ou a adaptação a novas leis entretanto aprovadas.
Como evitar:
Esteja atento aos prazos definidos no alvará. Se prevê atrasos, peça a prorrogação do prazo antes que este termine. A lei permite prorrogações, desde que devidamente justificadas e pedidas a tempo.
Comunique o início dos trabalhos à Câmara Municipal dentro do prazo legal para evitar a caducidade por falta de início de obra.

6. Alterações em obra sem comunicação
A tentação de "mudar só uma janela" ou "aumentar um bocadinho a varanda" durante a construção é grande. No entanto, qualquer alteração que mexa na fachada, na estrutura ou nas áreas de construção obriga a um pedido de alteração à licença. Ignorar isto leva a embargos de obra e coimas pesadas.
Como evitar:
Se decidir alterar o projeto, consulte o seu arquiteto imediatamente. Ele saberá dizer se a alteração é isenta, se requer apenas comunicação prévia ou se obriga a um novo licenciamento.
Nunca execute alterações estruturais ou estéticas sem cobertura legal. O custo da legalização (ou demolição) será sempre superior ao custo do projeto.
Para refletir
O licenciamento não deve ser visto como um obstáculo, mas sim como o guião que assegura a legalidade, segurança e valorização do seu património. A maioria dos "pesadelos" burocráticos nasce da pressa, da falta de rigor na instrução ou da tentativa de contornar regras.
Um processo bem instruído, com uma equipa técnica competente que antecipa problemas em vez de reagir a eles, é meio caminho andado para uma obra tranquila. A qualidade do projeto e o cumprimento rigoroso dos procedimentos administrativos são o melhor investimento que pode fazer para proteger o seu tempo e o seu dinheiro.



