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Propriedade Horizontal: Como dividir um Edifício Existente sem realizar obras

  • Foto do escritor: Ana Carolina Santos
    Ana Carolina Santos
  • há 6 dias
  • 6 min de leitura

Portugal permite que proprietários dividam edifícios existentes em regime de propriedade horizontal sem necessidade de executar intervenções construtivas significativas. Esta possibilidade tem importantes implicações jurídicas e práticas, especialmente para quem deseja aproveitar economicamente um imóvel apenas mediante reorganização legal das frações.


Exemplo de uma "Certidão Permanente" com as diferentes frações divididas
Exemplo de uma "Certidão Permanente" com as diferentes frações divididas

O Conceito de Propriedade Horizontal: Enquadramento Legal


A propriedade horizontal é um regime jurídico que permite dividir um edifício em fracções autónomas, cada uma com proprietário distinto. Diferencia-se fundamentalmente do conceito tradicional de propriedade de um todo indivisível.​

O Regime Jurídico da Urbanização e Edificação (RJUE) estabelece que um edifício pode ser constituído em regime de propriedade horizontal sem qualquer obra prévia, desde que o mesmo cumpra determinados requisitos técnicos e de segurança.​

A divisão de um edifício em propriedade horizontal não constitui operação urbanística sujeita a licenciamento ou comunicação prévia, permitindo que os proprietários reorganizem legalmente imóveis existentes com simples alteração registal.



Requisitos fundamentais para Constituição em Propriedade Horizontal


Nem todo o edifício pode ser dividido em propriedade horizontal. A lei estabelece condições prévias obrigatórias:


Conformidade com Normas de Habitabilidade

O edifício deve reunir condições de segurança e de habitabilidade fundamentais, conforme avaliação prévia da Câmara Municipal. Esta avaliação incide sobre:​

  • Estrutura resistente adequada

  • Ausência de riscos de colapso

  • Conformidade com normas de salubridade

  • Acesso independente garantido

  • Ligação viável às infraestruturas gerais de água, saneamento e eletricidade

Se qualquer destes requisitos não se verificar, o edifício não pode ser constituído em propriedade horizontal, independentemente de outras circunstâncias.


Acesso e Infraestruturas

A lei exige explicitamente que o edifício tenha acesso independente e possibilidade de ligação directa às redes gerais de infraestruturas. Edifícios isolados ou sem viabilidade técnica de ligação às redes não podem ser legalmente divididos.​



Procedimento de Constituição em Propriedade Horizontal


A criação de propriedade horizontal segue etapas procedimentais definidas:


1. Certificação pela Câmara Municipal

O proprietário requer à Câmara Municipal certificação de que o edifício satisfaz os requisitos para constituição em regime de propriedade horizontal. Este pedido pode acompanhar uma comunicação prévia de utilização, caso o proprietário também queira registar informações sobre usos das fracções.​

A Câmara Municipal tem prazos definidos para análise e emissão desta certificação. O reconhecimento municipal é condição precedente obrigatória para qualquer registo registal posterior.


2. Parecer sobre Partes Comuns

A certificação inclui avaliação sobre o estado das partes comuns do edifício — escadas, corredores, coberturas, fachadas, estrutura resistente.​

Se as partes comuns não estiverem em condições de serem utilizadas, a Câmara Municipal pode recusar a certificação. Proprietários podem ser obrigados a realizar obras de reabilitação nas partes comuns antes da formalização da propriedade horizontal.


3. Registo Registal

Após certificação municipal, o proprietário pode proceder ao registo registal da propriedade horizontal. Este registo transforma legalmente a estrutura jurídica do imóvel, criando fracções autónomas com proprietários potencialmente distintos.

O registo inclui:

  • Descrição predial pormenorizada de cada fração

  • Identificação das áreas privativas

  • Identificação das partes comuns

  • Coeficientes de propriedade de cada fração

  • Quota de participação em despesas



Definição das fracções autónomas


Uma fração autónoma em propriedade horizontal é uma unidade de habitação ou utilização independente, com acesso próprio ou através de circulações comuns.​


Conformidade de cada fração

Cada fração deve satisfazer:

  • Independência funcional: possibilidade de utilização autónoma

  • Segurança estrutural: localização que não comprometa segurança global do edifício

  • Habitabilidade: em caso de frações residenciais, conformidade com requisitos de pé-direito, iluminação, ventilação

  • Acesso: entrada própria ou através de escadas/corredores comuns

A simples subdivisão legal não altera características físicas de compartimentos. Fracções com dimensões inadequadas para habitação (por exemplo, sótãos muito baixos) carecem de avaliação específica.



Partes Comuns vs. Partes Privativas


A lei estabelece distinção clara entre duas categorias de espaço:


Partes Privativas

Pertencem exclusivamente a um proprietário de fração:

  • Compartimentos interiores

  • Varandas privativas

  • Terraços privativos

  • Arrumos privativos

Cada proprietário de fração tem direito de uso exclusivo, podendo não autorizar acesso de terceiros.


Partes Comuns

Pertencem conjuntamente a todos os proprietários de frações:

  • Escadas

  • Corredores de acesso

  • Vestíbulos

  • Coberturas não privatizadas

  • Estrutura resistente

  • Fachadas

  • Instalações colectivas de eletricidade, água e saneamento

  • Espaços verdes comuns (quando existam)

Proprietários de frações têm direito de uso, mas não podem modificar ou danificar partes comuns sem consenso dos outros proprietários.​



Implicações económicas da Propriedade Horizontal


A divisão em propriedade horizontal gera consequências financeiras para cada proprietário:


Quota de Participação

Cada fração tem atribuída uma quota de participação nas despesas comuns. Esta quota normalmente corresponde à proporção da fração relativamente à área total do edifício.​

Proprietário de fração representando 30% da área total paga 30% das despesas comuns de conservação da estrutura, limpeza de escadas, seguros, etc.


Despesas comuns obrigatórias

Incluem:

  • Conservação da estrutura resistente

  • Pintura e reabilitação de fachadas

  • Reparação de escadas e corredores

  • Limpeza de espaços comuns

  • Manutenção de instalações colectivas

  • Seguros do edifício

  • Abastecimento de água e saneamento (em muitos casos)


Alteração de Utilização sem obras

Após constituição em propriedade horizontal, proprietários podem alterar a utilização de frações sem execução de obras, desde que cumpram procedimentos administrativos específicos.​

Exemplos:

  • Converter fração residencial em comercial (escritório)

  • Estabelecer unidade de alojamento turístico

  • Criar consultório profissional

  • Instalar pequeno comércio de retalho

Alterações de utilização sujeitam-se a comunicação prévia à Câmara Municipal, não constituindo operação urbanística sujeita a licenciamento quando não envolvem modificações estruturais.​



Conselhos práticos para divisão em Propriedade Horizontal


✓ Obtenha Parecer Técnico antecipado

Contacte a Câmara Municipal para compreender se o seu edifício reúne condições básicas de segurança e habitabilidade. Algumas construções carecem de obras prévias que inviabilizam a propriedade horizontal sem intervenção significativa.


✓ Inspeccione partes comuns

Avalie estado de escadas, coberturas, fachadas e estrutura resistente. Edifícios com deficiências estruturais graves podem exigir reabilitação antes da constituição em propriedade horizontal, criando custos inesperados.


✓ Calcule Quotas de Participação

Determine com precisão a área de cada fração e a área de partes comuns. Quotas incorretamente calculadas geram desigualdades na repartição de despesas e podem originar contestações futuras.


✓ Consulte a legislação de Propriedade Horizontal específica

O regime de propriedade horizontal tem legislação complementar (nomeadamente o Código Civil) que define obrigações de proprietários, regras de convivência, gestão de despesas e resolução de conflitos. Familiarize-se com estas regras antes de dividir o edifício.


✓ Dirija-se a um Técnico Qualificado

Arquitetos e engenheiros podem avaliar viabilidade técnica de frações autónomas, assegurando que cada uma reúne condições mínimas de funcionalidade e segurança.



Limitações e impossibilidades


Nem todo o edifício pode ser dividido em propriedade horizontal:

  • Edifícios em risco sísmico grave: Lei pode exigir reforço estrutural prévio

  • Edifícios sem acesso independente: Impossível legalmente

  • Edifícios sem possibilidade de ligação a infraestruturas: Legalmente inviável

  • Edifícios com deficiências estruturais: Câmara Municipal pode recusar certificação

  • Edifícios localizados em áreas protegidas: Podem existir restrições de divisão por razões de preservação



Distinção em relação a outras formas de divisão


A propriedade horizontal diferencia-se de outras estruturas jurídicas:


Propriedade dividida (tradicional)

Partilha de imóvel entre vários proprietários em percentagens. Cada proprietário é titular de toda a edificação em cota-parte. Menos apropriada para edifícios de múltiplas frações independentes.


Condomínio (conceito diferente)

Propriedade horizontal é modalidade específica de condomínio onde partes comuns são propriedade conjunta de todos os proprietários de frações.


Arrendamento fraccionado

Proprietário único subdivide edifício em várias habitações ou unidades alugadas, mantendo propriedade integral sobre o imóvel.



Em poucas palavras


A propriedade horizontal permite divisão legal de edifícios existentes sem necessidade de executar obras construtivas, desde que o edifício satisfaça requisitos básicos de segurança, habitabilidade, acesso independente e possibilidade de ligação às infraestruturas. A constituição requer certificação prévia da Câmara Municipal sobre o estado de conformidade do edifício.

Cada fração criada é autónoma, com proprietário potencialmente distinto, participando nas despesas comuns proporcionalmente à sua quota definida no registo registal. Após constituição, proprietários podem alterar usos de frações sem executar obras, desde que permaneçam dentro de limites legais de utilização admissível.

A propriedade horizontal não é solução automática. Edifícios com deficiências estruturais graves, sem acesso viável ou localizados em áreas de restrição legal podem não ser elegíveis, mesmo que teoricamente enquadrem-se na lei.


Clarifique a viabilidade da divisão do seu edifício

Proprietários interessados em aproveitar economicamente edifícios através de propriedade horizontal enfrentam questões complexas: o edifício reúne requisitos mínimos? Quais as obrigações legais após constituição? Como organizar-se juridicamente?

A AC-Arquitetos oferece avaliação técnica da viabilidade de constituição de propriedade horizontal em edifícios existentes, em conformidade com a legislação aplicável e requisitos de segurança, habitabilidade e acessibilidade. Identificamos constrangimentos técnicos ou legais e orientamos sobre procedimentos administrativos junto da Câmara Municipal. Contacte-nos para clarificar se o seu edifício reúne condições para divisão em propriedade horizontal e que etapas devem ser seguidas.

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